O estado de emergência suspende o direito à greve!

O que ressalta deste decreto é o seu carácter antidemocrático. Um vazio de garantias para acautelar e proteger a vida humana, onde está proibido o direito à greve e à resistência, e permitido o despedimento colectivo.

A Assembleia da República aprovou, no dia 18 de Março, a declaração do estado de emergência no país, proposta pelo Presidente da República, depois de ter consultado o Conselho de Estado e o Governo.

O Presidente da República tinha anunciado, com três dias de antecedência, a necessidade de decretar o estado de emergência, a fim de, como afirmou, poderem ser tomadas as medidas urgentes exigidas pela situação que o país vive.

Mas, quando a população está mergulhada numa ameaça, pela invasão de um vírus que vem fazendo milhares de mortes em todo o mundo, o que é que ressalta deste decreto?

Quando os profissionais do Serviço Nacional de Saúde estão na frente de batalha, assumindo com coragem e denodo o combate para fazer face a esta epidemia, com escassez de meios e equipamentos que protejam os doentes e a si próprios, o que é que ressalta deste decreto?

Não são, seguramente, as medidas que a celeridade justificaria, em qualquer situação de calamidade, para requisitar e mobilizar, com carácter de urgência, os laboratórios, bem como os hospitais e restantes serviços, do sector privado, para reforçar e proteger quem está na linha da frente do combate para derrotar o coronavírus.

Não são, também, as medidas que se justificariam – nesta situação de catástrofe – de requisição às grandes empresas de transporte, para assegurar o fornecimento dos alimentos e bens essenciais à sobrevivência das famílias, em condições de segurança e impedindo a actividade especulativa.

Unidade para salvar o país da catástrofe

Ao contrário, o que ressalta deste decreto é o seu carácter antidemocrático. Um vazio de garantias para acautelar e proteger a vida humana, onde está proibido o direito à greve e à resistência, e permitido o despedimento colectivo.

Num país onde estes direitos foram conseguidos, à custa de grandes lutas e sacrifícios, como aceitar que os deputados da Assembleia da República – representando forças políticas que se reclamam da classe trabalhadora – tenham aprovado ou deixado passar a declaração deste estado de emergência?

O empenho com que os líderes de partido e da bancada parlamentar do PSD e do CDS defenderam e apelaram à unidade nacional, em torno deste decreto, mostra bem que as forças da direita contam com ele, como instrumento repressivo, para fazer frente à crise social que se perfila.

Não, não há nenhuma razão para decretar este estado de emergência, quando os trabalhadores e as populações estão a mostrar o que são capazes de fazer, em todas as frentes.

Unidade para restabelecer e reforçar as conquistas democráticas e sociais de Abril

Mostram-no os trabalhadores da Saúde, mostram-no todos os trabalhadores dos outros sectores – desde o assegurar da cadeia alimentar ao serviço de transportes ou de higiene. Mostram-no aqueles que se dão os meios de reorganizar as empresas onde trabalham para as adaptar à produção de equipamentos que o pessoal da Saúde reclama.

Mostram-no as populações que – nos bairros populares ou nas aldeias – se auto-organizam para não deixar ninguém para trás. Mostraram também, desde cedo, o seu sentido de responsabilidade os operários da Autoeuropa exigindo condições de segurança, o que levou à suspensão da laboração da empresa, ou os estivadores do Porto de Lisboa que jamais deixaram de proceder à carga e descarga dos navios, cumprindo os serviços mínimos, apesar de lhes ter sido imposto um despedimento colectivo.

Como militantes organizados em torno do Militante Socialista, jornal impulsionado pelo POUS, partilhando as mesmas preocupações e anseios do conjunto da população, juntamos a nossa voz à de todos quantos exigem a tomada de medidas que a protejam, desde já, a proibição dos despedimentos, o restabelecimento do direito à greve e do direito de resistência.

Membros da Comissão de Redacção de O Militante Socialista. Deputados na Assembleia Constituinte (em 1975-76)

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