Ministério Público acusa elementos do FC Porto pela divulgação dos emails do Benfica

Francisco J. Marques e Diogo Faria foram acusados de crimes de violação de correspondência, à semelhança de Júlio Magalhães, director do Porto Canal. Pinto de Costa e outros dirigentes isentos de responsabilidades.

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Francisco J Marques, director de comunicação do FC Porto Ines Fernandes

O Ministério Público (MP) acusou o director de comunicação do FC Porto, Francisco J. Marques, o director do Porto Canal, Júlio Magalhães, e o comentador Diogo Faria de violação de correspondência e de acesso indevido, por divulgarem conteúdos de emails do Benfica no programa Universo Porto – da Bancada.

O presidente do FC Porto, Jorge Nuno Pinto de Costa, e várias outras figuras da direcção da SAD portista, como Adelino Caldeira, Reinaldo Teles e Fernando Gomes, não foram responsabilizados pelo MP, ficando isentos de qualquer acusação. 

O despacho do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), a que o PÚBLICO teve acesso, imputa seis crimes de violação de correspondência ou de telecomunicações, três dos quais agravados, um crime de acesso indevido e um crime de ofensa a pessoa colectiva ao director de comunicação dos “dragões”, o rosto da divulgação dos emails.

A acusação, assinada pela procuradora Vera Camacho, afirma que Francisco J. Marques, “mesmo tendo consciência de que havia acedido a coisa alheia”, analisou o conteúdo dos emails, divulgando-o posteriormente num programa televisivo com alcance de “vários milhares de telespectadores”.

O MP considera que, a par destas divulgações, o director de comunicação dos “dragões”, aproveitou o espaço de comentário no programa para “extrair conclusões e conformar uma realidade”. Fazendo referência a um dos emails trocados entre Adão Mendes e Pedro Guerra, o despacho diz que os espectadores ficaram convencidos, pela narrativa imprimida por Francisco J. Marques, que o texto original “representava um esquema de corrupção”.

Por sua vez, Júlio Magalhães, director-geral do Porto Canal, foi acusado pelo MP por não ter impedido a transmissão destes conteúdos. O despacho afirma que o ex-jornalista “anuiu e concordou” com a divulgação destes emails, garantindo que Júlio Magalhães possuía poderes no interior do canal “para impedir a divulgação dos emails alheios”. Foi acusado de três crimes de violação de correspondência ou de telecomunicações agravados.

Diogo Faria, funcionário do departamento de comunicação do FC Porto e comentador do Porto Canal, tinha conhecimento da proveniência ilícita desta informação, alega o MP, acusando-o de um crime de violação de correspondência ou de telecomunicações e um outro crime de acesso indevido.

Ao PÚBLICO, Nuno Brandão, um dos advogados do FC Porto, afirmou que o clube vai defender o princípio da liberdade de expressão como base para estas revelações, à semelhança do que foi feito no processo cível movido pelo Benfica. “A nossa posição é de que foram denunciadas práticas ilegais”, explica. 

A recepção da “cartilha”

Além de ter enunciado as revelações feitas no Porto Canal, o MP detalha que um “indivíduo não concretamente identificado”, acedeu ao sistema informático do Grupo Sport Lisboa e Benfica sem autorização, entrando nas contas de correio electrónico de vários colaboradores “exfiltrando” a informação encontrada.

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Diogo Faria também é membro do departamento de comunicação do FC Porto NELSON GARRIDO

“Após obtenção desse acesso, exfiltrou a correspondência electrónica integral de vários colaboradores e, na posse da mesma, decidiu partilhá-la com o arguido Francisco J. Marques, atendendo às funções que este exercia e que eram publicamente conhecidas”, escreve o MP.

Os documentos que ficaram conhecidos como “cartilhas” — onde o Benfica detalhava semanalmente a estratégia de comunicação para os comentadores nos vários programas desportivos — terão chegado à caixa do director de comunicação do FC Porto no dia 4 de Abril de 2017.

Briefings para os comentadores lampiões” era o descritivo em “assunto” do email, onde estava o anexo que continha os documentos em questão. Os ficheiros iam acompanhados da mensagem: “Aqui ficam os dois últimos ‘briefings’ enviados aos comentadores lampiões. Carlos Janela é o autor”.

Esta informação foi enviada a partir do email “elements123@tutanota.com”, endereço confirmado por Francisco J, Marques durante o julgamento no processo cível movido pelas “águias” contra os portistas. Após este primeiro contacto, chegaram links que davam acesso a caixas de correio electrónico, onde estavam alojados as trocas de correspondência entre várias figuras ligadas ao universo benfiquista.

Esses emails acabariam, depois, por ser publicados no blogue Mercado de Benfica, cuja autoria o MP atribui a Rui Pinto. O FC Porto garantiu, após o início das divulgações, que estas informações tinham chegado sem qualquer contrapartida. Francisco J. Marques nega ter conhecimento do responsável por este email, sediado numa plataforma alemã que permite a encriptação das informações trocadas.

Tal como Diogo Faria afirmaria em tribunal, esta informação era mantida num computador especialmente destinado à análise destes emails, situado numa sala de acesso restrito e desligado da Internet.

Uma suposta rede de influência controlada pelo Benfica junto dos órgãos judiciais e instituições desportivas foi a temática explorada nestes programas com a divulgação desta correspondência. Francisco J. Marques e Diogo Faria chegariam a escrever um livro sobre esta alegada teia de influências, intitulado O Polvo Encarnado

Juiz pediu escusa por ser accionista do Benfica

Além desta queixa movida pelo Benfica, os “encarnados” colocaram também um processo cível ao FC Porto, acusando os “dragões” por danos alegadamente causados pela divulgação da correspondência electrónica no programa do Porto Canal. As “águias” exigiam uma indemnização de 17 milhões de euros, mas o Tribunal Judicial da Comarca do Porto baixou para cerca de dois milhões o valor que o FC Porto teria de pagar ao emblema da Luz.

Tal como aconteceu na acusação desta sexta-feira, a acusação, assinada pelo juiz Paulo Teixeira, absolveu Pinto da Costa, Adelino Caldeira e Fernando Gomes, por considerar que o conteúdo do programa era da responsabilidade exclusiva da FCP Media. Nesse sentido, foram condenados Francisco J. Marques, o FC Porto e a respectiva SAD a indemnizarem os “encarnados”.

Os “dragões” recorreram da sentença, com o processo a ser atribuído juiz desembargador Eduardo Pires que, por ser um fervoroso adepto das “águias” e accionista da SAD do Benfica pediu escusa. Ataíde das Neves, presidente do Tribunal da Relação do Porto, considerou improcedente o pedido de escusa do juiz desembargador, mantendo-o no processo.

Face a esta decisão, a equipa de defesa do FC Porto decidiu apresentar recurso no Tribunal Constitucional, por considerarem existirem inconstitucionalidade das normas da intervenção do juiz no processo.

Os “dragões” aguardam agora a decisão do Tribunal Constitucional.

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