Artista plástico brasileiro Nelson Leirner morre aos 88 anos

Figura histórica da vanguarda artística brasileira dos anos 60, e fundador do grupo Rex, o artista morreu este domingo no Rio de Janeiro.

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Filho de um casal de emigrantes polacos que se tornaram figuras de primeiro plano dos meios artísticos brasileiros – o industrial e coleccionador de arte Isai Leirner, director do Museu de Arte Moderna de São Paulo e fundador da Galeria de Arte da Folha de S. Paulo e a escultora Felicia Leirner –, Nelson Leirner (1932-2020) morreu este domingo na sua casa do Rio de Janeiro, aos 88 anos, na sequência de um ataque cardíaco.

Educado numa família de artistas e apreciadores de arte – a sua irmã mais velha, Giselda, é desenhadora e ficcionista, e a sua sobrinha Sheila Leirner é uma destacada curadora e crítica de arte –, Nelson Leirner não se deixou logo seduzir pela vocação familiar e começou por cursar Engenharia Têxtil nos Estados Unidos, onde viveu de 1947 a 1952. Mas regressou ao Brasil sem ter concluído o curso e, na segunda metade dos anos 50, estudou pintura com o artista espanhol Joan Ponç, tendo-se estreado em 1960 com uma exposição individual na Galeria de Arte da Folha de S. Paulo, que o seu pai criara e que abrira as portas em 1957 com uma mostra colectiva que incluía trabalhos da sua mãe, a par de obras de artistas como Darcy Penteado ou o autodidacta José Antônio da Silva.

Em 1961, apresenta uma segunda exposição de desenhos na prestigiada galeria paulista S. Luiz, circunstância a que aludirá décadas mais tarde, num texto publicado em 1994: “Notei (…) que com seis meses de pintura fui premiado num salão. Com um ano de trabalho exponho na melhor galeria de São Paulo, a São Luiz, que apresentou meus desenhos sem vê-los antes. Mais seis meses e entro na Bienal [de S. Paulo]; e Stanislawsky, crítico polonês de fama internacional, acrescenta ao meu trabalho uma longa crítica. Aos poucos, a gente vai percebendo a razão de tudo. A qualidade de meu trabalho não possuía a importância que lhe foi dada. Era uma pura questão de prestígio social.” E conclui: “Compreendi que se pode construir um cara qualquer; até sem ver seu trabalho. Era natural que começasse a soltar tudo o que estava dentro de mim, logicamente num sentido de contestação. Esse foi meu começo”.

Ao longo de uma extensa carreira, que inclui mais de 70 exposições individuais entre 1960 e 2010, essa vontade de colocar tudo em questão nunca esmorecerá. Em 1967, no mesmo ano em que promove a Exposição-Não-Exposição com o efémero Grupo Rex, que fundara em 1966 com Wesley Duke, Geraldo de Barros e outros, e no decorrer da qual oferece gratuitamente obras suas aos visitantes, Nelson Leirner envia ao Salão de Arte Moderna de Brasília um porco empalhado dentro de uma jaula de madeira para depois questionar na imprensa os critérios que tinham levado o júri a aceitar a obra.

Opositor declarado da ditadura militar brasileira, que critica numa série de trabalhos intitulada A Rebelião dos Animais, exposta em 1974 no Museu de Arte de S. Paulo, o artista nunca deixou de gerar polémicas. Em 1998, as suas intervenções em fotografias de crianças da fotógrafa neozelandesa Anne Geddes foram censuradas pelas autoridades judiciárias do Rio de Janeiro, dando origem a uma campanha contra a censura nas artes.

Em Lisboa, a Galeria Graça Brandão inaugurou em Outubro de 2019 uma exposição da obra de Nelson Leirner, Ponto de Partida, comissariada, a pedido do artista, por Albuquerque Mendes.  

Nelson Leirner foi ainda um influente professor, que marcou várias gerações de artistas brasileiros, primeiro na fundação paulista Armando Álvares Penteado, onde ensinou durante vinte anos, entre 1977 e 1997, o ano em que se mudou para o Rio de Janeiro, onde foi depois professor na Escola de Artes Visuais do Parque Lage.

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