“O fado passa muito pela mensagem. E quanto mais a sentirmos, melhor a cantamos”

Ao segundo disco, Todos os Fados São Meus, Francisco Moreira deixa de lado a sua antiga marca (“Kiko”) e abraça, aos 20 anos, um fado mais adulto.

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Francisco Moreira Krystallenia Batziou

Começou cedo no fado mas só agora, ao segundo disco, vê concretizado o propósito que o trouxe aos meios fadistas. Todos os Fados São Meus, com originais e versões de fados antigos, chega agora às plataformas digitais (há-de ter edição física, em CD, mais tarde) e é a afirmação de uma voz que, ainda jovem, foi crescendo ao seu gosto e ao seu jeito.

Nascido em Vila do Conde, em 27 de Dezembro de 1999, Francisco Moreira pertence a uma família ligada à música, a um grupo de folclore, diz ele ao PÚBLICO: “Cresci nesse meio, um meio musical, e desde sempre me interessei por esse tipo de sonoridade.” E é ainda no final da infância que ele se vê ligado a um programa de televisão. “Comecei com 9 anos num programa da TVI, Uma Canção Para Ti. Mais tarde, a produção desse programa recomendou-me ao produtor Filipe La Féria para participar no espectáculo Fado. Foi aí que comecei a interessar-me mais pelo fado, que já ouvia, e a cantá-lo.”

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A capa do novo disco

Não tardou a concorrer ao Grande Prémio do Fado, na RTP, e a ganhar, em 2012. Na sequência disso, actuou no primeiro e no segundo Caixa Alfama, em 2013 e 2014. Já gravara dois discos, mas nenhum chegou a ser editado: um com versões de canções pop, em 2009, que incluía temas do Festival da Canção como Chamar a música (de Sara Tavares) ou Lusitana paixão (de Dulce Pontes) e outro em 2011, já dedicado ao fado, chamado Sonho de Um Fadista. Entretanto, começara a ouvir fado mais intensamente:

“A pessoa de quem se fala mais nos fados é a Amália Rodrigues, e com todo o mérito e todo o respeito que merece, por ser o nome máximo, mas, como muitos outros jovens, eu também comecei por ouvir os nomes mais recentes. No meu caso foi a Carminho, o Ricardo Ribeiro, o Camané. Mais tarde, dois ou três anos depois de ter começado a cantar fado, é que comecei a ouvir coisas mais antigas: a Amália, o Fernando Maurício, o Fernando Farinha, o Carlos do Carmo ou o Carlos Ramos, que é sem dúvida a minha maior referência, o fadista que eu mais ouço e com o qual mais me identifico. Mas também gosto muito de ouvir o Tony de Matos, o António Rocha ou o Rodrigo.”

Da casa de fados ao estúdio

Só em 2015 é que Francisco Moreira vê editado pela primeira vez um disco, que tinha por título apenas o seu nome, mais o diminutivo pelo qual era conhecido desde criança: “Toda a gente me conhece por Kiko, desde miúdo que me chamam assim e ainda muita gente me apresenta como Kiko. Mas neste disco quis ficar como Francisco Moreira.” O disco foi apresentado ao vivo nesse ano, em Lisboa (CCB), no Porto (Casa da Música) e no Teatro Municipal de Vila do Conde, cidade onde continua a viver. Desde essa altura, canta regularmente numa casa de fados do Porto, a Casa da Mariquinhas, registando algumas actuações pontuais em Lisboa, no Senhor Vinho ou na Maria da Mouraria.

E o disco que agora lança nasceu, diz Francisco, devido a ter começado a trabalhar na Casa da Mariquinhas de forma fixa, faz este mês de Abril um ano. “Os músicos que estão a tocar na Casa (e no Pátio) da Mariquinhas, o André Teixeira [viola] e o João Martins [guitarra portuguesa], trabalharam comigo ao longo destes últimos dois anos, fomos construindo uma amizade muito forte a trabalhar juntos todos os dias.” Foi um trabalho “de muitas noites, em que surgiram ideias”, e o disco foi gravado com eles e Filipe Teixeira (contrabaixo), com o guitarrista Miguel Amaral numa das faixas.

Quer os originais quer as versões foram testados ao vivo na casa de fados, antes da sua gravação em estúdio. Dos 15 que o disco inclui, há versões de fados de Carlos Ramos (Anda o fado noutras bocas, Gostei de ti, Fado é saudade e Rosa da Mouraria), Manuel de Almeida (Longe de ti e Andei à tua procura), António Mello Corrêa (Tinha o nome de saudade), António Rocha (Apagou-se a chama) e Tony de Matos (Fechei as portas à vida). Os restantes são originais, com letras de António Laranjeira (Todos os fados são meus, Amor é golpe de sorte e Ser feliz só por sonhar), Marco Oliveira (E de repente um adeus), Amadeu Ramim (As andorinhas) e do próprio Francisco Moreira (Num só verso), com as músicas assinadas pelos três instrumentistas que participam no disco.

“O fado passa muito pela mensagem. E quanto mais a sentirmos, melhor a cantamos”, diz Francisco. E as escolhas para este disco passaram muito por essa identificação, quer nas versões quer nos originais. O tema de sua autoria é apenas um dos que tem escrito, e talvez entrem num próximo trabalho. “Ultimamente tenho escrito mais fado, e isso terá a ver com um processo de maturidade. Esta é a primeira que gravo, mas se tudo correr bem gravarei outras. Porque todas as semanas me surgem ideias, de letras e músicas.”

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