A Advocacia é uma profissão de risco?

O Advogado não invoca motivos de saúde para não ir, não se recusa a ir porque não pode, nem deixa de ir: o Advogado vive da relação de confiança com o cliente e tem prazos a cumprir.

Estamos no meio de uma epidemia assente num vírus que ninguém sabe o que é, nem, para pior, para onde caminha, e os Advogados não sabem nada sobre a sua vida profissional. Não sabem, sequer, se terão vida profissional após o tempo que se vive.

Melhor, os Advogados sabem que tudo continua na mesma: os prazos de caducidade e de prescrição das acções não se suspendem (nem foram suspensos), os prazos processuais continuam a correr, os clientes querem soluções e não adiamentos e os presos, todos, como é claro, a precisarem de conferenciar com os seus mandatários, mantêm-se em condições sub-humanas, que se estendem aos parlatórios – estabelecimentos prisionais há, em Portugal, no século XXI, em que as reuniões de trabalho não se realizam em locais específicos e individualizados, chegando as reuniões a ocorrer no mesmo espaço e durante as visitas de familiares.

Na verdade, hoje, amanhã, depois, todos vamos para os nossos escritórios, conservatórias, notários, repartições públicas e tribunais. Vamos para todos aqueles sítios que não encerraram, porque o Advogado vai para onde o Cliente precisa que vá. O Advogado não invoca motivos de saúde para não ir, não se recusa a ir porque não pode, nem deixa de ir: o Advogado vive da relação de confiança com o cliente e tem prazos a cumprir.

Entretanto, fala-se de baixa remunerada para todas as profissões e o Advogado, sem género neste texto, porque isso aqui não conta, que tiver o azar de apanhar o coronavírus, que fique de quarentena ou que tenha a infelicidade de ser Mãe, Pai, ou Mãe e Pai, e venha a tomar conta dos filhos quando as escolas fecharem, não sabe como vai sobreviver, não sabe como adiar audiências, ou se vão ser adiadas, nem, tão pouco, sabe se vai continuar a ter clientes no fim disto tudo. Apesar de ser o “grande servidor público”, quase de “borla”, no âmbito do acesso ao Direito.

Não critico os representantes dos Advogados, o Governo, a Assembleia da República ou a Presidência. Não, nem tenho esse objectivo. Critico, sim, a sociedade que permitiu que aqueles que representam todo e cada um de nós, de vós, sempre que necessário, com ou sem posses, no mandato forense típico ou no apoio judiciário, fiquem sem qualquer apoio, protecção ou preocupação que pense a sua situação profissional.

Ouve-se, por aí, que o caminho faz-se caminhando. É certo que as verdades mais simples podem ser as mais reais. Não é, no entanto, o que se passa na Advocacia: o caminho não se faz porque estamos parados. Mas, no fundo, não há problema: os Advogados estão cá para salvar os outros, não para se salvarem a si próprios.

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