A Turquia decidiu abrir as portas. A Europa vai continuar a fechá-las?

Os Estados-membros da UE têm todas as condições para darem a mão a muitas destas pessoas. Podemos ajudá-las todas? Certamente que não. Nenhuma política vai resolver completamente nenhum problema. Mas podemos, com certeza, fazer mais e melhor.

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LUSA/DIMITRIS TOSIDIS

As recentes ofensivas de Bashar al-Assad em Idlib provocaram a fuga forçada de mais 900 mil pessoas, grande parte delas, crianças. A Turquia decidiu abrir as portas. A Europa vai continuar a fechá-las?

Porque estarão os nossos governos a evitar o senso comum de estender a mão a quem foge do perigo da morte? Sendo certo que este é um fenómeno complexo, cuja explicação não residirá apenas num factor, arrisco-me a avançar que um deles é a percepção que esses mesmos governos têm da falta de receptividade das suas populações à ideia de ajudar e receber estas pessoas nos seus países.

Olhemos para o governo da Alemanha, cuja decisão de aceitar cerca de um milhão de refugiados saiu politicamente cara. Os Estados-membros da União Europeia (UE) sabem que o nosso egoísmo e medo do desconhecido será (e está a ser) aproveitado, de forma eficiente, por oportunistas, que fazem da demonização do estrangeiro um dos seus mitos agregadores, captando assim um nicho politicamente adormecido e inexplorado. Tudo isto tem como corolário a ideia de que é melhor não receber refugiados, pois tal decisão traduzir-se-á em mais lenha para a fogueira desse espectro político.

De onde virá este medo e egoísmo da população europeia? O que nos faz ignorar esta realidade que se está a passar mesmo ao nosso lado, e pactuar tacitamente com as políticas adoptadas pela UE nesta matéria?

Será o medo do terrorismo? Segundo a Europol, entre 2015 e 2018, o número de incidentes decorrentes do terrorismo jihadista foi semelhante ao do terrorismo de extrema-esquerda e anarquista, e consideravelmente inferior ao do terrorismo etno-nacionalista e separatista.

Existe um choque de civilizações? Foquemo-nos então no estudo do problema, na convergência para soluções que visem a integração, que consigam conciliar a preservação das suas culturas com o respeito pela nossa, incluindo a nossa lei. A sua entrada na UE é um assunto sensível devido à livre circulação, logo, tem de ser rigorosamente escrutinada? Certamente que sim.

Estas e muitas outras questões levantam-se aquando do processo de integração de um refugiado, mas a complexidade do problema não pode resultar na demissão e na venda da sua resolução.

Os Estados-membros da UE têm todas as condições para darem a mão a muitas destas pessoas. Podemos ajudá-las todas? Certamente que não. Nenhuma política vai resolver completamente nenhum problema. Mas podemos, com certeza, fazer mais e melhor. A percentagem de refugiados que entrou na Europa nos últimos cinco anos trata-se de uma ínfima parte do total, sendo a maioria recebidos em países africanos e do Médio Oriente, que dispõem de menos recursos.

Estou grato por, ao contrário destas pessoas, ter tido sorte na aleatoriedade do nascimento. Nasci na Europa e acontece que a Europa goza um dos períodos mais longos de paz da sua história. Espero não vir a enfrentar a triste realidade de precisar de refúgio, como há cerca de 70 anos outros europeus enfrentaram; mas, se algum dia precisar, darei graças a quem tiver a amabilidade de me receber e me ajudar no processo de retorno a uma vida digna.

Seria saudável colocarmo-nos no lugar de quem deixa tudo para trás por medo da morte, para que muitos dos nossos políticos não se vejam obrigados a tomar decisões com base no nosso medo e egoísmo.

A conjuntura crítica actual abre uma janela de oportunidade para que a Europa faça mais e melhor do que fez até aqui. Não esqueçamos que Europa é apenas uma abstracção de cada um de nós, europeus.

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