Câmara do Porto propõe criação de conselho de vereadores da habitação

Autarquia abandonou grupo de trabalho da habitação na AMP e sugeriu a criação de um conselho de vereadores. “Temos de atenuar pressão sobre alguns municípios mais centrais e repartir responsabilidades”.

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No Porto, 13% da habitação é social. Manuel Roberto

A Câmara do Porto não tem competência nem capacidade para dar casa a todas as pessoas com carência habitacional na cidade e quer uma resposta mais global e articulada. A pensar nisso, a autarquia decidiu, na semana passada, abandonar o grupo de trabalho dedicado à habitação na Área Metropolitana (AMP) e propôs, este domingo, criar um conselho de vereadores da habitação. Dessa forma, explicou o vereador Fernando Paulo, ficaria garantida a reflexão e debate “ao mais alto nível”, já que no grupo de trabalho actual nem todos os representantes são vereadores. Com diagnósticos e estratégias alinhadas, o conselho desenhará propostas para, posteriormente, serem apresentadas ao Governo pelos presidentes das diferentes autarquias. 

A afinação de políticas entre os 17 municípios da AMP é um pedido antigo do vereador com o pelouro da habitação e do próprio presidente da autarquia. Porquê? Porque o Porto, pela sua dimensão e pelas respostas que tem no terreno, acaba por ser prejudicado pelas dificuldades dos “vizinhos”, tem repetido. “Se o problema da habitação fosse exclusivamente do Porto, bem estávamos nós. Atinge os vários municípios, muito litoral e toda a AMP”, afirmou, à margem da reunião de câmara desta segunda-feira. “Temos de atenuar a pressão sobre alguns municípios mais centrais e mais atractivos e repartir a responsabilidade.”

O objectivo é conseguir que a AMP tenha “a voz suficiente” junto do Governo para exigir, por exemplo, que este “altere alguns dos instrumentos financeiros” disponíveis, como “o apoio à construção de habitação”. No Porto há, actualmente, 13% de habitação pública, face a apenas 2% de média nacional. E Fernando Paulo tem uma proposta para tornar possível a meta do Governo, que quer subir essa média para 5% até 2024: “Aquilo que equacionamos é que o Governo crie um estímulo para os municípios que estão abaixo dos 5%, com financiamentos diferenciados.”

Para Fernando Paulo, enquanto a resposta não for mais global e afinada com outras medidas sociais – como aumento do valor dos abonos de família, por exemplo -, o país continuará a viver numa crise habitacional. E, no caso do Porto, nem a alteração da matriz do regulamento da habitação social, prevista para Abril, irá provocar mudança. “Enquanto não houver mais habitação é tapar de um lado e destapar do outro”, admitiu, sublinhando a entrega de cerca de 300 casas ao longo do ano de 2019.

A habitação tinha sido tema quente durante a reunião, depois de a vereadora da CDU, Ilda Figueiredo, pedir a palavra para “lamentar a forma como as pessoas têm sido tratadas” e também a ausência de respostas às questões que vai levantando em matéria de habitação. Enquanto recusa fornecer algumas informações, alegando a protecção de dados, a câmara usa o seu portal para divulgar esses mesmos dados, criticou, referindo-se ao caso de Joana Pacheco, moradora da Ribeira que ficou sem casa há pouco mais uma semana e motivou uma manifestação junto ao edifício da câmara. “A Joana Pacheco permitiu que a Câmara do Porto divulgasse os seus dados ou há aqui uma ilegalidade clara?”

Falando de “casos tremendos de clara insensibilidade e de atropelo ao regulamento”, Ilda Figueiredo defendeu que os munícipes do Porto não têm, neste momento, forma de se defender. Fernando Paulo exaltou-se, anunciou um voto de protesto, e viu Rui Moreira chegar-se à frente. “Os termos que usou são absolutamente impróprios”, começou. “O seu gabinete não é um tribunal e a senhora não se pode colocar numa posição inquisidora relativamente à forma como funcionam os serviços. A CDU ainda não é tribunal. Quis ser, mas não foi. Em 1975 durante uns meses foi, deixou de ser. É por isso que gosto muito do 25 de Novembro.”

Lamentando as acusações do deputado municipal da CDU Rui Sá - que esta segunda-feira publicou uma crónica no Jornal de Notícias intitulada “Criminosos até prova em contrário” – deixou uma provocação: “Peçam ao IHRU para vos dar as 1000 casas que tem [no Porto] e a CDU dá as casas de acordo com os seus critérios.”

Fernando Paulo foi mais longe. “Devolvo a acusação de assaltantes e criminosos à senhora vereadora e ao deputado Rui Sá. Processem-me civil e criminalmente: são criminosos, manipuladores de informação e mau carácter.” Acusando a CDU e o BE de “manipular” os cidadãos para fazer política e a comunicação social de ser instrumentalizada, Fernando Paulo quis deixar claro que “não recebe lições de ninguém”. E também que executou menos despejos do que o ex-vereador Manuel Pizarro.

O socialista manteve o tom calmo para recentrar o debate. No caso de Joana Pacheco, afirmou, a autarquia podia ter evitado que a portuense, mãe solteira com dois filhos menores, ficasse sem casa se, em tempo devido, tivesse aceitado o pedido de integração de Joana Pacheco no agregado familiar do pai. Foi essa a sugestão feita pelo então provedor do inquilino, padre José Lopes Baptista. O cargo foi entretanto extinto e absorvido pelo provedor do munícipe, Marques dos Santos – e é o ex-reitor da Universidade do Porto que Manuel Pizarro gostava de ouvir no hemiciclo. A proposta não teve resposta da Câmara do Porto.

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