Covid-19: há mais um pavilhão em Lisboa pronto a acolher pessoas sem-abrigo

Câmara de Lisboa tem quatro pavilhões abertos para acolher quem não tem uma casa para se proteger da pandemia. Autarquia reforçou a alimentação pelas ruas, com a distribuição de mais mil refeições diárias.

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Um pavilhão desportivo, com tabelas de basquetebol, marcações do chão, que agora leva camas, mesas e cadeiras para acomodar quem não tem uma casa para se proteger do surto de covid-19. Na manhã desta quarta-feira, o pavilhão do Clube Nacional de Natação estava vazio, mas havia vestígios das 17 pessoas que ali tinham pernoitado. Malas, sacos aos pés das camas. Já todos tinham saído e três mulheres tratavam de limpar o chão e as mesas, para reduzir ao máximo o risco de contágio. 

O pavilhão do Clube Nacional de Natação, na Rua de São Bento, abriu às 18h de terça-feira e é o quarto espaço que a Câmara de Lisboa abre para dar uma resposta mais “humana” a quem não tem quatro paredes para se proteger da pandemia. 

O primeiro a abrir, há duas semanas, foi o Pavilhão do Casal Vistoso, no Areeiro, onde começaram por acolher quarenta homens. Foi depois alargado a mais quarenta vagas, destinadas a casais, e tem ainda espaço para acolher os animais que costumam acompanhá-los. 

O município abriu entretanto mais dois espaços, a Casa do Lago, que se destina apenas a mulheres em situação de sem-abrigo e o Pavilhão da Tapadinha, também para 40 homens. 

Nestes centros, além de poderem dormir, a população sem-abrigo tem acompanhamento médico e social, refeições, mantas, pode tomar banho e trocar de roupa — o grupo hoteleiro Vila Galé está a cooperar na lavagem das roupas.

“É uma resposta mais humana, mais protectora e é também uma reposta mais eficaz do ponto de vista da saúde pública”, disse o presidente da câmara, Fernando Medina, numa visita ao pavilhão do Clube Nacional de Natação esta quarta-feira. “No caso de detectarmos alguma situação de risco de infecção podemos mais rapidamente proceder o confinamento, à quarentena e à sua entrada no SNS.”

Nas regras de segurança, afixadas em várias zonas do pavilhão, é recomendada uma distância de segurança de dois metros. Porquê a opção pelos pavilhões, se as ruas estão quase desertas? “Porque são muitos”, respondeu o vereador dos Direitos Sociais da Câmara de Lisboa, Manuel Grilo.

Na capital, segundo os últimos dados conhecidos, dormem nas suas ruas 361 pessoas, mas há mais 1967 que estão em quartos, centros de acolhimento temporário, alojamentos específicos para pessoas sem casa ou projectos Housing First. “Com estes quatro pavilhões, estamos a dar resposta a metade [dos que estão na rua]”, disse Manuel Grilo. 

Num dia como o desta quarta-feira, em que a chuva deu poucas tréguas e as temperaturas baixaram a níveis invernais, a opção por colocá-los debaixo de um tecto acaba por fazer mais sentido. O procedimento é, de resto, semelhante ao adoptado quando é activado o plano de contingência das vagas de frio, mas há um controlo mais apertado nas entradas. 

Em todos os pavilhões, os que lá quiserem entrar têm de medir a temperatura e passar por uma pequena entrevista, feita por profissionais de saúde, para despistar outras sintomas associados à covid-19 e para garantir, “tanto quanto é possível”, que não há contágio lá dentro. 

Para já, não há nenhum caso conhecido de infecção dentro da comunidade sem-abrigo de Lisboa, disse Fernando Medina. As equipas que dão assistência nestes pavilhões são constituídas por técnicos da câmara, das ONG que trabalham habitualmente com a autarquia junto desta população, e por voluntários.

“Um equipamento só abre quando temos uma equipa completa que garanta segurança e um bom atendimento do ponto de vista médico e social”, notou o vereador dos Direitos Sociais, que revelou ainda estar com dificuldades em “mobilizar enfermeiros para assegurar as rotações de pessoal”. 

Fernando Medina aproveitou ainda a ocasião para fazer um apelo a todos aqueles que possam e queiram inscrever-se como voluntários na Rede Solidária, lançada pelo município para ajudar no combate à covid-19. “Já temos mais de 1200 pessoas inscritas, mas precisamos de mais, porque as nossas necessidades aumentaram”, disse, dirigindo-se especificamente a jovens que tenham formação nas áreas sociais e médicas.

Horários alargados, alimentação reforçada

Grande parte das vagas destes pavilhões para sem-abrigo está já ocupada. O Pavilhão do Casal Vistoso está cheio — ultrapassou até a lotação prevista, chegando a acolher 91 pessoas —, o que exigiu à autarquia que disponibilizasse mais respostas. 

O Pavilhão da Tapadinha está, neste momento, também lotado e a Casa do Lago está quase lá, com 17 mulheres, podendo receber até 20. Nesta primeira noite dormiram no pavilhão do Clube Nacional de Natação 17 pessoas, mas há capacidade para acolher até 40 homens.

A “pressão” para que os pavilhões estivessem sempre abertos fez com que, há uma semana, a autarquia tenha decidido alargar o horário de funcionamento. Se antes estavam abertos das 18h às 9h, agora estão abertos 24 horas por dia. 

Manuel Grilo não arrisca dizer até quando se manterão abertos. Será até a crise acabar e, se for necessário, serão abertos mais, mas sempre com as equipas técnicas asseguradas, garantiu o responsável. “Não vamos abrir centros improvisados. Só demos passos para pavilhões seguintes quando tínhamos equipas suficientes e treinadas.” 

As cinco equipas técnicas de rua da autarquia mantêm-se no terreno. Para já, admitiu o vereador, é ainda difícil de perceber se há mais gente na rua, desde que o surto de covid-19 começou. “Durante o dia, há muitas pessoas em situação de sem-abrigo e pessoas pobres na rua. Demasiadas, diria eu. À noite, a dormir efectivamente, diria que é provável que tenha havido algum aumento”, disse, acrescentando que há também uma “atracção” por Lisboa de pessoas de outras zonas do país. “No primeiro dia, no Pavilhão do Casal Vistoso, falamos com uma pessoa em situação de sem-abrigo que tinha vindo de Braga porque ouviu dizer que havia aqui um pavilhão.”

Certo é que há muita gente a passar dificuldades alimentares, que não são necessariamente pessoas sem casa, notou Manuel Grilo. Devido ao aumento de pessoas à espera de comida nas ruas — que em parte se deve às dificuldades de associações que costumavam prestar esse apoio —, a câmara anunciou, no fim-de-semana, o reforço de 1000 refeições diárias, entre almoços e jantares. 

São confeccionadas pelas escolas e pela Santa Casa da Misericórdia, ao fim-de-semana, e distribuídas pelo Exército e pela Marinha em três locais: na Estação do Cais do Sodré, na Praça Paiva Couceiro, na Penha de França, e junto à discoteca Lux, em Santa Apolónia. Neste local, só na terça-feira, foram distribuídos 130 kits ao almoço e 155 ao jantar. 

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