Protecção de Dados avisa câmaras depois de receber queixas: é ilegal identificar infectados

Comissão lembra que não é permitida a identificação directa dos doentes nas publicações das autarquias nem de dados mais gerais mas que permitam perceber de quem se trata por habitar em localidades pequenas.

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PAULO PIMENTA

“As autarquias locais não podem publicar dados de saúde com identificação das pessoas a quem os mesmos dizem respeito” nem dados que, mesmo sem identificação dos doentes, permitam reconhecer de quem se trata dado referirem-se a cidadãos em localidades com poucos habitantes. Fazê-lo é ilegal, avisa a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) num documento com as “orientações sobre a divulgação de informação relativa a infectados por covid-19”.

A Protecção de Dados conta que recebeu queixas de cidadãos que viram os seus “dados pessoais, de identificação e contacto, incluindo de crianças, expostos nas páginas e nas redes sociais da responsabilidade da autarquia local”, depois de lhes ter sido confirmado o diagnóstico de infecção por coronavírus. Em pelo menos um caso é identificada a etnia do doente. Outras situações houve em que, apesar de não serem expostos os dados pessoais, a informação discriminada por freguesia permitiu identificar os doentes por se tratar de pequenas localidades.

Esta informação está sujeita a um regime legal “especialmente protegido”, afirma a CNPD por se tratar de dados pessoais susceptíveis de “gerar ou promover a estigmatização e a discriminação”.

A comissão recorda que os serviços de saúde e as autoridades locais e regionais de saúde são obrigados ao sigilo e o mesmo acontece com as forças de segurança que têm acesso à listagem dos doentes em isolamento profiláctico. E vinca que não se trata sequer de situações em que os doentes permitiriam a publicação dos seus dados pessoais, uma vez que ao se encontrarem nesse estado não estão em condições de dar um consentimento livre sobre essa divulgação. Para além disso, mesmo que as autarquias argumentem que precisam de conhecer e divulgar dados de saúde identificados ou individualizados por uma questão de garantia da saúde das populações, era preciso que isso estivesse previsto na lei - e não está - e acautelasse os direitos dos envolvidos.

“Tal divulgação pública sempre se terá por desproporcionada, pelo impacto negativo que tem na vida das pessoas contaminadas – reitera-se, algumas das quais crianças –, com restrição excessiva dos seus direitos fundamentais”, vinca a CNPD.

A comissão conta ainda que tem várias queixas de divulgação da existência de um ou dois infectados numa freguesia - mas quando ela é pequena e tem muito poucos habitantes, “é fácil identificar as pessoas que se encontram doentes”. Por isso, esses dados genéricos também acabam por ser considerados dados pessoais. A título de exemplo, a CNPD cita a forma de funcionamento da Direcção-geral de Saúde (DGS) que, apesar de divulgar no seu site informação pormenorizada do número de infectado e de óbitos por concelho, não disponibiliza informação desagregada quando o número de infectados é inferior a três.

“Considerando que, com a identificação dos doentes, se verifica o mesmo tipo de impacto na vida privada dos doentes, só pode concluir-se pela falta de legitimidade por parte das autarquias locais para a publicação desses dados, assim como pela desproporcionalidade desta publicação”, avisa a Protecção de Dados. Que “recorda” às autarquias locais que “se devem abster de adoptar iniciativas que impliquem a recolha e a divulgação de dados pessoas dos seus concidadãos quando as mesmas não tenham base legal nem sejam execução de orientações da autoridade nacional de saúde”.

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