O novo ginásio high-tech de Lisboa parece um jogo de tabuleiro do futuro. Vale a pena?

O espaço quer fugir ao “ginásio tradicional”, mas os exercícios são os mesmos: agachamentos, pranchas, corridas, saltos. Só que no Circle tornam-se um jogo num ambiente escuro com muitas luzes e poucas distracções.

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O ginásio usa tecnologia Parma, da empresa norte-americana Pavigym Rui Gaudêncio
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Noor Palma, 28 anos, é directora-geral do Circle Rui Gaudêncio
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Há círculos luminosos dispostos pelo chão e pelas paredes escuras Rui Gaudêncio
Circle - Bem-estar aumentado
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O ginásio está dividido em dois pisos Circle
Mario Sorrenti
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As aulas são supervisionadas por um instrutor para corrigir posturas Circle
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Na entrada não há cancelas nem sítio para passar cartão Circle
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O Circle oferece serviços de personal trainer, aulas de ioga e pilates, aulas para os mais novos, gabinete de nutrição, massagens e serviços de estética Circle
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Um dos serviços oferecido é uma “avaliação integral do movimento” Rui Gaudêncio
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O espaço fica perto do El Corte Inglés, em Lisboa Rui Gaudêncio

Há um burburinho em Lisboa  particularmente entre os adeptos de novas tendências, fãs de exercício físico ou utilizadores ávidos do Instagram  sobre o Circle, o novo ginásio "high-tech” em São Sebastião. Descrito como um “conceito inovador”, ostenta uma tecnologia de “última geração” com uma plataforma que usa luzes, sons e exercícios interactivos para melhorar a performance

Nas imagens partilhadas nas redes sociais, lembra um tapete de Twister gigante, ou um universo futurista, com pessoas de fato treino espalhadas pelo meio de círculos luminosos dispostos pelo chão e pelas paredes escuras. Não se vêem filas de passadeiras rolantes, bicicletas, prensas de pernas, elípticas ou outras típicas máquinas de ginásio coladas umas às outras.

Cada sessão tem um mínimo de 30 minutos. Depois do aquecimento, que é orientado por um instrutor, a aula divide-se numa sequência de exercícios — programada num ecrã à entrada e repetida pelo menos três vezes —, realizados em intervalos que variam de 30 a 90 segundos. No fundo, é uma aula de circuito. Quem é fã de aulas de grupo de ginásio já conhece o formato. Só que no Circle funciona como um jogo, com diferentes partes da sala a iluminarem-se na hora de mudar de estação. Uma gravação dita o percurso a seguir, um ecrã mostra como realizar cada exercício e as luzes, espalhadas pelo chão e paredes, ditam os limites físicos — por exemplo, um círculo com um diâmetro de um metro onde se fazem agachamentos. 

Embora o espaço procure afastar-se do conceito de “ginásio tradicional”, os exercícios são os mesmos de sempre: agachamentospranchaspontes de glúteoscorridassaltos... E ocasionalmente há discos, barras e outro material típico de ginásio. 

“Quero lembrar as pessoas que o exercício físico pode ser divertido”, começa por dizer Noor Palma, 28 anos, directora-geral do novo ginásio. “O ambiente de um ginásio ‘tradicional’ pode ser extremamente intimidador. No Circle, criei um ambiente com luzes, sem espelhos, onde as pessoas estão distraídas, estão a fazer coisas em conjunto, a testar limites e acho que isso integra muito mais as pessoas”, descreve.

Não há espelhos nas salas de treino Circle
Não há espelhos nas salas de treino
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Não há espelhos nas salas de treino Circle

As paredes preenchidas por círculos luminosos servem, principalmente, para exercícios que testam a rapidez de reacção e a capacidade de propriocepção (perceber a posição do nosso corpo no espaço), desafiando os participantes a tocar o mais rápido possível em diferentes partes da parede. O final da aula é dedicado a um desafio: por exemplo, uma sequência de vários sprints, disfarçados de toques repetidos em dois círculos no chão. Quando não se aplica força suficiente ou se sai dos círculos, o sistema não regista os toques. Apesar do apoio da tecnologia, há sempre um profissional de exercício físico presente para corrigir a postura e motivar as pessoas.

