O que sobra da polémica sobre o 25 de abril

É triste constatar como o CDS, que outrora deu muito à democracia portuguesa, tenha feito uma figura tão lamentável neste episódio.

É preciso procurar compreender as verdadeiras razões da polémica lançada pelo CDS que antecedeu a cerimónia de sábado. Bem para lá das falhas de comunicação da Assembleia da República e do seu presidente, que conseguiu a proeza de adensar em vez de amenizar, conforme é sua obrigação no exercício da função.

Mas isso está longe de explicar o que seja.

Elucidemo-nos então com os factos mais relevantes do caso concreto: 90% dos deputados apoiaram a comemoração do 25 de abril no parlamento. 90%. No lugar de 1020 lugares, estiveram ao todo 100 pessoas. O máximo que estiveram previstas era 130. Repito, 130. Entre o início da polémica e o seu desfecho, caíram 30 lugares. Logo por aí e pela boca de Telmo Correia no sábado, morre o argumento hipócrita de qualquer alcance maior através desta causa. Uma cerimónia que, aliás, acabou por servir como um hino aos cuidados sanitários que se exigem nesta altura.

Sei que existe muita gente bem-intencionada e democrata na verdadeira acepção da palavra que tomou como sua esta causa. Lamento escrevê-lo, mas serviram como marionetes da raiz populista e extrema que não nasceu hoje no país político. Através dela e noutras paragens, escreveram-se reportagens e crónicas rocambolescas e do mais sensacionalista que me lembro de ter visto durante tantos e tantos dias. Nunca tantos dedicaram tanto a tão poucochinho e com tamanha ignorância.

Em determinada crónica, uma jornalista certamente levada pelo mundo das redes sociais e por uma petição de 100.000 assinantes decidiu nomear o povo português. Do princípio ao fim e sem qualquer demagogia, claro está, decretou que a celebração do 25 de abril na AR era uma ofensa para todo e qualquer um. Terminada a cerimónia, os sinais foram exatamente o oposto desta avaliação, mas isso pouco importa porque os 100.000 para ela são representativos da vontade do todo que ela nomeou.

Também não faltou quem se escudasse no aborrecimento e na falta de significado da data para outras gerações. Ora, eu nasci dez anos depois do 25 de abril e, como muitos, sempre senti o contrário. Deixar de assinalar esta data na Assembleia da República com os serviços mínimos é equivalente a não perceber porque é que este era provavelmente o 25 de abril mais relevante dos últimos 40 anos. Como o será viver alheado dos ventos extremistas e populistas que sopram por esse mundo fora.

Mas é nesses ventos e no papel do CDS nisto tudo que importa focar. Quando a nova direção foi eleita, vaticinei o nascer de um novo populismo e uma viragem à direita do partido. Nessa viragem, difícil é o verdadeiro não destronar a cópia e André Ventura deixar de capitalizar esse facto para o Chega e a sua corrida presidencial. É triste constatar como o CDS que outrora deu muito à democracia portuguesa tenha caído nisto e feito uma figura tão lamentável neste episódio. Foi exatamente ao encontro do que havia sido vaticinado e nem três meses passaram. Com o pretexto da pandemia, percebe-se que muitos dos novos órgãos vivem num limbo entre alguma renúncia aos valores e instituições democráticas e a vergonha pública que têm na elevação de outro tempo que a maioria nem conheceu.

Mas, até nisso, o 25 de abril é clarificador. De ora em diante, não se pode dizer que não se sabe com o que se conta. Chegou a hora de o assumirem e não ficarem pela meia verdade, como nos diz Sophia.

O já gasto “eles e nós” faz escola no partido. E qualquer pretexto, por mais baixo que seja, serve a função para tentar enganar as pessoas.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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