A Oeste tudo de novo

Com o abrir da porta, a coesão vivida até agora vai abrir brechas e, por muito que isto possa doer, os tempos que se aproximam serão muito mais complicados e confusos.

“Portugal parou mais cedo. Vinha do Leste e eles estão um pouco mais a Oeste e, portanto, conseguiram parar um pouco mais cedo. Houve um comportamento por parte da sociedade como um todo e por parte das forças políticas muito mais compactas, de entreajuda.” Numa entrevista no jornal El País, esta foi a forma que Teresa Ribera, ministra espanhola da Transição Ecológica, encontrou para justificar os bons resultados de Portugal quando comparados com o seu país.

A justificação geográfica é para rir, mas a coesão na resposta, que por tão descarado contraste tem suscitado a inveja da esquerda espanhola, é uma verdade e terá certamente contribuído para que o país possa entrar numa nova fase da sua convivência com a covid-19. Mas está a acabar.

Até agora temo-nos sentido – mesmo que isto não corresponda com rigor ao que aconteceu à totalidade da população – como que irmanados por esta obrigação de isolamento social em nossas casas. Mas com o abrir da porta, este pacto vai, com naturalidade, abrir brechas e, por muito que isto possa doer, os tempos que se aproximam serão muito mais complicados e confusos que aqueles que vivemos até agora.

A reclusão social manteve em suspenso os problemas de inúmeras áreas que não só estão a ser atingidas fortemente pela paralisação da economia, como vão continuar a ser impactadas pela necessidade de prosseguir a sua actividade com as limitações impostas pela necessidade de continuar a conter a propagação do vírus.

Pense-se nos transportes. Se já existiam problemas de oferta quando se discutia o programa dos passes gratuitos, como vai ser agora com lotação a dois terços? Pense-se nos restaurantes. Quantos conseguirão funcionar só com metade da lotação? Pense-se no turismo. Estamos preparados para receber de braços abertos os turistas estrangeiros que são a razão da indústria hoteleira? Pense-se...

Com a avaliação da sua actuação até agora quase focada nas áreas da saúde e do ensino, o Governo precisa de mostrar o que vale a sua resposta em inúmeras outras áreas, com a economia a crescer como prioridade número um. Os erros vão aumentar, as críticas, como é desejável numa sociedade aberta, vão-se multiplicar. O Governo tem de revelar capacidade de encontrar respostas claras se não quer desbaratar rapidamente a tal coesão que vai ser preciso continuar a evocar para o controlo da epidemia. Se a partir de hoje muita coisa vai parecer nova, se muitos outros problemas vão brotar, o certo é que o maior, o vírus, ainda é o mesmo.

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