Morreu Linda Tripp, a mulher que revelou a relação entre Bill Clinton e Monica Lewinsky

Foram as gravações das suas conversas telefónicas com a ex-estagiária da Casa Branca que acabaram por levar ao processo de destituição do Presidente Clinton. Tinha 70 anos e morreu dias depois de ser diagnosticada com cancro no pâncreas.

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Linda Tripp à chegada ao tribunal de Washington, no Verão de 1998 Win McNamee/Reuters

Linda Tripp, uma antiga secretária da Casa Branca que teve um papel central no processo de impeachment do Presidente Bill Clinton, no final da década de 1990, morreu na quarta-feira aos 70 anos de idade, dias depois de ter sido diagnosticada com cancro no pâncreas.

Apesar de o processo de destituição de Clinton ter ficado ligado ao nome de Monica Lewinsky – a estagiária com quem o Presidente norte-americano manteve uma relação amorosa nos primeiros anos na Casa Branca –, o escândalo possivelmente não teria acontecido sem o envolvimento de Linda Tripp.

Foram as gravações das suas longas e detalhadas conversas telefónicas com Lewinsky, entre 1996 e 1997, que deram ao procurador independente Kenneth Starr as munições para recomendar ao Congresso o afastamento de Bill Clinton por perjúrio, obstrução da Justiça, tentativa de adulterar testemunhos e abuso de poder.

Clinton viria a ser acusado pela Câmara dos Representantes em Dezembro de 1998, por mentir perante um grande júri e por obstrução da Justiça. No julgamento no Senado, que terminou em Fevereiro de 1999, o Presidente norte-americano não foi condenado por nenhuma das duas acusações e viria a exercer o seu mandato até ao fim, em Janeiro de 2000.

De Paula Jones a Monica Lewinsky

O escândalo rebentou em 1998, quando Linda Tripp entregou as gravações das suas conversas telefónicas com Monica Lewinsky ao procurador Keneth Starr. Mas os primeiros sinais surgiram em 1994.

Nesse ano, uma antiga funcionária do governo do Arkansas, Paula Jones, acusou Bill Clinton de assédio sexual durante um encontro entre os dois em 1991, quando Clinton era o governador daquele estado norte-americano.

Esse processo decorreu de forma relativamente discreta até 1998.

Durante esse período, entre 1996 e finais de 1997, Linda Tripp e Monica Lewinsky aproximaram-se, numa altura em que ambas já trabalhavam no Pentágono depois de terem passado pela Casa Branca em diferentes anos – Tripp entrou com o Presidente George Bush e ainda ficou dois anos na presidência de Bill Clinton, e Lewinsky estagiou na Casa Branca entre 1995 e 1996.

Linda Tripp, 24 anos mais velha do que Monica Lewinsky, foi a confidente da jovem estagiária da Casa Branca entre 1996 e 1997, e gravou mais de 20 horas de conversas telefónicas entre as duas, recheadas de pormenores sobre o relacionamento amoroso de Lewinsky com Clinton.

O escândalo acabou por rebentar em 1998 contra a vontade de Monica Lewinsky, que tinha declarado, como testemunha no processo de Paula Jones, que não teve qualquer relacionamento amoroso com o Presidente Clinton. Mais tarde, viria a descobrir-se que Lewinsky fora pressionada a mentir para defender Clinton.

O desmentido de Clinton

Em posse de informação que provava o contrário, Linda Tripp entregou as gravações das conversas telefónicas com Lewinsky ao procurador Kenneth Starr, que tinha chegado a um beco sem saída numa outra investigação sobre Clinton, relacionada com investimentos imobiliários no Arkansas.

O processo ocupou todo o ano de 1998 até ao início de 1999.

No final de Janeiro de 1998, Bill Clinton surgiu perante as câmaras de televisão para desmentir os rumores da sua relação extraconjugal com Monica Lewinsky: “Quero dizer uma coisa ao povo americano. Vou dizer outra vez e quero que me ouçam bem. Não tive relações sexuais com essa mulher, a menina Lewinsky; nunca disse a ninguém para mentir, nem uma única vez, nunca. Estas alegações são falsas, e eu tenho de voltar a trabalhar para o povo americano.”

Nos meses seguintes, já com as gravações das conversas telefónicas, com um novo testemunho de Monica Lewinsky e com provas materiais como o famoso vestido azul com vestígios de sémen de Bill Clinton, o procurador Starr conseguiu enviar para o Congresso um processo sólido com base na relação extraconjugal do Presidente, e não no objectivo inicial das investigações, sobre investimentos imobiliários no Arkansas.

Durante anos, Linda Tripp foi acusada de fazer o jogo do Partido Republicano e ridicularizada em programas humorísticos como o “Saturday Night Live”, onde era representada pelo actor John Goodman.

Deu poucas entrevistas desde que o escândalo rebentou e manteve sempre que denunciou o caso por “dever patriótico”.

“Não acordei um dia e decidi ir atrás de um Presidente em exercício”, disse Linda Tripp numa das suas últimas entrevistas, ao diário britânico Daily Mail, em 2017.

“Ele era o líder do mundo livre e ela era uma estagiária, uma miúda, que era também emocionalmente muito jovem para a sua idade”, disse Tripp na mesma entrevista.

Monica Lewinsky e Linda Tripp nunca mais se falaram desde que o escândalo rebentou. Em 1998, Lewinsky concluiu o seu depoimento no julgamento de Clinton com uma declaração que viria a selar o afastamento entre as duas mulheres: “Sinto muito por tudo o que aconteceu, e odeio a Linda Tripp.”

Na quarta-feira, depois de ouvir as notícias sobre o agravamento do estado de saúde de Tripp, Lewinsky comentou no Twitter: “Independentemente do passado, espero que a Linda Tripp recupere. Não consigo imaginar o quão difícil isto está a ser para a sua família.”

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