Os primeiros de muitos

Estas jogadoras não querem apenas aplausos, palmadinhas nas costas ou o consolo de estarem “a fazer história.” Querem salários justos e uma modalidade profissionalizada.

“Fazer história.” É uma marca indelével que as jogadoras da selecção portuguesa feminina de futebol deixam nas páginas da história deste desporto em Portugal. São as primeiras na fase final de um Mundial. A cada toque de bola, a cada jogada, a cada golo – os primeiros surgiram esta quinta-feira, em Hamilton, na Nova Zelândia, da arte de Telma Encarnação e Kika Nazareth - estão a tirar da sombra o futebol jogado por mulheres. E talvez por isso lhes faltem tantas vezes as palavras para descrever o que ali estão a sentir, como aconteceu com Telma Encarnação no final do jogo contra o Vietname. “Não tenho palavras para descrever este momento. Estou mesmo feliz.”

Era a felicidade estampada no rosto de quem já faz parte da história do futebol português. As "navegadoras" carregam um peso de gerações de jogadoras que foram abrindo o caminho pelo puro amor ao desporto e à competição, mas cuja jornada ia muito além de futebol. Era uma busca por reconhecimento, por oportunidades iguais.

As "navegadoras" estão a escrever uma narrativa de superação e de conquista, provando que a paixão pelo futebol não conhece fronteiras de género. Estão a sair da invisibilidade. Estão a mostrar às meninas que jogam no alcatrão dos recreios das escolas no meio dos rapazes que é possível um dia jogarem num relvado perante milhares de pessoas.

Mas estas jogadoras não querem apenas aplausos, palmadinhas nas costas ou o consolo de estarem “a fazer história.”

Querem salários justos, uma modalidade profissionalizada. Em Portugal, os ordenados das jogadoras variam os 665 euros e os 8000 mil euros. Há uma proposta do Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol para que o ordenado mínimo para as jogadoras passe para os 2280 euros, quando o principal campeonato ainda tem equipas sem qualquer jogadora profissional.

Querem ser mães sem ter de abdicar de uma carreira, querem trabalhar em tranquilidade longe do assédio sexual e moral. Por isso, muito além dos golos de Telma e de Kika ficarem marcados na história do futebol nacional como os primeiros marcados por jogadoras portuguesas num Mundial de futebol, são estas conquistas a maior herança que deixarão às gerações futuras. Que a bola continue a rolar.

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