Procuradores acusam sindicato de tomar posições ”anti-humanistas” e próximas do “populismo”

Libertação de presos provocou divisão entre os procuradores do Ministério Público e o seu próprio sindicato, liderado por António Ventinhas

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Foi da prisão de Custoias que sairam os primeiros presos abrangidos pelo regime decretado pelo Governo para proteger os reclusos da infeccao por coronavirus . PAULO PIMENTA

Um grupo de procuradores subscreveu uma carta aberta onde critica a posição que a actual direcção do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) assumiu ao manifestar-se contra a libertação dos presos, medida levada a cabo pelo Governo, na sequência do combate contra a covid-19.

Na missiva a que o PÚBLICO teve acesso, os seus subscritores acusam a actual direcção de tomar posições “anti-humanistas” e próximas do “populismo”.

Os subscritores, mais de 30, afirmam que lamentam o conteúdo e o estilo adoptado pela direcção actual do SMMP na carta dirigida à Ministra da Justiça e, sobretudo, no artigo de opinião do secretário-geral Adão Carvalho, “cujo teor se afigura chocante e inadmissível numa magistratura de um país democrático”.

E acrescentam: “Tais pronunciamentos, para além de acantonarem o SMMP a um inédito isolamento no seio dos protagonistas judiciários, sugerem aproximação a conhecidas posições populistas, despojadas de qualquer vestígio de compaixão pelo sofrimento humano”.

E assumem que essas posições “não exprimem o pensamento e sobretudo o sentimento de muitos magistrados do MP e de muitos activistas e antigos dirigentes do SMMP que com elas se não identificam e cuja intervenção cívica sempre contrariou tais ideias e opções”.

Além disso, dizem que” repudiam as tomadas de posição ultra securitárias e anti-humanistas da actual direcção sindical e de alguns dos seus dirigentes, especialmente a que se refere ao diploma legal sobre perdões de pena e indultos aprovado pela Assembleia da República e que visa minorar os riscos de propagação da covid-19 nas prisões e assim salvar a vida de muitos cidadãos e seres humanos, sejam eles presos, guardas ou pessoal de apoio às prisões e seus familiares”.

Os signatários consideram que as medidas de clemência agora decretadas, entre as quais o perdão parcial de penas de prisão para crimes menores, são genericamente justas e adequadas tendo em conta a natureza absolutamente extraordinária da situação que as motivou.

E lembram que” as medidas de clemência penal, entre as quais o perdão, são – sempre foram - instrumentos de política criminal relevantes e democraticamente legítimos”.

“O instituto do perdão, assim como outras medidas de clemência, foi usado por diversas vezes ao longo da nossa história democrática”, lê-se na carta.

Em concreto recordam: “foi-o logo em Junho de 1974, quando o Governo Provisório presidido por Adelino da Palma Carlos, após a libertação que se iniciou a 25 de Abril e representando um acto de confiança que espera ver correspondido na conduta dos futuros beneficiados, decretou uma ampla amnistia bem como o perdão de metade das penas de prisão e de prisão maior - cfr. Decreto-Lei nº 259/74 de 15 de Junho promulgado pelo general António de Spínola. Foi-o a propósito de visitas papais; da eleição de presidentes da República; da comemoração do aniversário do 25 de Abril”.

E questionam se “será que o risco de propagação da pandemia no meio particularmente exposto que são as prisões, não é um motivo ainda mais poderoso para legitimar o uso de instrumentos de política criminal de clemência?”

Entre os subscritores desta Carta Aberta estão Guilherme da Fonseca, Juiz Conselheiro jubilado, primeiro presidente do SMMP, os procuradores António Cluny, antigo presidente do SMMP, Pena dos Reis, Paes Faria, Maria do Carmo Peralta, Susana Figueiredo, Helena Vera-Cruz Pinto, Pina Martins, Carlos Casimiro, Dulce Rocha e Teresa Almeida.

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