Autoeuropa recorre ao layoff mas trabalhadores recebem a 100%

Fábrica da Volkswagen em Palmela só regressará ao horário completo, com 19 turnos, na primeira semana de Junho.

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Os 35 dias de paragem desde 16 de Março significam menos cerca de 30 mil unidades produzidas até à retoma de parte da laboração a 20 de Abril Daniel Rocha/Arquivo

A Autoeuropa vai regressar ao trabalho de forma faseada a partir de 20 de Abril. O turno da noite não será retomado de imediato, segundo proposta apresentada à Comissão de Trabalhadores desta fábrica da Volkswagen, onde trabalham quase 6000 pessoas.

A administração vai recorrer ao layoff simplificado, criado pelo Governo para ajudar empresas a lidar com a travagem económica decorrente da pandemia de covid-19, mas aceitou uma proposta da CT que garante o pagamento integral de salário mesmo durante o layoff - regime em que, normalmente, o trabalhador vê o seu salário bruto ser reduzido em um terço, quando fica em casa com o trabalho suspenso.

A informação foi confirmado pelo PÚBLICO junto de Fausto Dionísio, coordenador da CT, e de João Delgado, porta-voz da empresa.

Nenhuma das fontes especificou quantos trabalhadores serão colocados em layoff, explicando ambos que isso vai depender do desenho que vier a ser feito para o regresso ao trabalho. O que se sabe é que a empresa recorrerá às duas formas de layoff previstas na lei, ou seja, haverá trabalhadores que vão ficar em casa com o contrato suspenso e outros que ficarão com horário mais reduzido.

Seja qual for a modalidade, todos continuarão a ter direito à remuneração integral. Administração e representantes dos trabalhadores estiveram reunidos para analisar propostas para o futuro próximo e chegaram a um consenso em relação a essa contrapartida que tinha sido posta em cima da mesa pela CT. 

Isto significa que a unidade do grupo Volkswagen pagará os 30% dos dois terços de salário a que tem direito cada trabalhador com contrato suspenso, o Estado assegura os outros 70% e, a este valor, acresce o restante terço do salário-base, que é integralmente assumido pela Autoeuropa.

A mesma lógica se aplica no caso de trabalhadores com horário reduzido: a empresa vai pagar as horas trabalhadas, pagará parte da compensação retributiva caso o trabalhador tenha direito a ela e depois cobre o resto, se necessário, para garantir a remuneração a 100%.

A produção está parada desde 16 de Março, com os trabalhadores a “descontarem” estes dias de paragem com os chamados downdays. Estes são uma ferramenta de flexibilidade que permite paragens sem afectar o salário-base.

A partir do dia 13 deixará de haver recurso a este mecanismo em termos colectivos, passando-se a utilizar “créditos legais referentes a anos transactos” para cobrir, sem prejuízo salarial, a paragem que se estende até dia 19, explica a CT num comunicado enviado aos trabalhadores nesta quarta-feira. Estes créditos incluem dias de férias não gozados, por exemplo. Já o período de férias de 2020 “mantém-se inalterado”, confirma a CT no mesmo comunicado.

A paragem forçada do dia 16 de Março até 19 de Abril vem com um custo de produção para esta fábrica que, graças ao modelo T-Roc, pulverizou o recorde de produção em 2019, com 254.600 viaturas a saírem da unidade de Palmela. Esse custo traduz-se em menos 30.500 carros, produzidos durante os 35 dias de paragem total, o equivalente a 12% da produção do ano passado. As contas são do PÚBLICO, com base numa média diária de produção de 870 veículos.

Mas esse custo não fica por aqui. A aposta num regresso gradual, com a supressão do turno da noite e ausência dos turnos de fim-de-semana (que movimentam entre 600 e 700 trabalhadores) significa, por outro lado, que a empresa vai estar a produzir carros abaixo do nível médio diário de 2019.

O horário dos 19 turnos (três por cada dia de semana e dois por cada sábado e domingo) só será restabelecido na íntegra na primeira semana de Junho, diz ainda a CT. Segundo Fausto Dionísio, a empresa precisa de um período mais longo de ajustamento às condições de mercado, que será bem diferente nos próximos tempos.

Os principais mercados da Autoeuropa, que exporta praticamente tudo o que produz, são alguns dos países europeus mais afectados pela covid-19, como Itália, Reino Unido e Espanha. E a travagem económica é tão profunda lá como cá, o que significa que dificilmente esses mercados sairão de quarentena com vontade de comprar carros.

Além disso, as próprias cadeias de abastecimento da unidade de Palmela precisarão de tempo para se restabelecerem sem falhas. E, tudo isso, anota Fausto Dionísio, ajuda a explicar por que se apostou num regresso gradual ao trabalho.

A Autoeuropa começou por suspender a produção até 29 de Março, mas depois prolongou essa medida até 12 de Abril. Não é a única grande empresa portuguesa a comprometer-se com o pagamento de salários acima daquele a que um trabalhador em layoff teria direito. A TAP, que avançou com layoff para 9000 trabalhadores, vai pagar salários acima do previsto no apoio do layoff, tal como o PÚBLICO noticiou.

Desde a sede alemã, o grupo Volkswagen anunciou nesta quarta-feira que vai doar um milhão de euros para ajuda humanitária em campos de refugiados na Síria, na Turquia e na Grécia, ao abrigo do combate à pandemia de covid-19. Essa verba será entregue à Cruz Vermelha na Alemanha.

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