Apoio à Companhia de Teatro de Braga é mais um episódio na relação de mais de 30 anos entre a dst e as artes

O grupo empresarial de Braga subsidia a companhia local desde os anos 80 e decidiu, entre o vazio de eventos forçado pela Covid-19, pagar três meses de salário aos 14 trabalhadores. Pelo meio, já promoveu iniciativas de literatura, música e artes plásticas.

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PAULO PIMENTA

Além das vidas que já ceifou e das pessoas que continua a infectar, o novo coronavírus (SARS-CoV-2) asfixiou a economia da cultura, deixando, no caso português, pelo menos, vários artistas em situação financeira precária, limitados à transmissão de espectáculos por via digital. Os 14 trabalhadores da Companhia de Teatro de Braga (CTB) dispõem, porém, de mais algum oxigénio até Junho, graças ao apoio da dst. A empresa de Braga, que acumulou receitas de 340 milhões de euros em 2019, decidiu pagar os salários de Abril, Maio e Junho. Esta é mais uma página de uma história de mecenato cultural que começou na década de 80, precisamente com a atribuição de um subsídio quadrianual à CTB, hoje cifrado em 100.000 euros.

Confrontado com a suspensão de 23 espectáculos até 09 de Abril, entre os quais se incluía a estreia absoluta de uma versão de As Troianas, de Eurípedes, no Theatro Circo, em Braga, o director da companhia, Rui Madeira, lembrou a relação de 37 anos com a dst e mostrou-se grato pela atitude da empresa, ainda para mais num país onde as artes padecem, a seu ver, de um défice crónico de financiamento. “As artes é dos sectores onde os trabalhadores ganham menos e nunca são um problema prioritário para os políticos”, afirmou ao PÚBLICO.

Mas esse apoio extraordinário não se deveu somente à ligação antiga ao colectivo artístico, esclareceu ao PÚBLICO presidente da dst, José Teixeira. Foi também o resultado de uma “aposta estratégica” na actividade cultural, consolidada há décadas. “A cultura é tão nuclear, e as pessoas deixam isso para uma segunda ou terceira derivada. Mas consegue-se ter um país sem teatro, sem dança, sem artes plásticas? É impossível”, vincou o líder do grupo que se dedica à construção civil, mas também a sectores como o imobiliário, as energias renováveis e as telecomunicações.

Foi essa apologia das artes como elemento vital da sociedade que levou José Teixeira a alargar o seu raio de acção no meio artístico, com a criação, por exemplo, de prémios de literatura – os anúncios dos vencedores da 25.ª edição do Grande Prémio de Literatura dst e da segunda edição do Prémio de Literatura dstangola/Camões está agendado para Junho, mas podem ter de ser adiados face à pandemia em curso, reconheceu o empresário. Mecenas de eventos como a comemoração dos 20 anos dos Mão Morta, a Feira do Livro de Braga, a Bienal de Cerveira e os Encontros da Imagem, a dst instituiu também prémios de arte pública e de fotografia (Emergentes dst). Em 2014, abriu, a zet gallery, um espaço onde se pode apreciar e comprar arte contemporânea, também vítima do coronavírus. “Está cá o Francisco Vidal, um autor luso-angolano. Com muita pena nossa, só podemos promover nas redes sociais e de forma online. Tem aqui 100 obras. E a minha convicção é a de que ele as vai vender todas”, antecipou José Teixeira.

“Quando se olha para trás, o que fica são as grandes coisas da cultura: a grande poesia, a grande arte plástica, a grande escultura, a grande arquitectura. O resto é efémero. A economia tem de perceber que um país cosmopolita e culto é competitivo”, sublinha José Teixeira.

Sem prometer apoios a outros agentes enquanto a pandemia durar, o engenheiro de formação realçou que há sempre “estratégias criativas” de se estimular o gosto pelas artes; uma das estratégias que utiliza é a de entregar convites para a zet gallery ou para espectáculos de teatro aos fornecedores de materiais para a dst, disse. Outra é a de promover a leitura e as idas a espectáculos entre as cerca de 1.800 pessoas que trabalham para si; a actividade cultural dos trabalhadores influencia a própria carreira no seio da dst. “Faz parte da função e da subida da carreira os trabalhadores procurarem ser cada vez mais cultos. Há uma espécie de censura social colectiva para quem não lê aqui”, contou.

José Teixeira defendeu, porém, que este tempo deve também ser regido pela compaixão, seja com a CTB, seja com os seus funcionários (364 dos quais actualmente em teletrabalho), e rejeitou qualquer despedimento ou redução de salário no âmbito do surto de Covid-19. O empresário criticou ainda aqueles empresários que estão a “correr atrás dos apoios do Governo”, quando têm folga financeira para fazerem alguns sacrifícios e “ficarem ao lado do país”.

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