Covid-19: aulas práticas no ensino superior podem ser concentradas no final do ano lectivo

Instituições estudam soluções para disciplinas que não podem ser feitas à distância. Formação de profissionais de saúde merece atenção particular.

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Paulo Pimenta

É cada vez mais forte a hipótese de as aulas presenciais no ensino superior continuarem suspensas no que resta do segundo semestre. Estudantes e professores perguntam agora o que fazer com os conteúdos que não podem ser trabalhados em regime de ensino à distância, como as aulas práticas de laboratório ou os estágios. Universidades e politécnicos estão ainda a estudar medidas, mas uma das soluções pode passar por concentrar as actividades práticas no final do lectivo.

Se a evolução da pandemia de covid-19 for a esperada, a situação deverá estabilizar-se em Maio, o que abriria uma possibilidade de um regresso às instituições de ensino no mês seguinte. “Se voltarmos às aulas em meados de Junho, é possível que até Julho possamos fazer a parte laboratorial dos planos de estudos”, antecipa o presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, CCISP, Pedro Dominguinhos.

As aulas de laboratório de cursos de Ciências ou Engenharia ou as disciplinas práticas de cursos de Desporto ou Artes, por exemplo, podem ser “concentradas” num par de semanas, defende aquele responsável. Solução idêntica é adiantada ao PÚBLICO pelo presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), Fontainhas Fernandes. O também reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro faz, no entanto, uma ressalva: as decisões não devem ser impostas pelo Governo ou pelas reitorias. Cada professor deverá ter autonomia para definir o que fazer com a disciplina que lecciona.

Até porque há casos em que as aulas que deviam ser presenciais têm sido transpostas com algum sucesso para o ambiente virtual. Na Universidade do Porto, por exemplo, há docentes de aulas laboratoriais a fazer tutoriais, passo a passo, para os seus alunos. Na licenciatura em Música da Universidade do Minho “foi possível encontrar alguns mecanismos de substituição” das classes de instrumento através de plataformas de videochamada, conta o reitor da instituição, Rui Vieira de Castro.

A Universidade do Minho, que foi a primeira instituição de ensino superior a assumir que não haverá aulas presenciais até ao final do segundo semestre deste ano académico, definiu um quadro “flexível” porque espera que em algumas disciplinas possa ainda haver actividades presenciais.

“Se a situação se estender, temos de garantir que os alunos não são prejudicados e que os conteúdos são dados na mesma, principalmente em cadeiras como as de pintura e escultura, inerentemente práticas, ou unidades curriculares cujo funcionamento depende de espaços e materiais só encontrados dentro da faculdade, como Práticas de Fotografia, Gravura ou Cerâmica”, explica a vice-presidente da Associação de Estudantes da Faculdade de Belas Artes do Porto, Julia Favero Leite. Os estudantes são favoráveis a um “prolongamento do semestre para o Verão” para poder dar resposta às necessidades das disciplinas presenciais.

A concentração das aulas práticas no Verão “é uma solução”, mas não é ainda a solução definitiva, reforça Pedro Dominguinhos. O CCISP continua a avaliar os impactos dos vários cenários e à procura de definições não só para as aulas que têm que ser mantidas presencialmente como para os estágios – que são uma parte importante dos cursos técnicos superiores profissionais, leccionados pelos politécnicos. “Há estágios que estão a ser feitos em teletrabalho. Para os outros casos, precisamos de ter elementos de avaliação equiparáveis, mas nem sempre será possível”, explica.

O CRUP criou, na semana passada, um grupo de trabalho que vai estudar as possíveis modalidades de avaliação que podem ser aplicadas no actual contexto de suspensão das actividades presenciais.

E os cursos de Saúde?

Entre os cursos com uma componente prática que não pode ser substituída por ensino à distância, a formação de profissionais de saúde está a merecer uma atenção particular das instituições de ensino superior. Estes estudantes foram os primeiros a deixar de ter aulas. Logo no início do mês, quando o total de doentes infectados com o novo coronavírus (SARS-CoV-2) ainda estava na casa das dezenas, o Conselho de Escolas Médicas Portuguesas (CEMP) recomendou a suspensão de aulas presenciais nas faculdades de Medicina, hospitais e centros de saúde. Cursos como Enfermagem ou os das Tecnologias da Saúde acabariam por seguir a mesma recomendação.

A situação é particular porque, o regresso às aulas práticas, feito em contexto hospitalar ou de centros de saúde, depende não só da evolução da pandemia, como “do grau de fadiga do Serviço Nacional de Saúde” depois de estabilizada a situação sanitária, adverte o presidente do CCISP, Pedro Dominguinhos.

“Infelizmente não podemos esquecer que no fim desta crise, muitos dos serviços clínicos estarão esgotados, pelo que o retorno da formação poderá não ser imediata”, concorda Mar Mateus da Costa, presidente da Associação Nacional de Estudantes de Medicina (ANEM), reconhecendo que as actuais circunstâncias impedirão provavelmente o retorno às unidades de saúde num período compatível com o final, “mesmo se alargado”, deste ano lectivo”.

Os alunos de Medicina defendem, por isso, que as faculdades devem agora garantir que a formação teórica é finalizada neste ano lectivo, em regime de ensino à distância. O Governo e as escolas médicas devem depois “garantir que eventuais falhas formativas são colmatadas no futuro”, através de programas especiais ou da reorganização da formação pós-graduada dos médicos, propõe a ANEM.

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