Estado português condenado por despedimento ilegal de empregada da embaixada no Luxemburgo

Justiça luxemburguesa condenou o Estado português a pagar cerca de 20 mil euros a funcionária. Embaixada não cumpria salário mínimo no Luxemburgo.

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RUI GAUDêNCIO/Arquivo

A Justiça luxemburguesa condenou o Estado português ao pagamento de uma indemnização de perto de 20 mil euros no caso do despedimento de uma empregada doméstica a trabalhar na residência do embaixador português no Luxemburgo.

O Tribunal do Trabalho do Luxemburgo deu razão à queixa de “despedimento abusivo" interposta em Janeiro de 2019 por uma empregada que trabalhava na residência do embaixador António Gamito. A decisão atribuiu uma indemnização por despedimento de 9566 euros, assim como o pagamento de férias no valor de 96,63 euros e ainda uma compensação por danos morais de 10 mil euros.

A sentença, datada de 3 de Fevereiro, condena assim o Estado português, representado pelo seu embaixador no Luxemburgo, a pagar à funcionária 19.663,18 euros, com juros. A queixosa reclamava uma indemnização global no valor de 115,8 mil euros.

“O que está em causa são os princípios. Nem que fosse um tostão”, afirmou Eduardo Dias, responsável do departamento de imigrantes da central sindical luxemburguesa OGBL, em declarações à Lusa.

“O Estado português, quando contrata pessoas no Luxemburgo, na França, na Alemanha, ou onde quer que seja, respeita as regras do país onde contrata as pessoas. Aliás, escreve isso nos contratos”, sublinhou o mesmo responsável, defendendo que “as regras da imunidade diplomática não foram feitas para explorar os trabalhadores”.

Por outro lado, o dirigente sindical recorda que “o Estado português não respeitava o salário mínimo”, e que “é verdade” que o mesmo “é hoje respeitado”, mas o Estado continua a “não respeitar a lei”.

“Não é só o salário mínimo: o Luxemburgo tem regras em termos de indexação dos salários à inflação que continuam a não ser respeitadas. Ainda hoje, continua a haver outras pessoas que continuam a não ter o seu salário actualizado”, acusou Eduardo Dias.

Os contornos do caso

O caso remonta ao final de 2018. A embaixada de Portugal no Luxemburgo começou por publicar um anúncio de um concurso para “assistente de residência”, assinado pelo embaixador António Gamito, em funções desde Outubro desse ano, e publicado em 29 desse mês no site da instituição.

A remuneração era fixada no anúncio em 1.874,19 euros ilíquidos por mês, um valor inferior ao salário mínimo para pessoas não qualificadas, que era à data de 2.048,54 euros mensais.

De acordo com o aviso, a embaixada abriu concurso ao abrigo do programa de regularização extraordinária de vínculos precários na administração pública, mas a empregada, que exercia funções nos serviços diplomáticos no Luxemburgo desde 1993, recusou assiná-lo.

O artigo 222-10 do Código do Trabalho do Luxemburgo estabelece que os empregadores que paguem remunerações inferiores ao salário mínimo luxemburguês “são passíveis de multa entre 251 e 25 mil euros”, um valor que pode subir para o dobro, até 50 mil euros, “em caso de reincidência no prazo de dois anos”.

O Decreto-lei 47/2013, de 5 de Abril, que regula o regime jurídico-laboral dos trabalhadores dos serviços periféricos externos do Ministério português dos Negócios Estrangeiros, prevê que lhes sejam aplicadas as “normas imperativas locais”.

O decreto regulamentar n.°3/2013, de 8 de Maio, que estabelece tabelas remuneratórias para os trabalhadores externos do MNE, determina como remuneração mínima no Luxemburgo 1.874,19 euros, um valor que estava acima do salário mínimo luxemburguês na altura em que o diploma foi publicado, em 2013, que era nessa altura de 1.846,51 euros.

No preâmbulo do mesmo diploma, precisa-se que estas remunerações são adaptadas “em função das especificidades do local onde são prestadas as actividades, designadamente o respeito pelos salários mínimos obrigatórios”.

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