Covid-19: Coligação saudita prepara-se para cessar-fogo no Iémen

A aliança militar liderada pelos sauditas prepara-se para anunciar um cessar-fogo que deverá entrar em vigor à meia-noite desta quarta-feira, diz a Reuters. Tem como objectivo apoiar uma iniciativa das Nações Unidas. Não se sabe como os rebeldes Houthis vão reagir.

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Trabalhadores iemenitas limpam as ruas de Sanaa por causa do coronavírus YAHYA ARHAB/EPA

A coligação liderada pela Arábia Saudita prepara-se para impor um cessar-fogo unilateral no Iémen a partir da meia-noite desta quarta-feira, diz a Reuters. O objectivo é apoiar uma iniciativa das Nações Unidas depois de o secretário-geral, António Guterres, ter apelado ao fim de todos os conflitos militares por causa da pandemia de coronavírus. 

A guerra no país já fez mais de cem mil mortos, seja à fome ou à bomba, e três milhões de desalojados numa população de 24 milhões. E o bloqueio marítimo saudita impede que alimentos e medicamentos cheguem à população. 

Espera-se que o cessar-fogo entre em vigor esta quinta-feira, diz a Reuters, mas as promessas de se travarem os combates já foram feitas no passado. Não se passou das palavras aos actos e desta vez não se sabe como o movimento Houthi, apoiado pelo Irão, vai reagir. 

Sabe-se, no entanto, que os Houthis enviaram às Nações Unidas um documento com a sua perspectiva para se terminar com uma guerra e um bloqueio marítimo que há quatro anos dilacera o país do Médio Oriente. “[A nossa proposta] Vai criar as fundações para diálogo político e um período de transição”, garantiu no Twitter Mohammed Abdulsalam, porta-voz dos Houthis, sem no entanto adiantar pormenores. 

Por agora, está em cima da mesa uma proposta do enviado especial das Nações Unidas para o Iémen, Martin Griffiths, para se encontrar uma solução política e espera-se que representantes dos dois lados se reúnam em breve, por vídeo-conferência, para debater um cessar-fogo. Neste sentido, a iniciativa da coligação liderada pela Arábia Saudita é bem acolhida e pode abrir caminho a um entendimento, por mais frágil que possa ser. 

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, pediu recentemente um cessar-fogo global referindo que a pandemia pode ter efeitos desastrosos nas zonas de conflito, entre as quais o Iémen, por o seu “conflito esquecido” ter criado a maior crise humanitária da actualidade. “A fúria do vírus ilustra bem a loucura da guerra. Vamos acabar com a doença da guerra e lutar contra a doença que está a devastar o nosso mundo. É por isso que peço um cessar-fogo global e imediato em todos os cantos do mundo”, disse Guterres, sublinhando que o “mundo enfrenta um inimigo comum: a covid-19”. 

Apesar de bem recebido, o apelo de Guterres não tardou a ser desrespeitado por ambas as partes. A coligação da Arábia Saudita bombardeou esta segunda-feira vários alvos de relevo na capital, Sanaa, algo que não acontecia desde Setembro. E na véspera os rebeldes houthis lançaram dois mísseis contra Riad, a capital saudita, acusou a coligação.

O Iémen já lida com uma epidemia

A braços com uma epidemia de cólera, o Iémen não tem até ao momento nenhum caso identificado de coronavírus, mas é bastante provável que a inexistência de casos se deva mais à falta de cuidados de saúde – e de rastreamento, como testes – do que a não haver infectados. A Organização Mundial de Saúde alertou que os muito frágeis serviços de saúde iemenitas não vão aguentar o embate da pandemia. 

Os serviços de saúde iemenitas têm sido um dos alvos dos bombardeamentos da coligação liderada pela Arábia Saudita, acusam várias organizações humanitárias, e o ministro da Saúde do Governo de Salvação Nacional Houthi, Taha al-Mutawakel, disse que 93% do equipamento médico no território que controla está fora de serviço.

O Governo Houthi já ordenou o encerramento das precárias escolas, dos cafés e de todos os eventos sociais, como casamentos, no território que controla. Já o Governo de Acordo Nacional, apoiado pela Arábia Saudita, também fechou todas as escolas, ordenou aos profissionais de saúde que testem os estrangeiros que cheguem ao país e destinou uns meros quatro milhões de dólares para o combate à pandemia. 

De acordo com as Nações Unidas, 80% dos 24 milhões de iemenitas precisam de algum tipo de apoio humanitário ou protecção, dos quais 14,3 milhões de ajuda urgente, e a maioria do apoio que recebem é da responsabilidade de organizações humanitárias internacionais. 

Há mais de 4,7 milhões de iemenitas, das quais mais de uma centena de milhares de crianças, a sofrer de fome e o país lida desde 2016 com a pior epidemia de cólera do mundo. Há cinco anos que a doença produz 50 casos suspeitos de cólera a cada hora, contando-se já mais de 2,3 milhões, diz a Oxfam. 

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