Morreu Tozé Martinho, um dos primeiros galãs da telenovela portuguesa

Actor e argumentista, a sua história confunde-se com a da ficção televisiva nacional.

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O actor tinha 72 anos DR
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Tozé Martinho com Nicolau Breyner, com quem contracenou várias vezes INÁCIO ROSA/LUSA

O actor e argumentista Tozé Martinho, um dos primeiros galãs da história da telenovela portuguesa, morreu este domingo no Hospital de Cascais, aos 72 anos, noticiou a Agência Lusa, citando fonte da da família. O actor, que em 2018 já tinha sofrido um acidente vascular cerebral do qual nunca chegou a recuperar totalmente, não resistiu a uma paragem cardiorrespiratória. 

Filho da actriz Maria Teresa Guerra Bastos Gonçalves, popularmente conhecida como Tareka (foi de resto com ela que fez a sua primeira aparição na televisão, em 1977, no concurso A Visita da Cornélia), a sua história confunde-se com a da ficção televisiva nacional: foi um dos protagonistas da primeira telenovela produzida em Portugal, Vila Faia (1982). Ao longo da sua carreira participou em inúmeras séries, primeiro na RTP e mais recentemente na TVI, que este domingo o recordou como “uma das maiores figuras da cultura popular” do país. “Pioneiro da indústria das novelas portuguesas, a sua longa carreira inspirou os guionistas nacionais abrindo portas para uma actividade que hoje mobiliza centenas de pessoas”, acrescenta aquela estação em comunicado.

A sua última encarnação televisiva foi, porém, o Afonso d'Orey da muito aplaudida série Sara, que Marco Martins realizou para a RTP2, com Beatriz Batarda como protagonista. “Eu e o Bruno Nogueira [co-autor da série] lembrámo-nos dele porque o Tozé Martinho fazia parte do imaginário de uma certa televisão que trazíamos da infância, da altura em que víamos telenovelas. E, sendo esta uma série que é uma paródia, uma crítica feroz a esse universo, pareceu-nos que fazia sentido convidá-lo. Ele era para nós o representante de uma época”, recorda agora ao PÚBLICO o realizador. Tozé Martinho aceitou o desafio, com uma “enorme generosidade”, diz Marco Martins​, destacando a disponibilidade do actor para aquilo que o papel lhe exigiu: uma “capacidade incrível para rir de si próprio”.

Educado para seguir Medicina, como todos os homens da família, António José Bastos de Oliveira Martinho chegou a estudar Medicina Veterinária ("No primeiro dia em que tive de cortar as orelhas a um cão, despi a bata e entreguei-a ao professor”, contou em 2014 à revista Flash) e, depois, Economia. Mas foi o curso de Direito que levou até ao fim (apesar de uma interrupção para combater em Moçambique, durante a Guerra Colonial), tendo ingressado na vida profissional como advogado, actividade que durante anos acumulou com a sua longa carreira televisiva. Antes disso, aos 18 anos, na sequência de um encontro com Vasco Santana que o deixou “deslumbrado”, já tinha decidido que o seu futuro seria outro, como em 2008 contou à revista Sábado: “Fui ao Teatro Avenida comprar bilhetes com o meu avô e ele cumprimentou-nos. Nessa altura, com 18 anos, disse à minha mãe que queria ser actor.​”

Origens (1983), Palavras Cruzadas (1987), Passerelle (1988) e Roseira Brava (1995) foram algumas das telenovelas que o popularizaram no imaginário português, juntamente com séries como Gente Fina é Outra Coisa (1982), A Mala de Cartão (1988), Os Homens da Segurança (1988) –​ em que contracenava, tal como já antes em Vila Faia, com outro bastião da ficção televisiva nacional, Nicolau Breyner –, Verão Quente (1993) ou Major Alvega (1999). Na TVI, estreou-se na série Todo o Tempo do Mundo (1999), e teve ainda papéis nas telenovelas Olhos de Água (2001), Amanhecer (2002) ou Louco Amor (2012). “Todas, sem excepção”, nota agora a TVI, “foram enormes êxitos de audiência”. No cinema, pelo contrário, a sua presença foi muito rara, embora tenha integrado o elenco de Sem Sombra de Pecado (1983), de José Fonseca e Costa, e chegado a participar em produções internacionais como La Guérriléra (1982), de Pierre KastLe Cercle des Passions (1983), de Claude d'AnnaOs Batoteiros (1984), de Barbet Schroeder, e Si t'as besoin de rien, fais-moi signe (1986), de Philippe Clair.

Mas o papel de Tozé Martinho na história da televisão portuguesa não se resume aos sucessivos papéis que foi assumindo, umas vezes como galã, outras como mau da fita: chegou a dirigir a empresa Atlântida Estúdios e uma sucursal da RTP em Newark, nos Estados Unidos. E o actor, irmão da escritora Ana Maria Magalhães, co-autora da popular série de aventuras juvenil Uma Aventura..., acabaria também por aventurar-se na escrita de argumento. Na já citada entrevista à revista Flash, dizia-se aliás incapaz de escolher entre as missões de actor e de argumentista: “Isso é como perguntar a um pai de que filho gosta mais [risos]. Aquilo que eu gosto mesmo é de representar coisas escritas por mim.” Não lhe faltaram oportunidades. 

A novela Roseira Brava, passada no universo das grandes herdades do Ribatejo que tão bem conhecia (após a morte do pai, quando Tozé Martinho tinha apenas nove anos, a mãe voltou a casar-se e a família mudou-se para Salvaterra de Magos, onde se apaixonou pela tauromaquia), foi a sua primeira experiência enquanto argumentista. Mas também escreveu, ainda para a RTP, Vidas de Sal (1996), A Grande Aposta (1997), e depois, já para a TVI, Todo o Tempo do Mundo, Olhos de Água, Amanhecer, Dei-te Quase Tudo (2005), A Outra (2007), Sentimentos (2009) e Louco Amor.

O velório de Tozé Martinho decorrerá a partir das 14h de segunda-feira na Igreja da Ressurreição, em Cascais, estando marcada uma missa de corpo presente para as 19h. O funeral, ainda sem hora definida, irá acontecer na terça-feira, no Cemitério Municipal da Guia.

Notícia actualizada às 9h38 de 17/02 para acrescentar informação sobre as cerimónias fúnebres do actor

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