Ordem dos Médicos quer task force a avaliar o que se passa com doentes sem covid-19

O bastonário da Ordem dos Médicos está preocupado com os números que apontam para um aumento da mortalidade não associada à covid-19 e, em simultâneo, com a redução do episódios de emergência.

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É preciso perceber o que está a acontecer aos doentes que não têm covid-19, defende a Ordem dos Médicos Paulo Pimenta

A Ordem dos Médicos está preocupada com o que poderá estar a acontecer com os doentes graves que não têm covid-19. Analisando um conjunto de dados que têm vindo a público, a ordem teme que doentes prioritários estejam a ser “relegados para segundo plano em patologias que não podem esperar”. E reclama a criação de uma task force que monitorize esses casos.

Reconhecendo que a pandemia da covid-19 obrigaria sempre a uma reorganização dos serviços, e que até concordou com uma “reprogramação das agendas”, que levou ao adiamento de consultas, exames e cirurgias programadas, o organismo liderado por Miguel Guimarães mostra-se agora preocupado com indicadores que parecem apontar para “o excesso de morbilidade e mortalidade” no país. 

No comunicado enviado às redacções, a OM aponta os dados da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e do CINTESIS que referem “uma subida de uma média de 297 mortes por dia nos primeiros sete dias de Março, para uma média de 352 mortes por dia nos últimos sete dias”. Dados que indicam que os últimos dez dias de Março foram aqueles com mais mortes nos últimos 12 anos, 3471, refere-se no documento. A ordem cita ainda a informação da London Business School de que houve em Portugal, entre 16 de Março e 3 de Abril, mais 984 mortes, correspondendo apenas 266 delas a casos da covid-19.

Junte-se a estes dados a informação do Serviço Nacional de Saúde que dá conta de uma grande quebra de idas às urgências — menos 246 mil episódios de urgência em Março, quando comparado com o mesmo mês do ano passado — e Miguel Guimarães teme o pior. “Temos uma quebra colossal no número de doentes que vão à urgência e nem sabemos o que está a acontecer nas restantes linhas de actividade”, refere o bastonário, em comunicado.

Por isso, o organismo representante dos médicos quer que o Ministério da Saúde avance com uma task force que “monitorize com muita transparência e seriedade o que está a acontecer aos outros doentes e que faça contactos directos para que ninguém fique perdido”. Este órgão pode funcionar junto da Administração Central do Sistema de Saúde, sugere Miguel Guimarães, afirmando: “Os danos que a covid-19 está a infligir na nossa sociedade já são suficientemente cruéis para podermos aceitar ainda mais danos colaterais.”

A OM mostra-se particularmente preocupada com eventuais atrasos no “diagnóstico, tratamento e/ou seguimento com exames complementares de doentes oncológicos, de doentes transplantados ou a aguardar transplante, de doenças neurológicas, de outras doenças crónicas como doenças auto-imunes, insuficiência cardíaca, DPOC [doença pulmonar obstrutiva crónica], doenças inflamatórias intestinais, insuficiência renal, diabetes, etc., doenças que podem descompensar rapidamente, em doentes com medo da covid-19 e sem alternativa fácil a cuidados de saúde.”

Miguel Guimarães diz ter a noção que seria “impossível”, perante uma pandemia, manter toda a actividade normal no Serviço Nacional de Saúde, mas não está satisfeito com o cenário actual. “Não podemos aceitar que se esteja a fazer uma gestão meramente política desta pasta, em que parece que só os números da pandemia importam e todas as outras doenças e mortes deixaram de existir”, argumenta.

O bastonário está também preocupado com a possibilidade de estarmos a adiar diagnósticos, pelo atraso na realização de exames complementares que, muitas vezes, são feitos recorrendo a convenções com o sector privado e social que, neste momento, também diminuiu ou encerrou a actividade. 

Apelando a que todos os doentes continuem a procurar tratamento, sobretudo nos casos urgentes, Miguel Guimarães insiste que a ida a uma urgência, em caso de necessidade, não deve ser adiada. “Muito em particular perante sintomas de doenças agudas como o enfarte agudo do miocárdio ou o acidente vascular cerebral”, refere-se no comunicado.

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