Kim Jong-un reapareceu, mas o mistério continua

O líder da Coreia do Norte não era visto em público há 20 dias e especulou-se que estaria morto, discutindo-se quem lhe poderia suceder. Voltou para inaugurar uma fábrica de fertilizantes e celebrar o Dia do Trabalhador.

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Kim Jong-un inaugurou uma fábrica de fertilizantes em Suchon KCNA/LUSA

Foi a andar, a sorrir e a fumar, enquanto era ovacionado por trabalhadores norte-coreanos, que o líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un, inaugurou uma fábrica de fertilizantes e acabou com os rumores sobre a sua morte. Esteve longe dos olhares do mundo por 20 dias, e especulou-se sobre a sua morte, o que fez disparar a tensão geopolítica. Uma crise de sucessão neste país com armas nucleares seria um pesadelo a juntar-se ao da pandemia.

A agência de notícias estatal da Coreia do Norte divulgou imagens de Kim, de 36 anos, a visitar uma fábrica de fertilizantes em Suchon, no Norte do país, e a cortar a faixa de inauguração, com a sua irmã mais nova, Kim Yo Jong, cuja importância tem crescido no regime - até ao ponto de alguns analistas discutirem se ela teria hipóteses de se impor aos generais norte-coreanos - a passar-lhe a tesoura. O vídeo teve como finalidade mostrar que o líder está vivo e de boa saúde, com a imprensa internacional a frisá-lo. Mas mostrar a irmã seu lado também não terá sido um acaso.

Não foram avançados motivos para o desaparecimento de Kim Jong-un dos olhos do público. O PÚBLICO comparou vídeos dos últimos meses com o divulgado neste sábado e o semblante do líder norte-coreano está agora bastante mais carregado, notando-se indícios de dor ao andar, quando na propaganda oficial costumava estar sempre a sorrir. Quando está parado de pé, a distância entre as pernas também é maior que em vídeos anteriores e os passos são mais largos, quando antes eram curtos.

“Todos os participantes voltaram a irromper em aplausos estrondosos e ‘hurras’ ao Líder Supremo”, escreveu o jornal oficial norte-coreano Rodong Sinmun, sublinhando que a cerimónia para marcar o Dia do Trabalhador foi “esplêndida”. Depois de dar uma volta pelas instalações da fábrica, Kim sentou-se e deu “orientações” aos seus subordinados. 

Kim já tinha visitado a fábrica em Janeiro, quando ainda estava em construção. A sua inauguração faz parte de a estratégia para diminuir a sua dependência de fertilizantes importados da China. “É uma mensagem para a China, bem como para os países ocidentais que impõem sanções”, disse ao Washington Post Lim Eul-Cul, especialista na Coreia do Norte na Universidade Kyungnam, na Coreia do Sul. 

A 15 de Abril, Kim não compareceu na visita ao mausoléu para assinalar o 108.º aniversário de Kim Il-Sung, seu avô e fundador do regime da Coreia do Norte, falecido em 1994, e começaram os boatos sobre a sua morte - já não era visto desde 11 de Abril. É que a cerimónia é uma das datas mais importantes do calendário do regime, dado o culto de personalidade da dinastia Kim. Num primeiro momento, disse-se que estaria em estado grave, mais tarde que uma operação ao coração tinha corrido mal e que terá ficado em estado vegetativo e, depois, que teria até morrido. 

A possibilidade da morte ou incapacidade súbita para governar de Kim Jong-un, que não tem sucessor designado nesta espécie de monarquia de base nacionalista-comunista, seria um cenário de pesadelo geopolítico. O mais provável seria uma disputa sanguinária pelo poder - e além de armas químicas e biológicas, a Coreia do Norte tem um arsenal balístico e nuclear, bem como um exército de 1,2 milhões de soldados.

“A combinação de armas nucleares sem controlo e conflito político é um pesadelo para o mundo. A agitação política poderia levar o líder de uma facção ou um comandante a ameaçar ou - Deus nos livre! - a lançar um míssíl nuclear”, disse ao New York Times Danny Russel,vice-presidente do Asia Society Policy Institute, e que lidou com a Coreia do Norte enquanto director do Conselho Nacional de Segurança na Casa Branca.

Responsáveis dos Estados Unidos e da Coreia do Sul, país que mais se dedica a monitorizar o seu vizinho do Norte, apressaram-se a desmentir a degradação da saúde de Kim e a sua morte, dizendo que tudo indicava estar em retiro no complexo de luxo na cidade costeira de Wonsan. O seu comboio foi visto estacionado no local, entre 15 e 21 de Abril, e barcos de luxo detectados, por satélite, nas docas da sua vila pessoal. Seul pressupôs que o líder se estivesse a proteger da pandemia de coronavírus por alguns dos seus mais próximos terem ficado com febre - Pyongyang continua sem reconhecer ter casos de covid-19. 

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