Professores não desistem

Se, na Educação, o Governo optou por inexistir, compete aos professores retirá-lo do canto em que se acomodou.

O Governo parece ter desistido dos professores. Conhece os problemas, contudo, não abre linhas de diálogo nem assume compromissos com vista a encontrar soluções. Optou pelo silêncio: não reúne, não responde, não dialoga, não apresenta propostas e não se disponibiliza para debater as que lhe são apresentadas. Não por falta de tempo, mas por estratégia. Espera que os professores desistam por cansaço, desânimo e descrença, mas avalia mal, pois ninguém desiste do que é seu ou tem direito.

Os problemas que afetam os professores repercutem-se no exercício da profissão e na sua vida pessoal.

É o tempo de serviço não contado que rouba salário e reduz a futura aposentação, o bloqueamento de muitos a meio da carreira e as injustas ultrapassagens que também são ilegais; é o envelhecimento para o qual não faltam chamadas de atenção, com o Governo a dizer-se preocupado, mas a nada fazer para o travar e reverter; os horários de trabalho que continuam feridos de abusos e ilegalidades, com os professores a verem sua vida pessoal invadida por um sobretrabalho que provoca forte desgaste e situações, já graves, de burnout; a precariedade que se arrasta, com os contratados a verem negados direitos fundamentais como o de uma plena proteção social.

Mas é, também, a violência sobre professores que não merece condenação clara, a gestão que os afasta dos níveis de decisão, o amianto que não é removido, a municipalização que é adiada um ano para ver se pega e tantos outros problemas que se vão arrastando sem solução à vista, apesar das preocupações, dos apelos e das propostas que têm chegado ao Ministério da Educação.

Apesar de tudo isto, os professores não perderam – e não devem perder – o elevado grau de profissionalismo que os compromete com os alunos e leva à obtenção de resultados muito positivos. O Governo apropria-se deles, é certo, com autoelogios e promoção internacional. Habituados que já estão a ser esquecidos, para os professores o importante é saber que os obtiveram, sendo isso que os faz aguentar, ajudando-os a renovar o seu brio profissional e enchendo-os de orgulho.

No Dia Mundial do Professor, UNESCO, Organização Internacional do Trabalho, UNICEF, PNUD e Internacional da Educação​ divulgaram mensagem conjunta afirmando que se torna “difícil atrair e reter talentos naquela que é uma profissão mal paga e subvalorizada”, pelo que “os governos têm de melhorar o emprego e as condições de trabalho”. Instaram “os governos a fazerem do ensino uma profissão de primeira escolha para os jovens”. Assenta que nem uma luva a um Governo que finge não ver milhares de jovens docentes a abandonar a profissão, pouco jovens a escolherem-na quando chegam ao ensino superior e, nas escolas, a falta de professores já a fazer-se sentir.

Se, na Educação, o Governo optou por inexistir, compete aos professores retirá-lo do canto em que se acomodou. O Governo não pode continuar a esconder-se dos professores. É sua obrigação dar resposta aos problemas, negociando soluções com as organizações sindicais. Se não o faz – e o ministro considera que insistir na necessidade de soluções para os principais problemas é optar por becos sem saída –, não há alternativa que não passe por recolocar a luta em níveis elevados e clamar, ainda mais alto, respeito pelos direitos e consideração pela nobre missão de ensinar.

Pouco depois da tomada de posse, um dos membros da equipa do ME dirigiu-se à Fenprof escrevendo: “Esperamos poder contar com a Federação Nacional dos Professores para, no âmbito de uma relação de diálogo democrático e interinstitucional, darmos resposta adequada às exigências atuais e crescentes do setor da Educação.” Confirmando que o problema não é esse, os professores ainda aguardam uma primeira reunião negocial, quatro meses depois de terem tomado posse.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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