Um “minidiário” sobre a quarentena para mostrar que a arte importa

Fotogaleria

Francisco Nunes é um algarvio de 35 anos que vive no Porto. Licenciou-se em Design de Videojogos e Design Gráfico em Inglaterra e, nos últimos tempos, trabalhava na área da restauração. Até que se viu desempregado por causa da pandemia de covid-19 — é um dos muitos portugueses que foram despedidos depois das medidas de contenção ao surto do novo coronavírus terem entrado em vigor.

Para aproveitar o tempo livre, decidiu começar um “minidiário” da quarentena no Instagram, com uma personagem fictícia inspirada em si próprio. Tenta falar sobre um assunto sério com um certo tom de brincadeira — até porque se fosse a relatar mesmo o que sente, tudo seria “muito mais negro”, admite ao P3.

Desenhar todos os dias não é fácil, mas ajuda-o a criar uma rotina. Muitas vezes não se consegue focar no desenho porque está preocupado com o que está a acontecer, tem um bloqueio criativo. "Estamos sempre a dizer que precisamos de tempo, mas quando o temos há outro problema em cima e torna-se complicado. É um conflito interno."

Com estas ilustrações, conseguiu alcançar um novo target. Costumava fazer coisas mais “abstractas”, capas para CD ou desenhos para tatuagens, mas esta mudança está a ter um “impacto positivo”. “Há pouco tempo fiz uma ilustração em que o estafeta da Uber Eats é um anjo e a pessoa que o recebe está quase a rezar. Tive logo feedback de restaurantes e pessoas que reconhecem que é importante continuar com o mercado”, conta. Foi mais do que um simples "gosto ou não gosto": “Tenho imensos colegas prestes a despedir-se e que se identificam com a imagem que reflecte o mundo da restauração agora.”

O ilustrador está à procura de trabalho enquanto freelancer, mas as propostas escasseiam. “Toda a gente à minha volta nas artes ficou sem trabalho, foi um impacto muito forte, cheguei a pensar que podíamos viver num futuro onde a arte não seria uma coisa importante”, lamenta Francisco. Ainda mais nesta temporada de isolamento social em que livros, filmes ou ilustrações são das poucas coisas disponíveis “para as pessoas se entreterem, com sentido de humor, e libertar um bocado a tensão, esta nuvem que está a passar”. Francisco compara este período ao Inverno da Guerra dos Tronos: "Sabemos que o Inverno vai chegar, estamos a temporada inteira à espera e sabemos que o pior ainda não chegou.”