“Generais arriscam ser julgados por ajustes directos em hospital militar” publicado a 5 de Março 2020

Sobre o ataque à boa reputação das pessoas

“A única mulher general existente em Portugal” é uma forma tendenciosa, discriminatória e degradante de iniciar uma notícia que, após lida na sua integralidade, permite verificar que em nada há de específico relativamente ao facto de ser uma “mulher”, “general” ou a “única” em Portugal.

O struggle for survival da imprensa não pode justificar tudo, nomeadamente, que se ultrapassem os limites mínimos da ética e da boa prática jornalística que deveriam prevalecer em quaisquer circunstâncias.

É ainda de lamentar o absoluto desdenho pelo contraditório, uma vez que a notícia foi publicada sem que tenha sido precedida de uma simples tentativa de contacto com a minha pessoa, numa desprestigiante ausência de respeito que na verdade deveria ser inato e apanágio do jornalista.

Enfim, assim se mostra possível conceber uma estratégia concertada de lesão pública da imagem e bom nome de um terceiro, com origem em altas entidades que, sedentas de protagonismo, publicamente vêm manifestando facilidade de “articulação” com determinados jornalistas de diferentes órgãos de comunicação social.

Para melhor esclarecimento sugiro a leitura das crónicas elaboradas por um “iluminado” militar reformado, publicadas no semanário Sol nos dias 2 e 11 de março, 27 de abril e 1 e 8 de junho, de 2019.

Enfrentando as alegadas “ilegalidades”

Uma minimamente atenta leitura das alegações por mim enviadas ao Tribunal de Contas (TdC) teria permitido um claro esclarecimento das razões que nortearam o sucedido e não as “ilegalidades” precipitadamente referidas na notícia.

Permitiria esclarecer as enormes fragilidades e o estrangulamento com que se confronta o Hospital das Forças Armadas (HFAR) e o empenho com que diariamente se combatem as dificuldades e mantém a segurança dos utentes.

O HFAR não detém autonomia administrativa, depende do Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas.

Em cumprimento do regime de rotatividade, o cargo de Diretor do HFAR esteve atribuído à Força Aérea entre 23 de outubro de 2016 e 23 de outubro de 2019, tendo eu assumido funções (por indigitação da Força Aérea e nomeação Ministerial) nos últimos 15 meses desse período, por passagem à reserva do meu antecessor.

O Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA) possui Tesouraria centralizada e as despesas de todas as Unidades que integram o EMGFA, onde se inclui o HFAR, são previamente autorizadas pela Direção de Finanças do EMGFA.

E de facto, sendo referidos os nomes de dois dos alegados responsáveis pelas “ilegalidades”, estranhamente é omitido que, de acordo com a auditoria do TdC, existe um terceiro elemento entre os “Eventuais responsáveis – identificação nominal” de “Factos Suscetíveis de integrar infrações financeiras” e não se trata do “diretor financeiro da unidade de saúde”, como erradamente (?!) foi escrito.

No decurso do ano de 2019 foi o HFAR contemplado com oito auditorias, sete da Inspeção Geral da Defesa Nacional (IGDN) e uma do TdC. As recentes inconformidades detectadas pelo TdC já o haviam sido pela IGDN.

Assim à data da auditoria do TdC já se encontravam devidamente identificadas as graves deficiências de Recursos Humanos (RH) e a falta de qualificações, sendo que a implementação das medidas correctivas possíveis não dependem do HFAR.

A gestão dos RH dos militares do HFAR é da responsabilidade de cada um dos Ramos das FFAAA e o grave défice de RH no HFAR é transversal a todas as áreas.

O Serviço Financeiro do Departamento de Administração e Finanças do FAR é um exemplo. Segundo o Quadro Orgânico de Pessoal deveria contar com oito colaboradores, conta com apenas três e, durante algum tempo, contou com um.

O Serviço de Comunicações e Sistemas de informação deveria contar com treze colaboradores, tinha cinco e nenhum deles com qualquer qualificação para gerir/ intervir em sistemas informáticos de saúde.

Há vários anos que se verifica a dependência do HFAR de empresas fornecedoras de serviços no âmbito das Tecnologias de Informação e Comunicações, que garantem dois colaboradores especializados em Bases de Dados da Saúde, os únicos qualificados para o efeito, quando as FFAA dispõem de dois militares com as qualificações exigidas, mas colocados nos Ramos.

O funcionamento dos Serviços de Urgência e Unidade de Cuidados intensivos exige a contratação de empresas fornecedoras de serviços médicos especializados, num valor estimado anual acima dos 350.000 euros.

Os procedimentos de submissão à aprovação pelo TdC e autorização de inscrição no Plano Orçamental de 2019 seriam da responsabilidade da DIRFIN, entidade a que o HFAR enviou a Manifestação de Necessidades. Contudo este processo não teve o seguimento em conformidade com o legalmente estabelecido para o efeito o que obrigou a manter a empresa do ano de 2018.

A alternativa seria encerrar os referidos serviços, solução que nunca, sequer, e obviamente, equacionámos. A segurança dos utentes prevaleceu.

Apesar da tentativa de divulgação do contrário, a gravidade da situação permanece.

A recente exoneração do meu sucessor sob a alegação de “inadaptação do cargo”, tal evidencia.

Citando Talleyrand: “Eu respondi que se era certo que isto ia bem sem o dizer, iria melhor se o dissesse”.

Regina Maria de Jesus Ramos Mateus

Brigadeiro-General Médica

Nota da direcção:

A 11 de Março o PÚBLICO solicitou ao porta-voz da Força Aérea uma entrevista com a brigadeiro-general Regina Mateus, pedido esse que não teve, até ao momento, qualquer resposta.

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