Um ano depois do ciclone Kenneth, mais de 120 mil pessoas ainda têm carência alimentar

Além de alimentos, há carência de utensilíos, como ferramentas, e de habitação.

Foto
Um ano depois, Moçambique atravessou nova época das chuvas António Silva/Lusa

No Norte de Moçambique, 123.800 pessoas pedem bens alimentares, um ano depois de terem sido afectadas pela passagem do ciclone Kenneth, diz um relatório de organizações humanitárias e da protecção civil.

A alimentação é referida como a primeira necessidade, mais urgente, por 123.866 pessoas” em 26 localidades, lê-se num documento conjunto do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC) de Moçambique e da Organização Internacional das Migrações (OIM).

O levantamento foi baseado em inquéritos feitos nos dias 27 e 28 de Fevereiro e representa a mais recente recolha de dados publicada acerca das povoações afectadas nas províncias de Cabo Delgado e Nampula, por onde passou o ciclone que matou 45 pessoas.

A segunda necessidade mais urgente destacada por 44.769 pessoas são bens não-alimentares (recipientes, ferramentas) em 23 povoações.

Há ainda 59.209 pessoas (em 17 localidades) a apontar como terceira carência mais urgente a necessidade de abrigo.

Segundo o documento, nas 36 localidades que declararam ter sido afectadas, a maioria (61%) disse ter recebido kits de abrigo, totalizando 65.794 pessoas, enquanto as restantes referiram não ter recebido aquele tipo de apoio.

Neste sábado, passado um ano, em todas as povoações é referido que a totalidade da população efectuou reparações, sendo que metade usou materiais dos kits de abrigo para remendar parte das coberturas das casas.

A juntar às necessidades humanitárias provocadas por aquele desastre natural, a região tem assistido a um aumento da violência armada, classificada agora como uma ameaça terrorista externa, tudo num contexto mais restritivo devido à pandemia de covid-19.

O ciclone Kenneth formou-se seis semanas depois de o ciclone Idai ter devastado a região central de Moçambique, provocando 603 mortos, no único ano desde que há registos em que o país foi atingido por dois ciclones de categoria de destruição extrema.

Abateu-se sobre a região no final do dia 25 de Abril, numa zona pouco habituada a este tipo de fúrias naturais: foi o terceiro ciclone a formar-se na zona norte do Canal de Moçambique, no oceano Índico, desde que há registos por satélite, de acordo com a agência de meteorologia francesa Meteo France - sendo que os outros dois, o Elinah em 1983 e o Doloresse em 1996, não tocaram a costa africana.

Este tocou e embora o seu corredor de destruição fosse estreito, a sua intensidade foi muito alta, massacrando o meio rural, incluindo as ilhas Quirimbas.

Além das mortes, os ventos superiores a 200 quilómetros por hora e a chuva intensa - que persistiu nos dias seguintes - arrasaram aldeias inteiras, destruíram 55.500 hectares de terrenos agrícolas, arrancaram 100 mil coqueiros e cajueiros e destruíram equipamentos de pesca artesanal.

Foram perdas imensas para uma população que vive quase exclusivamente do que apanha da terra e do mar.

O ciclone provocou danos na rede de escolas e centros de saúde, mas no inquérito feito pelo INGC e OIM é indicado que a população já voltou a ter ao dispor os serviços que tinha antes da tempestade.

Um ano depois, Moçambique atravessou nova época das chuvas, mas sem ciclones.

A época chuvosa de 2019-2020 está a terminar, ainda assim com 57 mortes registadas e outras 191 mil pessoas foram afectadas, segundo dados do INGC.

Na região centro, ocorreram 41 mortes na província da Zambézia, oito em Sofala, duas em Manica.

A província de Maputo (Sul) registou quatro mortes e Niassa (Norte) duas.

Os dados, que analisam a situação do país entre Outubro a Março, indicam que maior parte das mortes (45) foi causada por descargas atmosféricas, estando os outros óbitos ligados ao desabamento de residências e afogamentos.

Sugerir correcção