Destruição da placa da Casa Ventura Terra alvo de queixa na Justiça

Reitoria da Universidade de Lisboa justificou que placa estava a ser retirada para serem feitas réplicas e que, durante o processo, aconteceu “um acidente” e a pedra se partiu.

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A Associação Ventura Terra apresentou, na quinta-feira uma queixa junto do Departamento de Investigação e Açcão Penal (DIAP) de Lisboa contra os reitores das universidades de Lisboa e do Porto, devido à remoção da placa evocativa da Casa Ventura Terra — doada pelo arquitecto a estas duas instituições de ensino —, na qual estava inscrita a vontade de Miguel Ventura Terra de que os rendimentos que fossem gerados pelo prédio fossem destinados aos alunos carenciados que quisessem estudar as belas-artes.

Na tarde do passado dia 10 de Março, esta placa foi retirada da fachada do n.º 57 da Rua Alexandre Herculano. Quando o PÚBLICO lá chegou, por volta das 18h, a pedra estava já partida no chão. No dia seguinte, em declarações ao PÚBLICO, o reitor da Universidade de Lisboa (UL) justificou que a remoção da placa tinha como objectivo servir de molde a réplicas, mas que durante o processo acabou por acontecer um “acidente”, reduzindo-a a cacos.

“Nós levámos uma grua para tirar a placa. Quando a placa estava quase no chão, deixaram-na cair. Alguma coisa correu mal”, justificou então António Cruz Serra. Segundo disse, “a placa consegue-se reconstituir” e voltará a figurar na fachada do edifício. “A original vai ser recuperada, talvez pelos nossos alunos de belas-artes”, adiantou. Já as duas réplicas que a UL quer fazer serão colocadas na Universidade do Porto e na futura residência de estudantes Miguel Ventura Terra, no pólo da Ajuda. 

“Este acto danificou o próprio edifício classificado”, lê-se na síntese da denúncia remetida ao DIAP de Lisboa, a que o PÚBLICO teve acesso. Este edifício, acabado de construir em 1903, é um imóvel com várias classificações: recebeu nesse ano o Prémio Valmor, em 1983, foi classificado como Imóvel de Interesse Municipal, tendo sido, em 2006, reclassificado como Imóvel de Interesse Público.

Segundo alega a associação Ventura Terra, a “retirada e destruição da placa evocativa” constitui “a prática do crime de Dano Qualificado no património classificado, uma vez que, como visto, a placa evocativa é elemento integrante desse mesmo património”. Lembram ainda que “responsáveis máximos pelos mais prestigiados estabelecimentos de ensino universitário, incluindo o de arquitectura, em Portugal, retiraram esta memória e exemplo, materializada na placa que era parte integrante do prédio dos autos, e desfizeram-na em cacos! É um ato aviltante e muito grave”.

Perante a destruição da placa, o Fórum Cidadania Lx solicitou, na semana passada, ao novo director-geral do Património Cultural, Bernardo Alabaça, que inicie um processo de “contra-ordenação aos responsáveis por esta acção de destruição de património classificado”.

A Casa Ventura Terra tem estado envolvida num litígio, que envolve a sua venda em hasta pública no passado dia 15 de Janeiro. Segundo afirma uma descendente de Miguel Ventura Terra (1866-1919), o testamento do arquitecto deixa claro que era seu desejo que o prédio nunca fosse vendido. Mas a UL (representante dos proprietários) avançou mesmo com a venda, indo contra essa vontade. A universidade estimava então que o valor de mercado do prédio de quatro pisos, com uma área bruta de construção de 2089 metros quadrados, deveria rondar os 3,7 milhões de euros.

No dia anterior à realização da hasta pública, a Associação Ventura Terra apresentou, junto do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, um procedimento cautelar para a suspender a sua realização. A acção pedia ainda que, caso a hasta se realizasse, deveria ser decretada a “a suspensão dos seus efeitos até à outorga definitiva da escritura pública e até à decisão na acção principal onde se decidirá sobre a existência do direito das entidades adjudicantes para procederem à alienação do imóvel que o testador legou sob a condição de ‘que muito desejo que não seja vendido'”. O processo deverá estar, então suspenso neste momento.

Questionado sobre que empresa ganhou a hasta pública, Cruz Serra disse não se recordar do nome. A assessoria da reitoria também não respondeu ao pedido de esclarecimento do PÚBLICO. 

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