Pedido de auxílio da TAP inclui isenções, reformas antecipadas e garantias públicas

Ajuda do Estado terá sempre um “condicionalismo associado”, de acordo com o presidente da administração da empresa, Miguel Frasquilho. TAP pode voltar a operar entre Lisboa e Porto em Maio, bem como voltar a viajar para Paris e Londres.

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Miguel Frasquilho foi esta quinta-feira ao Parlamento falar do presente e do futuro da TAP LUSA/TIAGO PETINGA

O presidente do conselho de administração da TAP, Miguel Frasquilho, afirmou esta quinta-feira no Parlamento que qualquer apoio do Estado terá sempre um “condicionalismo associado”.

Perante os deputados da comissão de Economia realçou que, face ao actual panorama, e tal como já o referiram vários ministros e o próprio primeiro-ministro, “uma eventual nacionalização não pode, evidentemente, ser descartada”, embora tenha depois afirmado que, das várias alternativas disponíveis, essa “é a mais extrema”.

Nas medidas que estão em cima da mesa elencou também a possibilidade de empréstimos convertíveis em acções e um aumento da posição accionista do Estado (hoje é dono de 50%) mas que isso dependerá também “da capacidade que os accionistas tenham de poder recapitalizar a empresa”. A Atlantic Gateway, de David Neeleman e Humberto Pedrosa, detém 45% e nomeia a comissão executiva. Outros 5% estão com trabalhadores. 

Questionado sobre o pedido concreto de apoio efectuado pela TAP junto do Governo, Miguel Frasquilho avançou que foi solicitada a prestação de garantias pelo Estado (através da Parpública ou do Tesouro), “em montante a determinar”, para conseguir acesso a empréstimos de instituições financeiras e assim obter liquidez.

Tanto as garantias estatais para possibilitar o financiamento como o recurso às obrigações contingentes convertíveis em acções (conhecidas como CoCos) foram instrumentos usados pelo Estado para auxiliar os bancos na crise da dívida soberana e na intervenção da troika.

Outras medidas elencadas por Miguel Frasquilho para reforçar a tesouraria foram a isenção de parte do pagamento da taxa social única por 12 meses - com a outra parte a ser paga em prestações -, alargamento do prazo de retenção do IRS referente aos trabalhadores para 180 dias, a possibilidade de se avançar com um programa de reformas antecipadas voluntárias a partir de 60 anos, o adiamento por 180 dias do pagamento de taxas ao regulador, a ANAC, e ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e a isenção da cobrança das taxas aeroportuárias por parte da ANA.

Isto além do layoff já em curso, com 90% dos trabalhadores em casa e outros 10% com horário reduzido, medida que permite uma poupança à empresa da ordem dos 21 milhões de euros por mês. O apoio do Estado, disse, será sempre “para salvar a empresa”, não os accionistas.

Pedrosa quer Estado para baixar juros

Do lado de Humberto Pedrosa, o empresário dono do grupo Barraqueiro já afirmou ao Jornal Económico que nacionalizar a transportadora aérea seria “dar um passo atrás” e que se for preciso um aumento de capital estará pronto para o analisar.

Para já, defende, o que é preciso é liquidez para os próximos meses, tendo sublinhado ao PÚBLICO que “a TAP não está a pedir ajuda ao accionista Estado mas sim ao Estado”. “É natural”, afirmou, que os bancos peçam garantias, e com o apoio do Estado “seguramente se consegue taxas de juro mais baixas” no mercado. Para o empresário, “numa primeira fase”, um “financiamento para a TAP seria suficiente” para ajudar a empresa. Mas não é impossível que o Governo decida avançar desde logo com um modelo misto de garantias públicas e obrigações convertíveis ou reforço de capital. Neste último caso, os privados terão de acompanhar para não diluir as posições, e o Governo até pode conseguir nomear um elemento para a comissão executiva.

Já David Neeleman ainda não se pronunciou sobre estas matérias. O empresário está muito ligado à aviação, com investimentos, além da TAP, na brasileira Azul e, mais recentemente, na Breeze.

Esta semana, a Azul deu conta de uma descida da posição de Neeleman na empresa depois de instituições financeiras terem cobrado as acções (neste caso, preferenciais e sem direito a voto) que tinham sido apresentadas pelo empresário como garantia de um empréstimo de trinta milhões de dólares (27,4 milhões de dólares ao câmbio actual) feito no ano passado.

De acordo com a Azul, “devido à velocidade do movimento e o facto de ele ter outros investimentos no sector sem liquidez como TAP e Breeze, não houve tempo para levantar a liquidez adequada”.