A psicologia dos bons hábitos

Noor Palma não foi sempre uma apaixonada pelo exercício. Formada em psicologia criminal, diz que descobriu o gosto há cinco anos, quando regressou do mestrado em Londres, incerta do rumo a seguir e pouco entusiasmada pelas opções profissionais em Portugal

“Inscrevi-me num ginásio para me manter ocupada, como toda a vida me tinha inscrito em ginásios sem grande efeito, só que daquela vez tive sorte”, recorda, acrescentando que na altura estava “pré-obesa e sedentária”. “Conheci as pessoas certas para me motivar. Ir ao ginásio já não era estar sozinha com auriculares. E um dia, deu-se um clique e pensei: ‘é isto que quero fazer da vida. Quero criar um ambiente em que o processo seja sempre assim.’ E porque não?” 

A ideia avançou quando descobriu a tecnologia Prama, criado pela empresa espanhola Pavigym, que fornece pavimento e paredes interactivas e sensíveis a pressão, onde se podem coordenar diferentes actividades através de ecrãs interactivos.“Vi uma oportunidade de negócio em Portugal”, continua Noor, que olha para as pessoas que não fazem exercício, porque “não gostam de ginásios e sentem que aquilo não é para elas”, como parte do seu público-alvo.

O número de portugueses com 15 ou mais anos que “raramente” ou “nunca praticaram” exercício ou desporto tem vindo a aumentar nos últimos anos. Segundo os últimos dados divulgados pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), referentes a 2017, 74% não tem por hábito praticar qualquer tipo de actividade física ou desporto.

“O Circle vai além do Prama”, frisa Noor. “Tal como em psicologia se fala em sítios que promovem maus hábitos, como casinos, há ambientes que fazem o contrário.” À entrada, não há quaisquer barreiras ou cancelas, dá a ideia de que qualquer um é bem-vindo ao piso superior, onde há chá e água à discrição, sofás onde se sentar, livros (de saúde, bem-estar ou desporto) para ler e ecrãs para consultar as aulas disponíveis.

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Noor Palma diz que só se apaixonou pelo exercício físico há cinco anos Rui Gaudêncio

Um ginásio sem números

Um dos serviços oferecido é uma “avaliação integral do movimento” – serve para ajudar as pessoas a perceber melhor o seu corpo, as áreas que têm de trabalhar e criar planos de treino que as ajudem nas tarefas que têm de realizar no dia-a-dia. Quando se quer treinar, usa-se uma aplicação móvel para validar a entrada no Circle, marcar as aulas, e descem-se as escadas para começar. Para Noor, a tecnologia é “um extra”.

“O grande objectivo do Circle é ser uma coisa divertida e sem números. Acho que a sociedade está farta das calorias, dos quilos, das reps [repetições de um mesmo exercício]. É importante começar a tornar o processo de vir a um ginásio fazer exercício algo de que as pessoas gostam”, defende Noor. O facto de o ginásio se focar em actividades de grupo, dando poucas opções para se treinar sozinho também ajuda a integrar aqueles que são mais resistentes ao exercício. 

A entrada, em tons de branco e bege, faz contraste com o piso inferior Circle
A entrada, em tons de branco e bege, faz contraste com o piso inferior Circle
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A entrada, em tons de branco e bege, faz contraste com o piso inferior Circle

O Circle oferece uma aula experimental, mas o melhor é ligar e reservar, antes de aparecer. Depois, é uma questão de orçamento, de prioridades e de gosto pessoal. Com a possibilidade de pagar por aulas individuais, o Circle também faz parte da tendência de boutiques fitness que começa a surgir em Portugal. São espaços mais pequenos que se especializam em treinos específicos, com equipamento e espaços de luxo. Em Lisboa, o Be the Ko, uma boutique de boxing que usa sacos equipados com sensores, e o The Code, com aulas de alta intensidade ao som de remixes criados para o clube, são outros exemplos.

Os preços do Circle começam nos 20 euros (por aula de grupo) e vão até aos 89 euros por mês, com fidelização de um ano, ou 120 euros para experimentar um mês com acesso ilimitado . Há ainda serviço de personal trainer, aulas de ioga e pilates, aulas para os mais novos, gabinete de nutrição, massagens e serviços de estética. Experimentar não custa nada.

O PÚBLICO fez uma aula experimental a convite do Circle.

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As paredes são interactivas e estão equipadas por sensores Rui Gaudêncio
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