Supremo brasileiro convoca Moro a testemunhar dentro de cinco dias

O ex-ministro da Justiça, que saiu do Governo em confronto com o Presidente, garantiu que vai apresentar provas contra Bolsonaro.

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O antigo ministro da Justiça voltou a frisar ter provas para todas as acusações que fez contra o Presidente Bolsonaro Adriano Machado/Reuters

O Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil deu um prazo de cinco dias, a contar de sexta-feira, para que Sergio Moro, o ministro da Justiça que se demitiu do Governo na semana anterior, se apresentasse à Justiça para testemunhar sobre as acusações de interferência política na Polícia Federal que fez contra o Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro. Moro já se tinha mostrado disponível para falar e apresentar provas, e acusou o Procurador-Geral da República de abrir um inquérito “intimidatório”.

Antes desta ordem, o STF tinha dado até um máximo de 60 dias para interrogar o antigo ministro, mas um pedido subscrito por deputados, para acelerar os processos legais, fez com que a audiência fosse antecipada. A ordem de intimação foi assinada pelo juiz do Supremo Celso de Mello.

O antigo ministro, que liderou a investigação anti-corrupção da Lava-Jato, disse, em entrevista à revista Veja desta semana, manter-se disponível para testemunhar e ter provas que comprovam as suas acusações. “Reitero tudo o que disse. Esclarecimentos adicionais farei apenas quando for instado pela Justiça. As provas serão apresentadas no momento oportuno, quando a Justiça solicitar”, disse Moro.

Moro enviou ao Jornal Nacional, da TV Globo, mensagens de WhatsApp, aplicação muito usada pelo chefe de Estado para contactar e se coordenar com os seus ministros, que parecem comprovar as pressões e interferências sobre a Polícia Federal. “Ele [Bolsonaro] sabe quem está falando a verdade. Não só ele. Existem ministros dentro do Governo que conhecem toda essa situação e sabem quem está falando a verdade”, disse Moro. 

Para o juiz do Supremo Tribunal Federal, as denúncias do ex-ministro revelam "práticas alegadamente delituosas que teriam sido cometidas pelo senhor Presidente da República em contexto que as vincularia ao exercício do mandato presidencial”, algo que impedirá Bolsonaro de invocar a cláusula de “imunidade penal temporária” por ser chefe de Estado.

Na sexta-feira, o procurador-geral da República brasileira, Augusto Aras, pediu a abertura de um inquérito ao Supremo Tribunal Federal, dando formalmente o tiro de partida para um eventual processo de impeachment por crimes cometidos, isto se Moro provar o que disse. 

Uma abertura de processo que visa Moro ao também investigar possíveis denúncias caluniosas contra o Presidente. O ex-juiz acusou Aras, na mesma entrevista, de abrir uma investigação “intimidatória” e, por sua vez, o procurador-geral avisou-o que “ninguém está acima da lei”, se as denúncias carecerem de factos que as suportem, e que não será “manipulado ou intimidado”. 

Moro vê-se ainda sob fogo na Comissão de Ética da Presidência, ao ser alvo de uma denúncia de 14 advogados e juristas que o acusam de ter negociado a permanência no executivo em troca de ser nomeado para o Supremo Tribunal Federal e por não ter relatado às autoridades competentes as interferências de Bolsonaro na Polícia Federal mal estas começaram. Moro rejeita a acusação de ter negociado o cargo, algo que incorre no crime de corrupção, diz a imprensa brasileira. 

Na conferência de imprensa em que anunciou a sua saída do Governo de Bolsonaro, Moro acusou o Presidente de interferir politicamente na Polícia Federal, ao forçar a demissão do seu director-geral e quem o iria suceder, para alegadamente proteger um dos filho, Carlos Bolsonaro, de investigações judiciais sobre a circulação de notícias falsas nas redes sociais. Bolsonaro, disse Moro, queria um director-geral da Polícia Federal com quem pudesse manter um contacto pessoal, “que pudesse ligar, colher informações, relatórios de inteligência”. 

Em resposta, Bolsonaro chamou-lhe “mentiroso”, disse que o ministro apenas aceitou continuar no executivo se viesse a ser nomeado para o STF e acusou-o de ter um “compromisso consigo próprio, com o seu ego, e não com o Brasil”, deixando nas entrelinhas que o ex-juiz tem um projecto político próprio que pode culminar nas eleições presidenciais de 2022. Pelo menos quatro partidos já mostraram interesse em vir a apoiá-lo, diz a Folha de São Paulo. No entanto, o Presidente admitiu que pediu ao seu ministro relatórios de inteligência sobre as actividades da PF, mas que teve sempre recusas como resposta. 

O Presidente nomeou esta semana Alexandre Ramagem, director da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e em tempos chefe da equipa de segurança pessoal de Bolsonaro, para director-geral da Polícia Federal. Mas o Supremo Tribunal Federal suspendeu a nomeação, alegando “abuso de poder por desvio de finalidade”. Bolsonaro acabou por cancelar a nomeação, mas voltou atrás e anunciou que ia recorrer da decisão, prolongando o confronto com o Supremo. 

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