Comissão vai investigar decisão da Hungria que dá plenos poderes a Viktor Orbán

Ursula von der Leyen lembrou que as medidas excepcionais dos países em resposta ao novo coronavírus devem ser proporcionais, temporárias e limitar-se ao “estritamente necessário” para combater a pandemia.

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Presidente da Comissão Europeia vincou que os valores fundamentais têm de ser respeitados mesmo em tempos de emergência STEPHANIE LECOCQ/EPA

As medidas de emergência desenhadas pelos vários Estados-membros da União Europeia em resposta à crise do novo coronavírus devem ser “proporcionais” e limitar-se “ao que é estritamente necessário” para combater a pandemia, avisou a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que assinou nesta terça-feira um comunicado a lembrar que na Europa “os valores da liberdade, democracia, Estado de direito e respeito pelos direitos humanos” nunca se extinguem — nem mesmo em “tempos extraordinários” como o que se vive actualmente.

Sem nunca mencionar o caso da Hungria, onde a maioria parlamentar do partido Fidesz do primeiro-ministro Viktor Orbán aprovou uma lei que estende indefinidamente o regime de emergência e concede poderes plenipotenciários ao Governo, a líder do executivo comunitário diz que nenhuma medida nacional pode pôr em causa “os princípios fundamentais e os valores inscritos nos tratados”, nem prolongar-se por um prazo indeterminado sem ser objecto de “escrutínio regular”.

Por cruzar todas estas linhas vermelhas, o caso húngaro será objecto de avaliação na reunião semanal do colégio de comissários desta quarta-feira, confirmou o porta-voz da Comissão Europeia, sublinhando que, além de proceder à análise do pacote legislativo aprovado pelo Parlamento de Budapeste, os serviços da Comissão vão também “monitorizar todos os desenvolvimentos na aplicação do diploma pelo Governo”.

Bruxelas faz uma distinção clara entre as medidas extraordinárias que garantem que “os governos dispõem dos instrumentos necessários para agir de forma rápida e eficaz na protecção da saúde pública e dos cidadãos”, e acções que, a coberto da crise, põem em causa os mecanismos democráticos e os direitos humanos.

Com a aprovação do diploma, desenhado pelo Ministério da Justiça da Hungria, o primeiro-ministro Viktor Orbán ganhou autoridade para governar por decreto, invalidar a aplicação da lei, suspender a actividade parlamentar e congelar o calendário eleitoral do país.

A lei prevê ainda a criminalização da disseminação de boatos, fake news e quaisquer informações que sejam consideradas susceptíveis de provocar alarme e agitação social  — provisões que várias organizações não governamentais denunciaram como uma validação do regime de censura e perseguição à oposição política e aos media no país. Os indivíduos que venham a ser acusados incorrem numa pena de prisão que pode chegar a cinco anos.

“A democracia não pode funcionar sem uma imprensa livre e independente. O respeito pela liberdade de expressão e a certeza jurídica são essenciais nestes tempos de incerteza”, afirma Ursula von der Leyen. Para a presidente da Comissão Europeia, “agora é mais importante do que nunca que os jornalistas possam fazer o seu trabalho livremente, precisamente para contrariar a desinformação e assegurar que os cidadãos têm acesso a informação crucial”.

A Hungria está já a ser investigada pela Comissão Europeia, no âmbito de um processo de infracção aberto por iniciativa do Parlamento Europeu por alegado desrespeito do Artigo 7.º do Tratado de Lisboa, relativo às normas do Estado de direito. Em resposta às perguntas dos jornalistas sobre que próximos passos poderão ser dados pela Comissão, o porta-voz, Eric Mamer, assinalou a proposta assumida por Ursula von der Leyen no seu caderno de encargos político, para a criação de um mecanismo geral para a avaliação do respeito pelo Estado de direito, que poderia condicionar ou mesmo restringir o acesso dos países prevaricadores ao financiamento comunitário.

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