O ano lectivo podia terminar já

Começaram as aulas por videoconferência, há programas a cumprir, há exames para fazer, há isto e aquilo, só não há bom senso!

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LUSA/ANTÓNIO PEDRO SANTOS

Tenho estado nestes últimos dias atento às várias opiniões sobre como está a decorrer o 3.º período. A enorme vontade de mostrar trabalho tem-nos feito baixar a guarda aqui e ali no que toca à cibersegurança.

Começaram as aulas por videoconferência, há programas a cumprir, há exames para fazer, há isto e aquilo, só não há bom senso!

O bom senso é dinâmico, bem sei, o que eu defino como sendo de bom senso poderá não o ser para os demais, mas neste caso acho que é unânime que não há bom senso.

Tudo isto é surreal! De repente em pouco mais de um mês queremos alterar todo o paradigma do sistema de ensino existente, não é possível e o que tem acontecido é prova disso.

Acham mesmo que basta apenas que os pais consigam aceder a uma plataforma online de ensino à distância e clique, está dado o grande passo! Não, meus caros, não está!

Nem vou falar que indo por esse caminho estamos a deixar para trás milhares de alunos, aqueles que não têm acesso à Internet, todos os do ensino especial, todos os que nem computador têm, todos os que vivem em zonas recônditas em que nem o telemóvel funciona.

Pensando nos alunos do 1.º e 2.º ciclos, por serem os que menos autonomia de estudo possam ter, que são à volta de 600 mil, e nos respectivos pais — assusta-me perceber as novas dinâmicas impostas pela escola nessas famílias.

Estamos a pedir às famílias que se mantenham em casa, que façam teletrabalho ou que fiquem em lay-off, que aguentem toda esta situação com calma e serenidade, mas que sejam também os professores, porque os conteúdos têm de ser dados e eles avaliados.

É justo continuarmos a olhar para uma situação tão anormal com miopia, achando que podemos continuar a escola como se nada fosse? É justo sobrecarregar estas famílias com esta pressão acrescida?

O importante agora é avaliar? É ensinar conteúdos? A avaliação não será em si uma forma de discriminar, tendo em conta a situação, ainda mais os que podem dos que não podem?

Que famílias teremos depois deste período? O número de desempregados aumenta a cada dia, há milhares de trabalhadores em lay-off e a escola apenas consegue pensar nos conteúdos e na avaliação?

Acho que neste momento o mais importante seria a suspensão, quer na abordagem a conteúdos novos, quer na avaliação.

Há países, e quanto a mim bem, que farão passagens administrativas a todos os anos de escolaridade. Por que não? Serão estes dois meses assim tão importantes no meio de tantos outros problemas?

Considero que o ano lectivo podia terminar já! Parece-me a melhor opção.

O #estudoemcasa seguiria o seu rumo, iniciativa louvável e que deveríamos manter e nós, professores, poderíamos durante este tempo ir apoiando as famílias, sobretudo na consolidação de conteúdos, na orientação e organização das tarefas escolares, mas como tarefa complementar extraordinária num momento difícil para todos.

Paralelamente iríamos preparando com tempo, com cabeça, tronco e membros, um verdadeiro plano nacional de ensino à distância. Não só para prepararmos o futuro longínquo como o futuro próximo pois ninguém sabe como será Setembro.

Tudo aquilo que estamos a querer fazer num mês, poderíamos fazê-lo de forma sustentável, aproveitando todos os dados recolhidos desde do fecho das escolas. Munir todas as residências, seja de professores, seja de alunos, com tecnologia compatível com o ensino à distância e formar professores.

A solução poderia passar por estes três pontos em simultâneo:

  • os professores continuariam de forma mais “próxima” possível (porque o distanciamento social é imperioso) a acompanhar as famílias dos seus alunos, não os deixando desamparados;
  • as juntas de freguesia e câmaras municipais tratariam de tudo o que fosse necessário para abastecer as famílias de meios tecnológicos necessários para ensino à distância;
  • a tutela a organizar-se de forma a haver um verdadeiro Plano Nacional de Ensino à Distância, não como aquele que veio a público que pudesse ser usado sempre que necessário.

Não falei da indisciplina nas aulas online porque não poderíamos esperar comportamentos diferentes apenas porque se está atrás de uma câmara, pelo contrário!

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