Empresa italiana vendeu meio milhão de kits para testes do coronavírus aos EUA

Os kits seriam suficientes para suprir todas as necessidades no Norte de Itália. Estado italiano não soube da venda feita durante a pandemia e a empresa argumenta que foi tudo feito às claras.

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Testes de despistagem do coronavírus realizados em Seattle, nos EUA Reuters/BRIAN SNYDER

Uma empresa privada italiana vendeu meio milhão de kits para testes para o covid-19 aos Estados Unidos quando a Itália precisa de meios para identificar infecções, diz o La Repubblica. A encomenda já chegou aos Estados Unidos, num avião militar, e responsáveis americanos celebraram a venda dizendo que é “mais um grande exemplo de como as nações trabalham em conjunto”. Mas o Estado italiano não foi informado da venda, enquanto a empresa de Brescia argumenta que foi tudo feito de forma transparente. 

A encomenda foi transportada na segunda-feira num avião C-17 Globemaster da Força Aérea dos Estados Unidos e a chegada foi anunciada no Instagram, embora tenha sido depois apagada, diz o La Repubblica. Mas o transporte foi mais tarde confirmado por um porta-voz do Pentágono, Jonathan Hoffman, dizendo que o material adquirido foram os cotonetes e o líquido necessário para colocar as amostras de material biológico dos pacientes. 

A empresa que produziu este material chama-se Copan Diagnostics, tem sede na cidade de Brescia, na Lombardia, no Norte de Itália, um dos centros mais afectados pela covid-19, e tinha-os em armazém, garante o jornal italiano, quando a Itália se debate com falta de testes para rastrear as infecções, e a União Europeia tomou medidas para garantir que os Estados-membros tenham acesso aos materiais e equipamentos médicos necessários para combater a pandemia. Os testes vendidos seriam suficientes para suprir todas as necessidades no Norte de Itália, sublinha o La Repubblica

A empresa sublinha que de Fevereiro até agora produziu um milhão destes cotonetes, satisfazendo a procura no território, italiano, disse o director financeiro da Copan, Claudio Morzenti, ao Giornale di Brescia. 

O artigo 6 do decreto Salva Italia estabelece a possibilidade de as autoridades requisitarem bens móveis de qulquer tipo, pertencentes a sujeitos privados ou públicos, para enfrentar a emergência sanitária”, salienta o La Repubblica, numa resposta editorial à polémica causada pela publicação deste artigo. 

Mas o Estado italiano não foi informado da venda dos testes, como os responsáveis da empresa privada admitiram ao La Repubblica. “Tudo aconteceu às claras. Não temos que informar as autoridades italianas, são produtos para venda livre. E estamos a liderar uma empresa que exporta para o mundo inteiro. Não há falta de cotonetes: nas últimas semanas vendemos em Itália mais de um milhão deles e conseguimos satisfazer todos os pedidos”, argumentaram. “O stock não foi comprado pelo Governo americano, mas por empresas privadas e distribuidores americanos. Transportaram-no num avião militar por não haver aviões comerciais disponíveis”. 

O problema, aqui, é uma questão de controlo, salienta o jornal. “Se as autoridades não foram informadas da exportação destes artigos, como poderiam avaliar da necessidade de bloquearem ou não a exportação?”

A Lombardia é a região italiana mais afectada pela pandemia que já infectou 41.035 pessoas em todo o país, das quais 4440 já estão curadas, e matou 3405 pessoas, mais do que na China. E os serviços de saúde públicos estão sobrecarregados, principalmente os cuidados intensivos. 

Já os Estados Unidos identificaram o primeiro caso de covid-19 a 21 de Janeiro e, dois meses depois, têm 14.250 (e 205 mortes), sem que haja testes suficientes para todos os casos suspeitos de infecção. A Administração Trump tem sido duramente criticada pela gestão da crise, que inclui a falta de material de laboratório e protecção do pessoal médico. Houve até testes com defeitos de fabrico a serem distribuídos a estados e departamentos de saúde locais pelo Centro de Controlo e Prevenção de Doenças americano (CDC), diz o Washington Post

Uma das faltas nos EUA é precisamente estes cotonetes, usados para recolher amostras do exsudado nasofaríngeo das pessoas testadas, diz o New York Times.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) sugere a todos os países que testem o máximo de pessoas possíveis, por ser a única forma de se conhecer a dimensão real da pandemia em cada país e assim se poderem destacar os meios de saúde necessários para a combater e isolar os infectados. “Não se consegue combater um incêndio de olhos fechados”, disse o director-geral da Organização Mundial de Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, citado pelo New York Times. “E não conseguiremos travar esta pandemia se não soubermos quem está infectado”. 

Daí os Estados Unidos estarem a procurar, mesmo no estrangeiro, quem lhes venda os tão necessários testes. “Estamos muito satisfeitos por a empresa italiana Copan Diagnostics continuar a produzir testes para covid-19 em quantidades suficientes para satisfazer os pedidos em Itália e vendas no estrangeiro. “Os Estados Unidos vão continuar a comprar estes kits a empresas italianas de acordo com as suas necessidades. Os Estados Unidos e a Itália continuam a trabalhar em conjunto em estreita colaboração”, disse ao La Repubblica o embaixador americano em Itália, Lewis Eisenberg.

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