Erasmus no meio da crise do coronavírus

Estou a estudar e a viver há quase dois meses em Milão. Não há aulas. Mas “calma” é ainda a palavra de ordem.

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LUSA/MATTEO BAZZI

À parte lidar com chamadas de familiares, estudar em Milão em plena crise de um coronavírus altamente contagioso tem sido tranquilo. Estou a estudar e a viver há quase dois meses em Milão, ao abrigo do programa Erasmus. Desde o último fim-de-semana, as medidas de prevenção têm-se feito sentir de alguma forma no meu dia-a-dia. Não há aulas. Mas “calma” é ainda a palavra de ordem.

Pela janela do meu quarto, repara-se que o número de turistas na cidade diminuiu, bem como o número de pessoas a utilizar o metro. De resto, vêem-se os mesmos carros nas estradas e há pessoas a caminhar na rua – muitas delas sem máscara.

Apesar de podermos sair, tenho evitado fazê-lo. Como vivo numa residência universitária, a solidão de ter de estar dentro de casa é combatida com o convívio nas zonas comuns. Entre as pessoas que vivem aqui não se instalou a desconfiança. Estamos todos muito unidos e a comédia à volta do coronavírus é uma constante nas nossas conversas.

A cozinha comum tem agora maior afluência, dado que muitos restaurantes estão fechados. Isso tem trazido pessoas novas para o convívio e, depois de jantar, temo-nos juntado a jogar cartas, videojogos e damas. As festas, que costumavam ser em bares, passaram a ser feitas na sala comum, que agora está sempre com música do início ao fim do dia.

Ir ao supermercado continua a ser uma tarefa simples. Existem três supermercados na zona onde vivo e todos têm quantidades habituais quer de alimentos quer de clientes. Alguns produtos têm menos stock que o normal – como a massa ou a água – mas nada parece estar em ruptura.

As saídas da residência têm sido limitadas a idas ao supermercado, passeios no parque ou a jantares na casa de outros amigos aqui em Milão. Mas a minha rotina de (quase) todos os dias – ir à praça central da cidade e fazer uma refeição pela zona – foi alterada. Tenho evitado sair da minha área de residência e, fundamentalmente, tenho evitado trajectos que tenham de se fazer por transportes públicos, preferindo andar a pé.

Outra diferença significativa no quotidiano foi o número de pessoas na residência. Algumas preferiram regressar aos seus países para já e outros ponderam cancelar o programa Erasmus. Os que ficaram estão calmos e acreditam que, em breve, tudo voltará ao normal, sendo uma questão de poucas semanas. Os outros portugueses que conheço estão divididos. Um deles preferiu manter-se em Portugal e aguardar pela evolução da situação. Outro está numa viagem, mas tenciona voltar a Milão no final da semana. Os restantes estão optimistas e tencionam ficar aqui na cidade.

A universidade onde estudo cancelou todas as actividades até dia 2 de Março. A universidade de origem, em Portugal, que me contactou há dois dias, questionou-me sobre como estava a lidar com a situação e se tencionava ir embora de Itália. Ainda assim, não deu qualquer indicação de que seja necessário voltar a Portugal.

Fomos aconselhados pelas autoridades locais a não frequentar zonas da cidade com muita gente ou espaços fechados, mas deram-nos a indicação de que não há qualquer perigo em andar na rua, desde que com as devidas precauções. Entregaram-nos máscaras e desinfectante e, na próxima semana, estará um médico disponível para testar se estamos infectados.

As medidas bastante restritivas quanto a espaços e eventos públicos estão a ajudar a evitar multidões. No entanto, de forma geral, percebe-se que os italianos e os residentes aqui estão a reagir ao caos anunciado de forma tranquila.

O convívio, a boa disposição e o divertimento próprio de uma experiência Erasmus não foram afetados. No entanto, o que mais se alterou com a chegada do vírus a Itália foram as viagens. Perdi o Carnaval de Veneza, que já tinha marcado com alguma antecedência. Outras viagens que estavam agendadas para breve terão de ser adiadas.

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