Sublinhando que a situação que a TAP enfrenta, com a necessidade de apoios públicos, é semelhante ao que se passa no sector um pouco por todo o mundo, Miguel Frasquilho defendeu que neste caso o Estado já está presente no capital, e que isso é um factor positivo. Sobre a resposta do Governo ao pedido de apoio, a expectativa é a de que esta chegue “muito em breve”.

Fortes apoios nos EUA

Um dos casos citados pelo presidente do conselho de administração da TAP (que foi escolhido pelo Governo) foi o dos EUA, onde se chegou a acordo esta semana para um pacote de apoios 25 mil milhões de dólares junto de companhias como a American Airlines, Delta, Southwest e JetBlue (sendo os EUA um dos grande mercados da TAP). As ajudam incluem a concessão de capitais, empréstimos e a emissão pelas empresas de títulos de garantia (warrants) convertíveis em capital.

No caso da Southwest, por exemplo, são 3,2 mil milhões de dólares, dos quais 2,3 mil milhões atribuídos pela Administração norte-americana a que se somam outros 900 milhões emprestados a dez anos e com juros baixos, sem garantias. Por seu lado, a empresa emite títulos de garantia a favor do governo equivalentes a 2,6 milhões de acções. De acordo com a Southwest, este financiamento assegura o pagamento de salários aos seus mais de 60 mil trabalhadores “pelo menos até ao final de Setembro”. Até essa data, não pode haver licenças involuntárias ou cortes nos vencimentos dos trabalhadores.

Vouchers melhorados

Para “ajudar a salvaguardar a tesouraria” da TAP, Miguel Frasquilho afirmou que foi feito um pedido para autorizar oficialmente o reembolso “maioritariamente ou apenas em voucher” (algo que, aliás, a empresa já está a fazer, sem devoluções em dinheiro). De acordo o presidente do conselho de administração, a empresa está a alargar o período de utilização do voucher de um para dois anos, majorando o valor de reembolso em 20%. Isso mesmo, aliás, já está explicitado no site da empresa, não tendo sido possível até ao momento receber uma resposta da transportadora sobre o que acontece aos vouchers já emitidos sem essa diferença positiva. Miguel Frasquilho aproveitou ainda a ida ao Parlamento para “pedir desculpa em nome da TAP aos clientes” sobre as falhas no serviço de atendimento.

Nas respostas aos deputados, o gestor afirmou também que a empresa está a atrasar pagamentos a fornecedores, incluindo aqui o leasing dos aviões. Pelo meio, a TAP já cortou o vínculo laboral com cerca de 200 trabalhadores, através da não renovação de contratos. De acordo com Miguel Frasquilho, em resposta aos deputados, a decisão foi tomada antes do diploma final do layoff ter sido publicado. Os trabalhadores, disse, “foram contratados com o fundamento de acréscimo da actividade”, algo que “deixou de se verificar”. Apesar de reiterar que serão os primeiros a serem chamados em caso de retoma de actividade, também confessou que não podia “dar nenhuma garantia”.

Voos entre Lisboa e Porto podem voltar em Maio

Miguel Frasquilho afirmou também que a empresa poderá voltar a ter voos de ligação entre Lisboa e Porto, e entre a capital e Paris e Londres. É preciso, no entanto, perceber mais perto da data “se há condições ou não” para a realização desses voos, dando como exemplo o prolongamento do estado de emergência em França.

No site da empresa já consta um planeamento para o período de 5 a 17 de Maio, onde consta a realização de dois voos por semana para Paris e outros dois para Londres mas ainda nada consta sobre o Porto, pelo que o retomar da operação deverá ocorrer após o dia 17. Com estes dados disponíveis, tudo aponta para a renovação do layoff a nível geral por mais um mês.

Desde o dia 1 de Abril, e até pelo menos 4 de Maio, a TAP está a voar apenas para os arquipélagos da Madeira e dos Açores, de modo a assegurar a continuidade territorial. Na rota Lisboa-Funchal há apenas dois voos por semana, tal como na rota Lisboa-Ponta Delgada. Já Lisboa-Terceira conta com apenas um voo por semana.

Ao todo, estão a ser assegurados apenas cinco voos semanais, o que equivale a uma operação residual, da ordem dos 0,2% da média de voos semanais que se realizavam até ao surto da covid-19.

Na audição parlamentar, Miguel Frasquilho defendeu que a TAP tem um “valor estratégico absolutamente vital para Portugal”, mas que o seu “futuro operacional e financeiro é uma enorme incerteza”, tal como os próximos tempos do sector. Mesmo assim, afirmou que a transportadora irá “superar este período”.

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