Morreu Pedro Baptista, comissário das comemorações da Revolução Liberal do Porto

Tinha 71 anos. Foi escritor, deputado, antifascista. Terá sido vítima de doença súbita, esta madrugada, em casa, no Porto.

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Pedro Baptista NELSON GARRIDO

Morreu o escritor e ensaísta, Pedro Baptista, comissário das comemorações da Revolução Liberal do Porto, avançou o Jornal de Notícias e confirmou o PÚBLICO junto da Câmara do Porto.

Segundo o JN, Pedro Baptista terá sido vítima de doença súbita, na madrugada desta quinta-feira, em casa, no Porto.

Pedro Baptista, de 71 anos, esteve esta quarta-feira à noite na Assembleia Municipal do Porto e era esperado às 11h desta quinta-feira na Casa do Infante, no Porto, para uma visita prévia à exposição 1820. Revolução Liberal no Porto, que ficará patente desta quinta-feira até 6 de Setembro. “O seu percurso fica marcado pelo grande contributo cívico e político ao serviço da cidade do Porto, que sempre elevou em todos os planos e palcos por onde passou”, diz a Câmara do Porto no seu site.

A inauguração marca o arranque de um extenso programa de comemorações lançado pela Câmara do Porto para assinalar os 200 anos decorridos sobre essa madrugada do dia 24 de Agosto de 1820, quando a cidade, sublevada por um pronunciamento militar a que a população de imediato aderiu, proclamou a Junta Provisional do Governo Supremo do Reino e deu o primeiro passo para edificar o Portugal moderno.

Ainda esta quinta-feira, em entrevista ao JN, Pedro Baptista afirmava estar a trabalhar num simpósio para “perceber qual o sentido do liberalismo nos dias de hoje. Porque a revolução de 1820, para a época, foi o que de mais avançado podia ter acontecido”.

Pedro Baptista nasceu em Nevogilde, Porto, em 1948. Licenciado e doutorado em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, foi investigador-coordenador no Instituto de Filosofia desta Faculdade e investigador-colaborador no Centro de Estudos do Pensamento Português da Universidade Católica.

Como escritor, estreou-se em 1986 com o livro Ao encontro do Halley: O Homem e o Cometa (Afrontamento, 1986), um “ensaio de psicologia e antropologia”, e publicou depois vários romances e livros de contos, incluindo Sporá (1992), que foi finalista do Grande Prémio de Romance da Associação Portuguesa de Escritores, O Cavaleiro Azul (2001), Pessoas, Animais e Outros que Tais (2006) e A Queima do Cão de Palha (2008). Em 2007, inaugurara os Cadernos do Campo Alegre, editados pelo jornal O Progresso da Foz, com Centenário do Gabiru, evocação dos cem anos da publicação de Os Pobres, de Raul Brandão. 

O seu interesse pelo movimento da chamada Filosofia Portuguesa, e em particular pela história e pelo projecto da primeira Faculdade de Letras do Porto, criada por Leonardo Coimbra, está reflectido em livros como A Pluralidade na Escola Portuense de Filosofia: O Pensamento Moral e Político de Newton de Macedo (2010), O Filósofo Fantasma: Lúcio Pinheiro dos Santos (2010) ou O Milagre da Quinta Amarela (2012). Deve-se-lhe ainda a organização dos três volumes da obra completa de Francisco Newton de Macedo, editados em 2014 pela Universidade Católica do Porto.

Em 2014 e 2015, lançou os dois volumes das suas memórias – Da Foz Velha a'O Grito do Povo​ e Da Revolução Gorada aos Desafios do Presente –, aos quais previa acrescentar um terceiro que já não teve tempo de escrever. Já muito adiantado estava um livro dedicado à China, por onde viajou muito nestes últimos anos. 

Acerca da sua precoce consciencialização política, contou ao PÚBLICO, em 2009, que chumbou no exame de admissão à universidade por ter citado Lenine, Marx e Freud, mas que já antes disso, em 1958, então com apenas 11 anos, seguira atentamente a campanha eleitoral de Humberto Delgado e tivera consciência da fraude eleitoral montada pelo regime. “Aqui a casa chegavam os três jornais do Porto, e eu, desde os dez anos, lia-os todos. E aprendi a ler nas entrelinhas. Se diziam uma coisa, o contrário é que devia ser a verdade. Se mostravam grande indignação por a ONU ter condenado Portugal numa dada situação, eu concluía logo que a ONU deveria estar certa.”

Foi dirigente estudantil de 1968 a 1971, co-fundador do movimento organizado em torno do jornal O Grito do Povo, em 1971, que depois daria origem à Organização Comunista Marxista-Leninista Portuguesa, de que foi líder. Preso e torturado pela PIDE em 1973, foi incorporado compulsivamente e enviado para Angola, onde ainda se encontrava quando se deu o 25 de Abril. Entre 1995 e 1999 foi deputado na Assembleia da República, eleito pelo Porto nas listas do Partido Socialista. Lançou ainda um efémero Partido do Norte e foi candidato do Partido Democrático do Atlântico (PDA), em 2011, pelo círculo do Porto. Foi convidado por Rui Moreira, presidente da Câmara do Porto, para integrar a sua lista de candidatos à Assembleia Municipal em 2013 e 2017.

Apanhado de surpresa com a notícia da sua morte, o deputado socialista Pedro Bacelar de Vasconcelos afirmou: “Pedro Baptista era uma força da natureza, estimulante como amigo e insuportável como adversário, mas sempre um interlocutor estimulante. A minha amizade com o Pedro vem antes do 25 de Abril, do início dos anos 70, e resistiu a todas as discordâncias até hoje. Estou extremamente perturbado e não consigo dizer mais nada.”

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