Ministério Público pede anulação do acórdão sobre Shopping Cidade do Porto

MP não foi chamado a pronunciar-se sobre o recurso, que terminou com a decisão de extinção da acção executiva para demolição do Shopping.

Foto
O Shopping Cidade do Porto anda nos tribunais há quase 25 anos Tiago Lopes

O Ministério Público requereu a anulação do acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte que decretou a extinção da acção executiva para demolição do Shopping Cidade do Porto. Este processo, que corre nos tribunais há quase 25 anos, parecia terminado, com aquela decisão de 13 de Dezembro, mas o MP considera que foi desrespeitado o Código do Procedimento Administrativo e o Código de Processo nos Tribunais Administrativos, ao não ter sido pedida, antes disso, a pronúncia da procuradoria.

Não terá sido por ter sido publicado numa sexta-feira 13, mas o acórdão em causa está a ser contestado de várias formas, o que pode impedir que se tenha posto, como pretendia, um ponto final ao longo processo do Shopping do Bom Sucesso, ou Cidade do Porto, que teve origem numa acção popular interposta pelo arquitecto José Pulido Valente. Quando revelou essa decisão, na passada segunda-feira, o PÚBLICO deu conta de que este se preparava para a contestar, considerando que o TCAN tinha extravasado os seus poderes, ao não julgar apenas o recurso que tinha em mãos, mas extinguindo, além disso, a própria acção executiva que tinha sido considerada procedente, na primeira instância.

Note-se que o que está a ser julgado, neste caso, já não é a legalidade ou ilegalidade da construção do shopping, cuja licença de construção foi considerada nula em 2000, por violação do Regulamento Geral das Edificações Urbanas e do Plano Director Municipal de então. Isso estava assente e confirmado, inclusive, pelo Supremo Tribunal Administrativo, em 2002.

Em causa estava agora uma acção para execução dessa sentença, interposta também por Pulido Valente, que tinha dado origem, em 2007, a uma decisão do Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, determinando que o edifício fosse esvaziado e demolido em 42 meses, ou seja, em três anos e meio, a menos que, entretanto, se percebesse que seria possível a sua legalização. Essa decisão tinha sido contestada, em recurso, por vários proprietários de lojas do centro comercial e pelo principal visado no processo, o Município do Porto, num gesto que suspendeu aquele prazo.

O recurso estava nas mãos de um colectivo do TCAN que, ao analisar o processo, percebeu que em 2015 a Câmara do Porto, já no consulado de Rui Moreira, tinha legalizado o prédio, à luz do PDM actualmente em vigor, concedendo as respectivas licenças de construção e de utilização, duas décadas após a abertura do centro comercial. E perante este dado, as juízas consideraram que não valeria a pena continuar a tentar demolir um prédio, se os motivos que o justificavam (a nulidade da licença), tinham sido sanados. Seguindo este raciocínio, o acórdão que fizeram publicar determinou a extinção do recurso e da acção executiva que lhe tinha dado origem.

O problema é que o Ministério Público considera que deveria obrigatoriamente ter sido notificado para dar parecer sobre o recurso, antes da publicação do acórdão, a 13 de Dezembro. E, segundo os autos, nota, esse pedido de pronúncia não foi feito. Em requerimento enviado ao colectivo que tinha o recurso em mãos ainda antes do final do ano, o procurador junto do TCAN pede a anulação do “processado posterior ao acto omitido”, o que inclui a decisão, fundamentando o requerimento no artigo 146 do Código do Processo dos Tribunais Administrativos.

Diz a alínea 1 do n. 146 do CPTA que “recebido o processo no tribunal de recurso e efectuada a distribuição, a secretaria notifica o Ministério Público, quando este não se encontre na posição de recorrente ou recorrido, para, querendo, se pronunciar, no prazo de dez dias, sobre o mérito do recurso, em defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, de interesses públicos especialmente relevantes ou de algum dos valores ou bens referidos no n.º 2 do artigo 9.º”. E lê-se na alínea seguinte que no caso de o MP “exercer a faculdade que lhe é conferida no número anterior, as partes são notificadas para responder no prazo de dez dias”.

O Código do Procedimento Administrativo conclui, no seu artigo 195 – invocado também neste requerimento do MP - que a omissão de uma formalidade que a lei prescreva produz nulidade “quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou decisão da causa”. Aguarda-se, ainda, a resposta do colectivo a estes argumentos mas, recordando uma frase imortalizada por Mark Twain, manda a prudência que, apesar dos 25 anos já passados, é melhor não decretar a morte deste processo. Notícia que seria, pelo que se vê, “manifestamente exagerada”.

Sugerir correcção
Ler 8 comentários