PSD quer limitar regra que obriga advogados a revelar esquemas fiscais

Sociais-democratas propõem que os profissionais obrigados ao segredo profissional não tenham de comunicar montagens suspeitas mesmo se o cliente, obrigado a fazê-lo em primeiro lugar, não cumprir essa obrigação fiscal.

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daniel rocha

O grupo parlamentar do PSD quer tornar mais flexível a nova lei que obriga os advogados e outros grupos profissionais a comunicarem à administração fiscal os esquemas de planeamento suspeitos de evasão fiscal montados pelos seus clientes.

Em causa está uma alteração a um projecto de diploma do Governo que transpõe uma directiva europeia que reforça as regras de prevenção da evasão e lavagem de dinheiro a uma série de classes profissionais, desde advogados a consultores, passando pelos bancos ou pelos contabilistas, impondo a estes intermediários a obrigação de revelar à autoridade tributária nacional que um cliente criou uma planificação potencialmente abusiva na União Europeia.

Na prática, o que os sociais-democratas propõem é criar uma espécie de salvaguarda, para que — em determinadas circunstâncias — os profissionais abrangidos pela obrigação do segredo profissional, não tenham de revelar essas informações à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), limitando o poder de fogo das regras desenhadas pelo Governo.

Para perceber o que está em causa na proposta do PSD é preciso recuar ao projecto do executivo, já aprovado na generalidade no Parlamento e à espera de ser discutido e votado na especialidade na Comissão de Orçamento e Finanças.

Primeiro ponto: os advogados, os contabilistas ou os consultores fiscais já estão obrigados, desde 2008, a declarar ao fisco que os seus clientes criaram instrumentos de planeamento fiscal no plano interno, embora dessa lei tenha sido praticamente feita “letra-morta”, pois em 12 anos o fisco só recebeu 94 comunicações e, dessas, só duas foram feitas por advogados.

A nova lei transpõe uma directiva europeia, obrigando estes profissionais a declararem ao fisco português esquemas transfronteiriços, e estende essas obrigações quando existirem esquemas de planeamento internos.

O dever de comunicar à AT um mecanismo impende sobre o intermediário nas situações não cobertas pelo dever legal ou contratual de sigilo. Mas porque há situações em que um profissional poderia estar a violar o dever de sigilo relativamente ao seu cliente ao fazer essa comunicação ao fisco, a lei prevê uma espécie de salvaguarda para essas situações.

Por exemplo, se um advogado identificar uma situação que, à luz da lei, obrigaria ao reporte, tem de notificar o seu cliente de que é ele — contribuinte — que, em primeiro lugar, tem de informar a AT desse esquema, sob pena de apanhar com contra-ordenações. Só se o cliente não o fizer em 30 dias é que o advogado terá de cumprir com essa obrigação fiscal que deveria ter cabido ao contribuinte.

O entendimento do Governo é o de que, nesta circunstância, não há violação do sigilo, porque o intermediário estava obrigado previamente a informar o cliente de que essa obrigação fiscal iria existir e que a relação intermediário-cliente a implicaria.

A alternativa

É relativamente a este último passo dos intermediários que o PSD vem propor uma alteração: em vez de os advogados e outros profissionais terem de cumprir o dever de comunicação ao fisco de forma subsidiária se o cliente não o fizer, ficariam dispensados da comunicação ao fisco.

A discussão sobre se as regras portuguesas preservam, ou não, o segredo profissional já se coloca há vários anos e ajudam a explicar o reduzido número de comunicações que o fisco recebeu desde 2008.

No seu parecer prévio à apresentação da proposta do Governo, a Ordem dos Advogados mostrava-se “contra qualquer norma que proponha a violação do sigilo profissional” e salientava o facto de a própria directiva europeia recomendar, para essas situações, que a obrigação de comunicação seja transferida para o contribuinte que beneficia do mecanismo, como, aliás, veio a acontecer no projecto legislativo entretanto trabalhado pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes.

A proposta do Governo contou, na generalidade, com os votos favoráveis do PS, BE, PCP,  PAN,  PEV e da deputada não inscrita Joacine Katar Moreira (ex-Livre). O CDS-PP e a Iniciativa Liberal votaram contra. O PSD absteve-se, tendo agora apresentado esta proposta de alteração.

Na Comissão de Orçamento e Finanças, o PSD tem como efectivos os deputados Duarte Pacheco, Margarida Balseiro Lopes, Álvaro Almeida, Alberto Fonseca, Afonso Oliveira, Carlos Silva, Eduardo Teixeira e Hugo Carneiro.

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