ModaLisboa: “Precisamos de ser humanos mais sustentáveis”

Diana Verde Nieto, Jeanne de Kroon e Lisa Lang acreditam que a sustentabilidade na moda começa com o consumidor, que tem o poder de escolher.

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O encontro foi moderado pela jornalista Patrícia Barnabé INSTAGRAM/MODALISBOA

Tecnologia, sustentabilidade e humanidade: a ModaLisboa arrancou esta quinta-feira com uma conversa que olhou o presente e discutiu o futuro da moda. Diana Verde Nieto, Jeanne de Kroon e Lisa Lang foram as protagonistas das Fast Talks, nos Paços do Concelho ­, evento que inaugurou a 54.ª edição do evento.

À porta forma-se fila. São sobretudo jovens e mal se ouve falar português. A biblioteca dos Paços do Concelho mostra-se composta e quase nos esquecemos que a realização do evento à porta fechada chegou a ser equacionada devido ao novo coronavírus, não fosse a presença de uma jovem asiática com a cara tapada por uma máscara — ainda que, jovens asiáticos de máscara, não seja exactamente uma novidade pela turística capital.

E, mesmo num evento aberto ao público em geral, os receios de epidemia parecem dissiparem-se assim a presidente da associação ModaLisboa, Eduarda Abbondanza, dá as boas-vindas às Fast Talks, sublinhando a importância deste género de iniciativas. É com base na reflexão que continuamos a fazer o nosso trabalho”, justifica.

Logo na primeira fila, a vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Lisboa, Catarina Vaz Pinto, reforça a ideia de Eduarda Abbondanza ao mesmo tempo que garante a ModaLisboa é um projecto pelo qual tem “particular carinho” e, numa edição em que a sustentabilidade é um dos pilares de reflexão, evocou ainda o título da cidade como Capital Verde Europeia: “a sustentabilidade é uma mudança que começa pela forma como olhamos o que nos rodeia e os nossos estilos de vida”.

“A sustentabilidade é muito fácil na prática”

“Ao crescer achava que a moda era um mundo de sonhos”, começa por contar Jeanne de Kroon. A jovem era modelo e foi durante um trabalho para uma marca de fast fashion que percebeu a extensão da cadeia de produção de uma peça de roupa. A partir de então, dedica-se a conhecer quem as fabrica. 

Foi assim que Jeanne de Kroon fundou a Zazi, uma marca de roupa desenhada por si e costurada por mulheres de pequenas comunidades da Índia, do Afeganistão ou da Amazónia. “Todas as peças preferidas do nosso armário têm uma história. Mais empolgante do que a moda é a narrativa”, analisa a designer.

Ainda que seja embaixadora global da Moda Sustentável, Jeanne de Kroon salienta que hoje a sustentabilidade “vende”. “Não se deve dizer que é sustentável, mas sim feito eticamente”, alerta.

Diana Verde Nieto responde com a definição da Organização das Nações Unidas para desenvolvimento sustentável: “satisfazer as necessidades de hoje sem comprometer as de amanhã”. “A sustentabilidade é muito fácil na prática”, defende a empresária argentina.

Na Positive Luxury, a empresa responsável pela Butterfly Mark, Diana Verde Nieto atribui certificados de sustentabilidade a marcas de luxo. É neste segmento de mercado que a empresária acredita que a mudança deve começar: “se o luxo enveredar pela sustentabilidade, toda a gente vai tentar copiar”. Jeanne de Kroon acrescenta, neste tema, que a definição de moda de luxo está a mudar. “Hoje em dia na moda de luxo já não se paga pela qualidade”, lamenta a designer.

Neste contexto, as marcas mais pequenas podem ser “disruptivas”, destaca Lisa Lang, A consultora de moda, tecnologia e empreendedorismo da Comissão Europeia acredita que as grandes empresas, que “cometem erros”, devem ser “responsabilizadas”.

Para Lisa Lang, a tecnologia de moda pode ser a solução, se implementada na educação dada aos novos designers. “Deve ser o designer a dominar a tecnologia e não o contrário”, avisa a empresária da ThePowerHouse. Uma farpa que faz com que Diana Verde Nieto atice a plateia: “Será que precisamos de mais designers de moda?”. Uma pergunta para a qual dá resposta imediata: “Da mesma maneira não [precisamos]; se não mudarem a forma de pensar”. A fundadora da Butterfly Mark acredita, ainda assim, que “as revoluções acontecem com grupos pequenos”.

“Somos mais do que consumidores”

Ao longo da conversa há vários pontos de vista, mas numa coisa as três oradoras estão de acordo: a solução não tem que ser uma utopia. “Todos temos que ser activos e encontrar a nossa própria solução”, sugere Lisa Lang.  A comissária europeia aconselha as novas marcas a tornarem-se, se possível, “independentes de fornecedores”. Lang reforça ainda a importância da criação de “padrões europeus” para a sustentabilidade da moda. “Em Bruxelas, há poucos designers interessados em discutir estes temas”, lamenta.

Já Diana Verde Nieto sente que “a mudança está a acontecer”. A empresária argentina quer empoderar quem compra: “somos mais do que consumidores, temos opinião”. Jeanne de Kroon concorda: “precisamos de ser humanos mais sustentáveis e reconectarmo-nos”.

As duas horas de reflexão marcaram o arranque oficial da 54.ª edição da ModaLisboa. Esta sexta-feira, pelas 18h, começam os desfiles nas antigas Oficinas Gerais de Fardamento e Equipamento do Exército no Campo de Santa Clara e decidem-se os vencedores do concurso Sangue Novo. Ainda no programa deste dia, as novas colecções de Carolina Machado, Duarte, Valentim Quaresma e Carlos Gil.

A organização da ModaLisboa chegou a admitir a possibilidade de a iniciativa decorrer “à porta fechada”, no caso de agravamento da propagação do surto de covid-19 em Portugal, com emissão “livestream dos desfiles”. “Esta decisão será tomada em última instância e em caso de necessidade ou indicação das autoridades locais e nacionais de saúde”, sublinhou a organização em comunicado. Para já, a programação da ModaLisboa segue como planeado, apesar dos 13 casos entretanto confirmados em Portugal.

Texto editado por Luís J. Santos

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