De saída, Arménio Carlos alinha a CGTP contra “empobrecimento” dos jovens

No último discurso como secretário-geral da central sindical, Arménio Carlos lançou as reivindicações para os próximos anos. Reduzir o horário de trabalho na era da digitalização entra na ordem do dia.

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Arménio Carlos deverá ter como sucessora Isabel Camarinha LUSA/MÁRIO CRUZ

Já tinham ecoado as palavras de ordem: “CGTP, unidade sindical! CGTP, unidade sindical!”. Arménio Carlos subia ao palanque do congresso da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP) para o seu último discurso como secretário-geral e as primeiras palavras, de improviso e já com rouquidão, encaixaram que nem uma luva no guião de despedida: “O que falta na voz é o que sobra em confiança e motivação para o presente e o futuro da nossa central”.

O discurso de abertura do 14.º congresso da organização, a decorrer esta sexta-feira e amanhã no Pavilhão Municipal da Torre da Marinha, no Seixal, serviu para fazer uma retrospectiva dos 50 anos da Intersindical, para recordar os tempos da troika nos anos de Governo de Pedro Passos Coelho e a viragem para a negociação à esquerda no Parlamento. Para criticar o executivo de António Costa pela “cedências à direita. E para alinhar o posicionamento da CGTP na luta contra o empobrecimento dos jovens trabalhadores. Sem esquecer todos os que trabalham e “quem trabalhou”.

Aproveitando o embalo das críticas às “cedências” do Governo de Costa por ter celebrado um acordo de concertação social com as confederações patronais e a UGT para alterar a legislação laboral, o ainda secretário-geral garantiu que “nada, nem ninguém” demoverá a CGTP de lutar “pela eliminação de uma legislação que quer condenar as novas gerações ao empobrecimento”.

Será uma tarefa que nos próximos anos deverá ter como rosto máximo da central Isabel Camarinha, de 59 anos, actual presidente do Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal (CESP), um nome praticamente desconhecido até agora do grande público, mas com três décadas de actividade sindical.

A central tem historicamente ficado à margem dos acordos celebrados na concertação social e continuará a ser assim no futuro se esses entendimentos significarem “participar da destruição e venda de direitos”. A CGTP, reafirmou, “prefere estar sozinha na defesa dos trabalhadores na concertação do que acompanhada a assinar acordos que fragilizam e reduzem os direitos dos trabalhadores”.

Várias vezes ao longo do discurso Arménio Carlos deixou palavras sobre quem está há menos anos no mercado laboral. À conta do acordo de concertação do primeiro Governo de Costa (assinado em Julho de 2018), disse, os “trabalhadores em geral, e os mais jovens em particular, [ficaram] sequestrados pela precariedade, a instabilidade, a insegurança e angústia de um presente que condiciona e dificulta a planificação da sua vida pessoal e familiar para o futuro”.

Nas paredes, as reivindicações

Ficaram reivindicações. Uma delas a pensar justamente nos problemas que identificou. A CGTP reclama uma redução do horário de trabalho, “sem perda de remuneração, para as 35 horas semanais para todos os sectores” de actividade.

Argumentos sintetizados em duas frases: “Com os avanços da tecnologia, em que se produz mais em menos tempo, não podemos estar a trabalhar as mesmas horas do que há cem anos. Reduzir os horários para criar mais emprego e assegurar que os trabalhadores possam estar mais tempo com as suas famílias e tenham uma participação cívica e cultural mais activa na sociedade”. E para que os filhos possam passar mais tempo com os pais.

O congresso tinha sido aberto oficialmente às 11h12 e, nessa altura, já era possível visualizar a síntese do discurso de Arménio Carlos. E era possível olhando para as paredes laterais da sala do pavilhão, onde estão penduradas lonas com palavras de ordem, escritas a maiúsculas, a pontuar as principais reivindicações: “Fim da precariedade”; “Aumento geral dos salários 90 euros para todos”; “SMN 850 euros”; “Contratação colectiva com direitos — revogar a caducidade!”. E, do púlpito, Arménio Carlos reforçaria: “Aumentar em 90 euros por mês o vencimento dos assalariados não só é possível como é necessário, como é urgente”.

Arménio Carlos reivindicou os louros da queda do Governo de coligação PSD e CDS-PP, destacou “o que os últimos anos trouxeram”, mas também apontou críticas ao executivo de António Costa, dizendo ter havido um aumento do número de greves, paralisações e iniciativas sectoriais no sector público e no privado.

Sobre o actual executivo de Costa, carregou nas críticas à prioridade dada ao excedente no orçamento, um equilíbrio nas contas que diz ser conseguido “à custa dos trabalhadores e dos serviços públicos” para agradar ao Eurogrupo que o próprio ministro das Finanças preside. Que consequências teme a CGTP? “Um Governo que prioriza o saldo orçamental em detrimento da justiça social é a sementeira para a evolução do populismo e o ressurgimento da extrema-direita, que se alimenta destas contradições” e as usa como “elemento de atracção”.

Um dos momentos que marcou o discurso, fazendo levantar os delegados do congresso, foi quando disse que a CGTP acabara de ser notificada pelo Ministério do Trabalho sobre uma antiga reivindicação da central, reconhecendo o direito dos sindicatos de intervirem antes e depois de terem representantes eleitos dentro das empresas. Em causa está um parecer da Direcção-Geral do Emprego e das Relações do Trabalho (DGERT) que agiliza a entrada de dirigentes sindicais nas empresas sem delegados sindicais ou sem trabalhadores sindicalizados.

Para terminar, um regresso ao sentido inicial: “Se é verdade que não conseguimos tudo, sem a luta não conseguiríamos nada”. E lançou a frase “A luta continua! A luta continua!”. O congresso repetiu.

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