A dependência mundial da China

Devido à covid-19, as dinâmicas e geografias económicas mundiais vão mudar e Portugal deverá estar atento. Temos também que pensar no que se vai passar a seguir a esta pandemia. Pensar além da covid-19 é ter um pensamento estratégico e é isso que nos tem faltado: estratégias.

A economia chinesa tem crescido a um ritmo alucinante. Entre 1999 e 2019, o PIB aumentou mais de onze vezes, sendo que em diversos anos esse crescimento foi de dois dígitos e nunca inferior a 6%. Em 2000, 2010, 2012 e 2015 o PIB per capita aumentou mais de 20%, em cada um dos anos. Estes elevados crescimentos estão substancialmente baseados não só na produção de bens finais, mas também na produção de bens intermédios.

Atualmente, a China é o maior exportador mundial de bens intermédios com cerca de 35% da quota mundial. Países como a Índia, Indonésia, Bangladesh, Tailândia, Camboja ou Paquistão dependem fortemente desses bens intermédios para os incorporarem nas suas exportações de bens finais. Na Europa destacam-se Espanha, Itália, Alemanha e Holanda. Só para estes quatro países, em 2018 a China exportou mais de 28.000 milhões de USD de bens intermédios, enquanto que para os Estados Unidos esse valor foi superior a 37.000 milhões de USD.

Como se sabe, devido à covid-19, a produção na China abrandou significativamente tanto nos bens finais como nos bens intermédios. Como consequência, além da falta de bens finais, fábricas em todo o mundo paralisaram, pois não foram abastecidas pelos bens intermédios chineses.

No curto prazo, as multinacionais fabricantes de bens finais não encontraram possibilidades de substituir a China por outro destino produtivo. Mas, felizmente, muitas dessas multinacionais já estão a estudar alternativas para reduzir a sua dependência face à China, estando atualmente a procurar novos locais de produção. Alguns dos prováveis destinos desses investimentos serão os países da Europa de Leste, com a Polónia, a Hungria e a Roménia à frente da corrida.

Estas multinacionais nem sempre procuram salários baixos. Querem assegurar que o país que acolhe o investimento reúne uma série de fatores: instituições fortes, estabilidade cambial, respeito pelos direitos de propriedade, peso do Estado na economia, legislação laboral flexível, mão-de-obra qualificada ou mesmo impostos corporativos.

Apesar de Portugal não se encontrar bem posicionado nalguns desses critérios, devemos procurar captar para o nosso país algum desse investimento, beneficiando do efeito de proximidade aos destinos finais. Evidentemente que não deveremos procurar abastecer as fábricas do Sudoeste Asiático, mas para a Europa e para os Estados Unidos temos claras possibilidades.

Devido à covid-19, as dinâmicas e geografias económicas mundiais vão mudar e Portugal deverá estar atento. Temos também que pensar no que se vai passar a seguir a esta pandemia. Pensar além da covid-19 é ter um pensamento estratégico e é isso que nos tem faltado: estratégias.

Tal como as guerras mundiais, a peste negra ou a gripe espanhola terminaram com mais ou menos vítimas ou efeitos, esta pandemia também irá terminar. O mundo seguirá em frente e esperemos que melhor preparado.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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