Ser professor: profissão, emprego ou trabalho?

Devolver o seu valor à carreira profissional e vocação pessoal mais bonita da relação com os outros é de extrema importância.

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Ensaio da peça de teatro "Professar" de Ligia Soares e Sara Duarte, interpretada por professores e educadores Nuno Ferreira Santos

Há profissões, há empregos e há trabalhos. Como percebemos que queremos ser professor?

Há empregados com profissões definidas, há desempregados com alguns trabalhos, há profissões que não necessitam de empregos.

Como se percebe o que temos? Pela formação que tivemos e mantemos e que nos apaixona, pela sua duração no mesmo espaço, pelo tipo de remuneração que lhe corresponde e, por fim, mas talvez o mais importante, pela satisfação que sentimos ao exercê-la, pelo reconhecimento que sentimos ter dos outros, clientes ou não. Não o reconhecimento da pessoa, mas o reconhecimento do bem ou serviço que acrescentamos a quem nos procura.

E ser professor? Como percebemos que é esse o nosso futuro? Como podem os jovens hoje perceber que é esse o futuro que querem para si?

Cada vez mais ouvimos relatos, descrições, reportagens sobre a vida itinerante dos professores, de episódios que vivem dentro da sala de aula e, fora de la, com os pais dos seus alunos, entre muitas outras experiências, que passam também pela sua formação contínua e actualização pedagógica face à mudança de paradigma da educação.

Estas notícias, que ilustram de forma muito concreta os diversos problemas com que se deparam os professores, e que só se percebem verdadeiramente quando os vivemos na primeira pessoa, foram ao longo de muitos anos o factor desmotivador para muitos jovens não abraçarem a carreira docente.

Alguns persistiram. Porquê? Habitualmente porque gostam de crianças e jovens e do contacto com elas. Na maioria das vezes, os verdadeiramente apaixonados pela educação tiveram momentos de felicidade com professores, mestres de mão cheia, que operaram transformações marcantes.

Há professores cientificamente muito competentes, capazes de inspirar os seus alunos com as matérias que leccionam e que os fazem descobrir pormenores que tocam fundo nas suas aspirações. Também há aqueles professores que com a sua maneira de ser e de reagir perante um desafio ou um conflito, provocam, de forma inesperada, a admiração e respeito dos seus alunos, para sempre.

O impacto é sempre maior pelo modo como comunicamos do que por aquilo que comunicamos. Colaborar na descoberta do conhecimento e das escolhas para a vida é criar impacto, dar ferramentas, acompanhar e deixar viver. Ser professor é promover autoconfiança e confiar.

Ser professor é uma profissão que, nos últimos anos, tem sido tratada como um trabalho. Por vezes até temporário. Por muitos encarada como um emprego, no qual se persiste porque é necessário dinheiro para viver e rotinas que nos segurem a vida. Mas qual vida?

Devolver o seu valor à carreira profissional e vocação pessoal mais bonita da relação com os outros é de extrema importância. Para que a figura com autoridade e respeito natural, possa persistir para além das fronteiras da família e das adequações pedagógicas nos novos paradigmas educativos. Não há quem ou o quê que substitua o professor. Tirem o sentido do ensino doméstico ou da inteligência artificial. Os papéis são outros. A relação do professor não se quer filial. A relação professor - aluno quer-se intuitiva, empática, desafiadora, cuidadosa, com conveniente proximidade e devida distância.

Esta situação acarreta muitas facetas: a formação contínua, as colocações, as habilitações para a docência, a progressão dos alunos e a avaliação, a inclusão e equidade, as condições de trabalho, entre muitas outras.

Há excelentes professores a darem o seu melhor aos alunos que tem na mente, no coração e entre mãos. Reinventam-se todos os dias, superam as suas ansiedades, preparam novos modos de construir conhecimento, fazem por se integrarem no modus vivendi dos seus alunos e querem entrar na linguagem do século XXI, quando durante tanto tempo ensinaram como há dois séculos.

Este esforço enorme, primeiro de reconhecimento da necessidade da mudança, de aprender como se pode fazer a mudança e de a implementar, deve ser reconhecido e aplaudido. O esforço é notório e os resultados começam a ser visíveis. Os professores querem fazer diferente e melhor e trabalham para que os seus alunos possam lucrar com este seu investimento. Fazem formação, grupos de trabalho dentro das escolas, interescolas, partilham materiais e experiências, novas abordagens digitais ou outras.

É urgente restaurar e devolver a carga de importância social da profissão que assegura o conhecimento e cultura das sociedades. É o que resta no final: conhecimento e cultura.

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