Covid-19: Quais os critérios éticos para priorização de doentes em cuidados intensivos

Inquérito foi realizado online entre 6 e 11 de Abril.

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Unidade de cuidados intensivos do Hospital de Santa Maria, Lisboa MÁRIO CRUZ/Lusa

A “esmagadora maioria” dos profissionais e investigadores do sector da saúde concorda que devem existir critérios éticos para a admissão de doentes com covid-19 em unidades de cuidados intensivos, caso venha a ocorrer uma situação de escassez de recursos.

Este é um dos resultados preliminares de um inquérito realizado na Faculdade de Medicina da Universidade o Porto (FMUP) e no Cintesis - Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde e agora divulgado, mas que será estendido a todas as escolas médicas portuguesas, durante os próximos dias.

O trabalho indica que 93% dos inquiridos concordam que a idade não pode ser considerada como o único elemento de decisão.

Coordenado por Rui Nunes (professor da FMUP e especialista em bioética) e Altamiro Costa Pereira (director da FMUP), o estudo foi realizado em tempo recorde. O objectivo é dar resposta a uma série de perguntas que já foram colocadas noutros países, como Espanha e Itália, face à desproporção de doentes graves e muito graves com covid-19 a necessitarem de cuidados intensivos face aos meios disponíveis para os tratar, refere a FMUP em comunicado.

Dos mais de 350 profissionais e investigadores de saúde que responderam ao inquérito online, 91% consideram que, para além dos critérios clínicos, devem existir “critérios éticos universais, explícitos, transparentes e consensualizados para admissão em cuidados intensivos”. Apenas 6% não vêem necessidade da sua existência e 3% não têm opinião sobre o tema.

Quase 90% dos inquiridos concorda também que a decisão deve ser partilhada entre a equipa de saúde, o doente e a família, no sentido de promover “uma comunicação franca e transparente”. Apenas 8% dizem que não e cerca de 3% não têm uma opinião formada.

Quanto aos critérios que deverão presidir à decisão de internar um determinado doente com covid-19 em detrimento de outro, a grande maioria entende que a idade não deve ser decisiva.

Feitas as contas, 93% dos profissionais concordam que a idade não pode ser considerada como o único elemento de decisão. Apenas 4% dos inquiridos acha que a idade serve para decidir quais os doentes prioritários, sendo que 3% confessam não ter opinião.

Cerca de 80% dos profissionais inquiridos entendem que, face à impossibilidade de admitir em simultâneo todos os doentes com a covid-19, “deve valorizar-se a maximização da sobrevivência até à alta hospitalar”. Ou seja, a maioria dos profissionais admite que, se for necessário escolher, deve ser dada prioridade a doentes com mais hipóteses de sobreviverem. Apenas 7% discordam e 13% não têm opinião.

O consenso não é tão grande no que respeita a outro critério possível na priorização de doentes a admitir em cuidados intensivos: o número de anos salvados. Cerca de 66% dos profissionais entendem que se deve valorizar “a maximização do número de anos de vida salvados”, enquanto 18% dizem que não e 16% admitem não ter opinião.

As opiniões dividem-se ainda mais no que se refere à aplicação do chamado “princípio do custo de oportunidade”, evitando como regra absoluta o critério “primeiro a chegar primeiro a admitir”. Ao todo, 56% dos inquiridos respondem que sim, que se deve ter em conta o “custo de oportunidade”, o que implica que nem sempre a admissão deve ser feita por ordem de chegada. Porém, 27% discordam e 17% não têm opinião.

Neste inquérito, realizado entre 6 e 11 de Abril, 51% dos inquiridos são médicos, sendo que 73% têm menos de 50 anos de idade.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já provocou mais de 117 mil mortos e infectou quase 1,9 milhões de pessoas em 193 países e territórios.

Em Portugal, segundo o balanço feito esta quarta-feira pela Direcção-Geral da Saúde, registam-se até agora 599 mortos e 18.091 casos de infecção confirmados.

Dos infectados, 1200 estão internados, 208 dos quais em unidades de cuidados intensivos, e há 381 doentes que já recuperaram.

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