Meio litro de gel desinfectante chega aos 24,95 euros e há máscaras a 10 euros

Falta produto no mercado e procura faz disparar preços. Farmácias defendem-se e alegam que também estão a comprar mais caro 30%. ASAE lançou operação de fiscalização.

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Paulo pimenta

A Direcção-geral da Saúde recomenda o uso de gel desinfectante ou álcool e de máscaras, como forma de protecção e prevenção contra o coronavírus. Mas estes bens, neste momento, são produtos que escasseiam no mercado: ou não há ou estão a ser vendidos a preços exorbitantes.

Em farmácias e em outros estabelecimentos comerciais, o PÚBLICO encontrou, em Lisboa, frascos de gel desinfectante, por exemplo de meio litro, cujos preços variavam entre os 14,95 euros e os 24,95 euros. Para ter uma ideia, uma borrifadela contem cerca de 9 mililitros de gel desinfectante. Um frasco de 500 mililitros dá para 55 borrifadelas. Cada borrifadela custa-lhe 45 cêntimos.

Encontrámos o preço mais alto numa loja de telemóveis, no Centro Comercial de Alvalade, em Lisboa. Tinha apenas dez frascos, os que estavam expostos no balcão, e com o preço bem visível: 24,95 euros. Questionámos a funcionária sobre o preço. Disse que não sabia a quanto tinha sido comprado e que a loja apenas começou a vender aquele produto, de marca espanhola, há pouco tempo, devido à procura por causa do novo coronavírus.

Quase em frente a esta loja, está a farmácia Alvalade Saúde. Sílvia Beirão, directora técnica substituta, explicou que está a ser difícil conseguir ter máscaras, luvas e gel desinfectante para vender ao público e o que lhes chega também “vem mais caro por parte dos distribuidores”.

“Estão a vender 30% mais caro porque também falta de matéria-prima, que é o álcool”, disse, sublinhando que actualmente, vende um frasco de gel desinfectante de meio litro a 14,95 euros e um de 150 mililitros a quatro euros. Sobre os preços da loja em frente disse: “Sim é realmente caro”.

Na farmácia Alvalade um frasco de 700 mililitro­­­­s custa 18 euros. A técnica de farmácia que nos atendeu disse que os preços estão três vezes mais caros. “Não digam que a culpa é das farmácias porque já vem caro dos fornecedores”, explicou.

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Rui Gaudêncio

Na farmácia Fátima, na Avenida 5 de Outubro, em Lisboa, há máscaras, “mas são de papel”, diz o funcionário que nos atende através de uma pequena janela na porta. Quanto ao preço. “São dez euros”, diz. E gel desinfectante tem? Exibiu uma bisnaga de 30 gramas. Preço? “Dez euros.” Francisco Silva, 74 anos, comprou uma máscara. “É caro, mas não encontrei em mais lado nenhum.”

Berto Cabral tem uma farmácia nos Açores, na ilha Terceira, e devido à falta de gel desinfectante nos distribuidores decidiu fabricá-lo ele próprio. Ao fabricar o gel e para ter uma margem de lucro de cerca de 30%, vendeu cada frasco de 100 mililitros a pouco mais de nove euros. “Mesmo que conseguisse encomendar num distribuidor, com IVA e para aplicar a margem da farmácia, teria de vender ao público a cerca de 14 euros cada 100 mililitros”, disse, acrescentando que agora nem está a fazer mais gel porque não há álcool.

É na farmácia que o cliente se queixa dos preços

“A nós chega-nos caro e é nas farmácias que o cliente desabafa e se queixa do preço”, afirmou, sustentando que não sabe “se o problema está em quem produz ou em quem distribui”, mas que, de facto, “os preços disparam”.

Com as proporções que a pandemia do vírus tomou, Berto Cabral, decidiu colocar “ao serviço da comunidade” o dinheiro que recebeu com o gel desinfectante que produziu e vendeu na sua farmácia. “Era um dinheiro extra e do qual o negócio da farmácia não esta dependente e, em vez, de investir em equipamento aqui, decidi oferecer um ventilador ao Hospital Santo Espírito da ilha Terceira”, contou ainda.

Segundo Nuno Flora, secretário-geral da ANF, “havendo uma pressão sobre a procura e escassez mundial, o preço de venda ao público está condicionado pelo custo a que [os produtos] são fornecidos às farmácias”. Nuno Flora sublinha ainda que “para poderem dispensar ao público esses produtos, muitas farmácias são forçadas a praticar preços superiores ao habitual, mesmo reduzindo ou abdicando das margens de comercialização necessárias à sua sustentabilidade”.

Sobre esta escalada de preços contactámos a Associação de Grossistas de Produtos Químicos e Farmacêuticos (Groquifar) mas não obtivemos qualquer comentário. O Infarmed e o Ministério da Saúde remeteram para a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE).

Para perceber se os preços que têm sido praticados relativamente a produtos como o gel desinfectante, máscaras e luvas são os permitidos por lei, ou se, pelo contrário, configuram o crime de especulação, a ASAE lançou, nesta quinta-feira, uma operação de fiscalização de farmácias.

O inspector-geral da ASAE, Pedro Portugal Gaspar, explicou que foram visitados por seis brigadas de inspectores cerca de uma vintena de estabelecimentos comerciais, na sua maioria farmácias das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, tendo também havido algumas acções inspectivas no Algarve.

Ainda sem adiantar resultados da operação, que só serão conhecidos nesta sexta-feira, o mesmo responsável adiantou que ela não visou por enquanto armazenistas — o que não significa que alguns não venham mais tarde a ser também inspeccionados.

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