Não há dinheiro para manter SNS24 até ao final do ano, diz ex-presidente dos SPMS

De acordo com as estimativas de Henrique Martins, o novo conselho de administração já vinha “sendo preparado” há pelo menos duas ou três semanas.

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Rui Gaudêncio

O ex-presidente dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS), afastado de funções pela tutela na passada quarta-feira, acredita que a causa do afastamento é o “incómodo [causado] pelos avisos ao Ministério da Saúde” pedindo um aumento do orçamento, admitiu em entrevista à Rádio Observador.

“Eu acho que só pode ser por incómodo”, afirmou Henrique Martins, quando questionado sobre as razões que terão levado o Governo a não o reconduzir. Não teve mais informação sobre as causas da sua saída, mas pensa que com “um aumento enorme [de verbas] para a saúde” previsto para 2020 não “devia gerar incómodo pedir orçamento, só se não fosse justificado”.

De acordo com as suas estimativas, o novo conselho de administração, presidido por Luís Goes Pinheiro, antigo secretário de Estado adjunto e da Modernização Administrativa, já “veio sendo preparado” há pelo menos duas ou três semanas.

Henrique Martins disse que recebeu o feedback que pediu à tutela em Novembro sobre o trabalho que vinha sendo desenvolvido pela organização que gere os sistemas de informação da saúde — das receitas electrónicas e sistemas de informação de alguns dos maiores hospitais do país à linha SNS24. Nem o aumento do orçamento pedido.

“A dotação orçamental neste momento não chega sequer para o funcionamento normal do SNS24. Para o final do ano, não teríamos capacidade de pagar o serviço, teríamos de desligá-lo”, concretizou.

Segundo Henrique Martins, os cortes orçamentais começaram em 2018, ano em que o Orçamento do Estado previu uma redução orçamental de nove milhões de euros. Nesse ano, os SPMS receberam 90,4 milhões de euros; em 2020 receberão 76,3 milhões.

Com os cortes perdeu-se “capacidade de trabalho”, defende Henrique Martins. A falta de recursos já causou vários constrangimentos: sistemas desactualizados, que colocam riscos de cibersegurança e sistemas que não partilham informação. Os custos baixaram, mas são “mais heterogéneos”.

“Não é possível treinar enfermeiros de um dia para o outro”

O aumento da procura pelo serviço Saúde 24, causado pelos receios que a covid-19 provoca, sobrecarregou os serviços: “Com esta crise os recursos vão esgotar-se mais depressa”, atalha. O orçamento “não chega sequer para o serviço normal”.

Na quinta-feira, o PÚBLICO noticiava que um quarto das chamadas da Linha SNS24 ficaram por responder no dia 2 de Março, pico de procura. “Sinalizámos na segunda-feira a urgência de afectação de equipas” e na terça-feira foi apresentada uma proposta à tutela, diz o ex-presidente.

Henrique Martins explica que a capacidade de resposta depende de pelo menos dois factores: um é contratual e “prevê atendimento de dez mil chamadas por dia”, que foi cumprido; o outro é humano.

“O factor limitante não é a plataforma tecnológica nem o número de telefone, mas sim as pessoas que estão lá”, ilustra. “É com pessoas que as pessoas que estão nervosas querem falar.”

Para aumentar o número de enfermeiros é necessário treiná-los e “não é possível treinar enfermeiras de um dia para o outro”. “Tinha de pegar nestes enfermeiros e enfermeiras que trabalham parcialmente, libertá-los do quadro do Serviço Nacional de Saúde nos hospitais em poucas horas para fazerem turnos no SNS24, reforçando a capacidade de resposta”, afirma.

Sobre a nova equipa indicada para a administração diz que “seria necessário treinar uma transição para uma pessoa com perfil” e não vê “com bons olhos” a inexistência de um elemento clínico, alguém com “sensibilidade para os temas da saúde”.

“Tive uma das melhores equipas”, elogia. Só “na área das poupanças conseguimos induzir 300 milhões de euros de poupanças na área das compras”. “Não é só durante a guerra que não se mudam as pessoas boas. É sempre”, afirmou, seguindo a linha de um comentário de António Costa sobre a possibilidade de mudanças no ministério da Saúde.

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