Oposição unida (mas vencida) contra anulação do regulamento de AL do Porto

PS lamentou insistência na liberalização do sector, CDU criticou oportunismo da autarquia e PSD falou em má opção. Mas todos unidos não chegaram para vencer maioria de Rui Moreira: o Porto não terá regulamento de AL

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Porto já não vai ter um Regulamento do Alojamento Local Paulo Pimenta

A Câmara do Porto justifica a sentença com a crise pandémica e a incerteza instalada no sector do turismo: o Regulamento do Alojamento Local (AL), em preparação há cerca de um ano e que devia ter sido aprovado entre Dezembro e Janeiro, foi revogado – debaixo de críticas da oposição que, da esquerda à direita, disse não compreender a decisão do executivo. A proibição de novos registos e a criação de áreas de contenção no centro histórico e no Bonfim, zonas onde o número de AL já supera o de habitações de arrendamento de longa duração, ficou também anulada, aprovou a maioria liderada por Rui Moreira, na reunião de câmara desta segunda-feira.

O debate - feito numa reunião online e à qual os meios de comunicação não puderam, mais uma vez, assistir - instalou um muro entre a maioria e os restantes partidos. A medida, disse o socialista Manuel Pizarro no final da reunião, é “impossível de compreender” e um retrocesso no caminho feito nos últimos tempos: “Depois de anos a resistir a qualquer regulação sobre o AL, à primeira notícia de perturbação a medida que toma é voltar a liberalizar completamente o AL”, lamentou.

O socialista questiona-se: “Qual a pressa de ir a correr tomar uma medida de liberalização extrema?” Para Pizarro, o “desconhecimento do que aí virá apelaria a alguma prudência” – e isso não aconteceu. “É errado de todos os pontos de vista, incluindo do de quem está no mercado do AL”, defende, dizendo que a revogação acabará por “prejudicar o arrendamento de longa duração a um preço razoável”.

Ilda Figueiredo, da CDU, apresentou uma declaração de voto para explicar a oposição da CDU à vontade da autarquia. “Acabar com tudo e liberalizar tudo é um perigo e um sinal errado que se está a dar, porque não é isso que queremos para cidade.” Como Manuel Pizarro, também a vereadora comunista acusa a maioria municipal de estar a fazer agora aquilo que sempre quis. 

Ao longo dos últimos tempos, o executivo independente, eleito com o apoio do CDS, manteve “a sua habitual posição de considerar que ‘o mercado’ é que dita as regras urbanísticas da cidade e se auto regula”, acredita Ilda Figueiredo, dizendo que foi o “repúdio” provocado pela situação na cidade que acabou por fazer Rui Moreira aceitar avançar para a criação de um regulamento.

Suspender taxa turística era opção?

Esse documento deveria ter sido levado a votação entre Dezembro de 2019 e Janeiro deste ano, mas isso acabaria por não acontecer. “Não [o] fez (e tal não se deveu à pandemia que hoje vivemos), tendo mais uma vez protelado essa decisão.” Agora, reclama, “com o argumento da pandemia”, a Câmara do Porto desiste de um regulamento que, “objetivamente, nunca quis fazer porque, com os seus princípios liberais na economia, sempre achou que o município não devia regular esta actividade, entregando-a, exclusivamente às regras do mercado”.

Os sociais-democratas compreendem o momento crítico e aceitariam até uma “suspensão” deste regulamento por um período – mas a revogação é uma “má opção”, diz o vereador Álvaro Almeida, que se absteve na votação. “A alteração das circunstâncias justificaria repensar um modelo. Mas o que a maioria propôs foi que deixasse de haver regulamento. Não achamos correcto.”

O vereador e também deputado na Assembleia da República acredita que esse regulamento protegeria, inclusive, o sector. “A falta de regulamentação vai permitir continuar a aumentar o número de alojamentos locais, mesmo onde já há uma grande percentagem. Seria bom, até para quem está no mercado, que não aumentássemos a oferta.”

A proposta do PSD para dar a mão ao sector no momento foi outra: a suspensão temporária da taxa turística, cuja alteração no regulamento foi aprovada também nesta reunião. A maioria não acolheu essa proposta – que Manuel Pizarro subscreveria: “Todos compreendemos que a taxa é uma penalização sobre um sector que está com dificuldade imensa. Mas essa a Câmara do Porto quer manter.”

No resumo da reunião privada feito pela autarquia e enviado aos jornalistas nem uma palavra sobre o debate. Na proposta, o executivo apresenta ainda outra justificação para esta revogação: o Orçamento do Estado para 2020 fez subir a tributação do AL de 35 para 50% em zonas de contenção – e isso já é uma enorme penalização.

Manuel Pizarro compreende, mas faz as contas de outra forma: “Só paga impostos quem tem lucro. Se apesar disto tudo tiverem lucro, não vejo por que não podem pagar.” Ilda Figueiredo sugeriu virar a questão ao contrário: “Se há esse problema fiscal, há que resolvê-lo com o Governo”, disse ao PÚBLICO. E o facto de 47% dos proprietários serem individuais, como terá argumentado a maioria, não chega para a convencer: “Não queremos prejudicar essas pessoas, mas não podemos voltar ao mesmo inferno e continuar a defender os grupos económicos e financeiros especulativos”.

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