Sem condições de segurança, directores não reabrirão escolas

Directores estão confiantes que serão encontradas soluções para garantir este regresso. Mas garantem que este só se concretizará nos estabelecimentos onde existam condições de segurança.

Foto
Director da secundária Camões duvida que seja possível manter distanciamento social nas salas de aulas Daniel Rocha

Está feito o anúncio oficial sobre o reinício das aulas presenciais a 18 de Maio para o 11.º e 12.º ano, que abrangerá também os colégios, e ainda para os últimos dois anos dos cursos profissionais. Falta agora ver como se irá concretizar se a evolução da pandemia assim o permitir. E esse é um trabalho que terá de ser “feito escola a escola, porque todas são diferentes e as realidades mudam de uma para outra”, alerta o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE), Manuel Pereira.

Este responsável deixa uma certeza: “Nenhum director se responsabilizará por abrir uma escola se não estiverem reunidas as condições para garantir a segurança de alunos e professores”. Isto passa por terem todo o material de protecção individual e de higienização dos espaços que foi apresentado como indispensável pela Direcção-Geral de Saúde (DGS) e também pelo primeiro-ministro António Costa no plano de desconfinamento apresentado nesta quinta-feira. E também pela verificação de que as condições físicas dos próprios estabelecimentos escolares permitem manter as regras de distanciamento social que continuarão em vigor.

“As dificuldades das escolas para assegurar estas actividades dependem das condições exactas em que as mesmas se realizarão e que ainda não foram anunciadas, nomeadamente: quantos alunos poderemos ter por sala de aula?”, refere José Eduardo Lemos, director da Escola Secundária Eça de Queiroz, na Póvoa do Varzim. O também presidente do Conselho das Escolas, o órgão que representa os directores junto do Ministério da Educação, aponta várias outras questões “para as quais ainda não há respostas”.

Alguns exemplos: “Quem substituirá os professores que estão em grupos de risco? Como se assegura o direito à educação dos alunos que estão em grupos de risco ou que vivem com familiares que fazem parte desses grupos e que não poderão frequentar as aulas presenciais? E não sendo as aulas presenciais obrigatórias, como assegurar o princípio da equidade no que respeita à avaliação dos alunos que, justificadamente, não comparecerem a nenhuma aula?”. 

“Distanciamento de dois metros entre cada um. Lotação máxima de 10 pessoas por 100m2. Nas escolas? Como?”, questiona também o director da Escola Secundária Camões, João Jaime, que no ensino diurno tem 1050 alunos entre o 10.º e o 12.º ano.  O responsável deste liceu centenário de Lisboa, que se encontra em obras e onde os alunos estavam a ter aulas em contentores, adianta que está à espera do decreto com as medidas de execução para o que foi anunciado nesta quinta-feira, para tentar perceber melhor como será a sua “operacionalização”.

Mas, mais uma vez, dúvidas não faltam. Não podendo estar mais de 10 alunos em sala de aula, poderá significar ter de “dividir a turma em três partes. Qual será então a carga lectiva semanal por disciplina?”. “Também não foi referido nada sobre os funcionários e os professores em situação de risco [que estão dispensados deste regresso]. Quem é que os vai substituir?”. O PÚBLICO já questionou o Ministério da Educação a este respeito, mas ainda não chegaram respostas.

Por outro lado, diz João Jaime, ao colocar-se um horário das 10 horas às 17 horas para estas aulas, como anunciado por António Costa, “elimina-se de imediato o ensino nocturno e só nós temos mais de 100 alunos a fazer Matemática no ensino recorrente que provavelmente vão fazer exame desta disciplina”.

O presidente da ANDE está convicto de que a “a maior parte das escolas encontrará soluções pacíficas” para este regresso, mas acentua que outras, como as grandes secundárias das cidades, irão “ter muitos problemas” e que o ME tem de estar disponível para se encontrarem “soluções alternativas”, caso se comprove que existem estabelecimentos de ensino sem condições de segurança para este regresso.

Por agora está confiante que essa será a atitude por parte da tutela. E também, estando” habituados a trabalhar no fio da navalha”, que os directores conseguirão encontrar “soluções” para assegurar estas aulas presenciais: “Somos parte da solução e não do problema e este regresso poderá ajudar a que se crie alguma tranquilidade entre os alunos, pais e na comunidade. Sendo certo que se existir algum cenário em contrário deve ser suspenso de imediato”.

E quando existe só um autocarro?

Professora de Português do 12.º ano na Escola Secundária de Barcelos, Fátima Gomes será uma das docentes que vai voltar à escola em Maio. “Pessoalmente, como sou uma pessoa saudável, não me sinto temerosa ou desconfortável”, afirma, mas tal não significa que assine por baixo: “Não encontro sentido nesta abertura, não a acho necessária, e temo que crie uma desestabilização nada aconselhável neste período”.

O Governo justificou este regresso às escolas por parte dos alunos do 11.º e 12.º ano com a necessidade de se prepararem para os exames nacionais. “Mas já estão a ter aulas à distância e têm idade para o estudo autónomo. Nesta fase do campeonato, o mais que deveriam fazer seria estudar autonomamente e recorrer ao apoio dos professores para apoio e esclarecimento”, contrapõe Fátima Gomes, que aponta ainda para um país que é profundamente diferente.

Como garantir, por exemplo, que os alunos vão estar o “mínimo tempo possível nas escolas”, segundo o aconselhado por António Costa, se em muitos sítios existe apenas um autocarro, que leva os alunos de manhã para a escola e os traz de volta às suas freguesias à tarde?, questiona esta docente.

Já Eulália Paulo, professora de História e História da Cultura e das Artes do ensino secundário, assume que não se sente confortável com este regresso às aulas, porque devido a uma doença crónica pertence “a um grupo de risco” e ainda não sabe ao certo “quais as consequências desta situação”. Também desconhece ainda se a sua escola no Montijo, distrito de Setúbal, tem as condições de segurança necessárias. “Mesmo os alunos revelam insegurança e existem alguns que já me comunicaram que não deverão regressar, o que levanta problemas adicionais”, adianta.

Notícia corrigida às 16H00 do dia 1 de Maio. Retira a apresentação como novidade do regresso às aulas também dos alunos dos cursos profissionais, porque já estava previsto anteriormente. E, por outro lado, acrescenta declarações do director da Escola Secundária Eça de Queiroz, José Eduardo Lemos.

Sugerir correcção