A bordo da Sagres está a avaliar-se a saúde dos oceanos

Navio-escola está a realizar uma viagem de circum-navegação, quando se celebram os 500 anos da viagem de Fernão de Magalhães. A bordo vão dois investigadores que estão a recolher dados para ficarmos a conhecer melhor a saúde dos oceanos

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O navio-escola Sagres está a realizar mais uma volta ao mundo António Borges/Arquivo

Com um mês e meio de viagem cumpridos, o navio-escola Sagres está quase a atracar no porto de Montevideu, no Uruguai, uma das muitas paragens na viagem de 371 dias que percorre os caminhos da viagem da circum-navegação de Fernão de Magalhães, há 500 anos. Numa época em que já não se procura inaugurar rotas à volta do mundo, a viagem tem outras novidades para oferecer: é a primeira vez que leva a bordo dois investigadores que vão desenvolver projectos de monitorização de lixo marinho e de microplásticos e recolher dados para se perceber melhor a interacção entre o espaço, a atmosfera e os oceanos.

O navio já atravessou o Atlântico e os trabalhos de recolha de dados para os dois projectos de investigação já começaram, mas só na tarde desta sexta-feira é que os ministros da Defesa Nacional, João Gomes Cravinho, e o ministro do Ambiente e da Acção Climática, João Pedro Matos Fernandes, assinaram os protocolos que garantem um financiamento de 200 mil euros aos trabalhos de investigação científica em curso a bordo da Sagres, através do Fundo Ambiental.

No diário de bordo do navio, que vai sendo actualizado com regularidade na página da internet da Sagres, percebe-se que o trabalho científico está em curso. Na entrada de 15 de Janeiro assinalava-se que “foi lançado à água o Towfish, um equipamento que vai ser rebocado durante vários períodos de navegação para recolher dados do oceano para fins científicos”.

O equipamento foi desenvolvido pelo Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência (INESC TEC), no âmbito do projecto SAIL (Space-Atmosphere-Ocean Interactions in the marine boundary Layer) e é uma componente essencial para o que é considerado “um estudo pioneiro sobre a electricidade atmosférica e as alterações climáticas”. A explicação é do próprio INESC-TEC que, aquando da divulgação do projecto, salientava que a última medição do campo eléctrico atmosférico a bordo de um navio de investigação aconteceu há cem anos, com o norte-americano Carnegie.

A 30 de Janeiro, o diário de bordo do navio dava conta da actividade do outro projecto, relacionado com a presença de microplásticos no oceano, e que é desenvolvido em parceria com o Instituto Hidrográfico. “Diariamente, são bombeados cerca de mil litros de água salgada, os quais são primeiramente filtrados num peneiro com 0,05 milímetros (mm) de malha e posteriormente passados por um filtro de 0,001 mm, onde ficam armazenados. As amostras obtidas durante a missão vão ser conservadas, a bordo, para posteriormente serem analisadas pela divisão de química do Instituto Hidrográfico”, lê-se.

Viagem de circum-navegação

O facto de a Sagres estar a realizar uma viagem de circum-navegação, com passagem marcada por zonas de difícil acesso para os investigadores, irá permitir a recolha de informação diversificada e de origens muito diferentes. Seja no que diz respeito aos microplásticos – havendo a expectativa que os dados recolhidos possam contribuir para, por exemplo, mapear zonas de acumulação destes materiais –, seja no estudo das trocas de calor e humidade entre a superfície do oceano e a atmosfera, e a sua influência no clima.

Num resumo dos protocolos assinados esta sexta-feira, o Ministério do Ambiente e da Acção Climática (MAAC) salienta que “a camada limite marinha é vital para o clima terrestre devido às trocas importantes de calor e humidade que nela ocorrem, e também pela abundância de nuvens baixas, que têm uma influência muito significativa no clima”. Contudo, estas nuvens são “mal representadas nos modelos climáticos actuais”, em parte, por causa da falta de observações nos locais em que podem ser encontradas, “dada a dificuldade de efectuar medições atmosféricas sobre o oceano”. O projecto SAIL (que tem uma duração de três anos, estendendo-se para além do componente da Sagres) irá permitir a produção de “um conjunto de dados interdisciplinar único para estudos climáticos e de interacção espaço-terra a nível regional e global”, refere o MAAC.

Antes da partida, numa entrevista à TSF, o comandante da Sagres, Maurício Camilo, salientava que esta era a primeira vez que a embarcação iria ser utilizada “com plataforma para a realização de experiências científicas”, precisando que o objectivo central de todas elas era efectuar medições. “Medir o quê? Medir a quantidade de microplásticos na água, medir parâmetros da água e da atmosfera, tentar apanhar alguns peixes para perceber como estão em termos de saúde, se têm ou não os tais microplásticos. Vamos tentar medir um pouco a saúde dos oceanos”, disse.

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