Uma fila de camiões malcheirosos atormenta a Chamusca

Cerca de mil camiões atravessam diariamente a ponte da Chamusca, com destino à Resitejo e ao Eco Parque do Relvão. Pelo caminho passam pelas ruas da Chamusca, deixando para trás “um cheiro horrível que não se aguenta”.

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ADRIANO MIRANDA/Arquivo

A estreita Nacional 118, na Chamusca, é percorrida diariamente por dezenas, às vezes centenas, de camiões carregados de resíduos, perigosos ou não, a caminho do Eco Parque do Relvão, na Carregueira, deixando com frequência um cheiro nauseabundo no ar.

É por isso que as janelas das casas da Rua Direita de São Pedro, a estrada principal onde está situado o solar centenário que acolhe a Câmara da Chamusca e os Correios, estão fechadas.

A população ribatejana queixa-se há muito da passagem dos camiões pelo interior da vila, no distrito de Santarém, em trânsito para o Eco Parque do Relvão, a zona industrial dedicada à valorização e tratamento de resíduos, desde urbanos a industriais perigosos.

João Nazário, de 82 anos, é um desses habitantes e não pode ter as janelas da sua casa abertas “por causa do cheiro” deixado pelos “muitos camiões” que todos os dias atravessam a terra que o viu nascer.

“Não era assim. Só tenho a dizer mal daquilo que se passou aqui na Chamusca. [Os camiões] passam para Almeirim com estrume e outros para a Resitejo [Associação de Gestão e Tratamento dos Lixos do Médio Tejo] que também não vão tapados”, diz, franzindo o nariz como que a lembrar-se do cheiro. “Qualquer dia tenho de usar uma máscara”, graceja.

Uma fila de mau cheiro

São cerca de 17 os quilómetros entre o centro da vila e o complexo industrial, tomando como ponto de partida o semáforo junto à câmara municipal, onde várias vezes ao dia, os camiões fazem fila à espera do sinal verde, alguns exalando um forte odor desagradável.

“Durante a manhã é pior, com os camiões a passar. O pivete que aqui fica, com os camiões a deitar o ‘molho’ para o chão. Antes de estar aquilo do Relvão não era assim, há alturas em que cheira muito a porcaria de porco”, contou Luís Moreira.

Para este chamusquense, há uma alternativa para desviar o trânsito da vila. “Deviam ir pela estrada militar que passa a Ulme, uma estrada que vai embocar directamente no Relvão. Disseram que desviavam o trânsito de dentro da vila e não desviaram”, lamentou.

Segundo o presidente do município, Paulo Queimado (eleito pelo PS), a questão da passagem dos camiões pela vila é a principal queixa da população sobre a localização do Eco Parque do Relvão.

De acordo com o autarca, também há preocupações acerca dos resíduos sem cheiro: “Muitas vezes não se sabe quantificar e avaliar a perigosidade deste tipo de transporte.”

Paulo Queimado lembra ainda a existência do Terminal Multimodal do Vale do Tejo, junto à linha férrea em Riachos, no concelho de Torres Novas, que dista cerca de 25 a 30 minutos do Eco Parque, e o facto de haver “uma valorização do transporte ferroviário”, tendo em conta a pegada ecológica.

“Muito transporte de resíduos é feito por ferrovia, e depois transporte por rodovia até ao Eco Parque”, explica, sublinhando o estado de degradação das vias do concelho, que não estão dimensionadas para transportes “com 40 ou 50 toneladas”.

Paulo Queimado lembrou que, na altura da instalação dos dois CIRVER - Centro Integrado de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos, no concelho da Chamusca, “havia a contrapartida do Governo” de fazer a ligação do Itinerário Complementar 3 à Auto-estrada 13, entre Almeirim e Vila Nova da Barquinha, o que nunca foi cumprido. “Agora foi notícia a rejeição de uma proposta para incluir no Orçamento do Estado 2020”, acrescentou.

O autarca socialista assinala que por dia passam “10 mil viaturas na ponte da Chamusca, das quais mil são camiões, veículos pesados”. Destes, há “480 com destino ao Eco Parque do Relvão”.

Projectado em 2004, o Eco Parque do Relvão concentra em cerca de 600 hectares várias empresas que fazem a valorização e o tratamento de resíduos, desde urbanos aos industriais perigosos, passando pelo tratamento de resíduos hospitalares de lamas de estações de tratamento de águas residuais ou veículos em fim de vida.

Os seus dois CIRVER receberam um total de 398 mil toneladas de resíduos industriais perigosos de proveniência nacional e internacional em 2019, tendo a maioria sido depositada em aterro.

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