Parlamento libanês vota declaração de emergência económica de novo Governo

Com protestos na rua a apelar à queda do recém-formado executivo de Hassan Diab, os deputados deram-lhe a confiança. Reestruturar o sector público, recapitalizar os bancos e reduzir as taxas de juro são as suas prioridades.

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LUSA/NABIL MOUNZER

Perto de 300 pessoas ficaram fiaram feridas em confrontos com as forças de segurança em Beirute, ao tentarem impedir deputados e um ministro de chegarem ao Parlamento libanês para votar uma declaração do recém-formado Governo liderado por Hassan Diab, para se darem “dolorosos passos” no combate à crise financeira que há meses abala o país. Ainda assim, os deputados deram a Diab a maioria de que necessitava.

Os manifestantes atiraram ovos aos deputados, pintaram e partiram-lhes as janelas de carros para os impedir de chegar ao órgão legislativo - se faltassem 64 dos 128 eleitos, a sessão parlamentar seria adiada. As forças de segurança e o exército afastaram os manifestantes com gás lacrimogéneo, bastonadas e canhões de água e bloquearam todos os acessos à Praça do Parlamento. Exigia-se uma revolução política e bandeiras libanesas esvoaçaram.

“Não há confiança neste Governo, porque a maneira como foi formado mostra que não é de confiança”, disse ao Times of Israel uma manifestante que disse chamar-se Carole. O Governo foi formado com o apoio do Hezbollah, após a queda do executivo de Saad Hariri na sequência dos protestos populares, sem que realizassem eleições, no que é visto como o resultado de um sistema político em que a divisão de poder entre grupos étnico-religiosos é basilar - o primeiro-ministro é sempre um sunita, o líder do Parlamento um xiita e o Presidente um cristão maronita.

Apesar disso, o primeiro-ministro, Hassan Diab, garantiu aos deputados que se vai dedicar a redigir uma primeira versão de um “plano de emergência” até ao final de Fevereiro, para responder à crise económica. O presidente do Parlamento, Nabih Berri, foi citado pela imprensa local dizendo que ia ser pedida ajuda ao Fundo Monetário Internacional (FMI), para traçar este plano. A ideia, no entanto, não é pedir um empréstimo ao FMI, porque o país não tem capacidade para cumprir as condições exigidas, relata a Reuters. 

Há décadas que o Líbano se vê imerso em constantes crises económicas e, em 2019, a dívida chegou a ultrapassar os 150% do PIB. A libra libanesa depreciou-se a um ponto insustentável para a economia - 1507 libras perfazem hoje um dólar. Os bancos pararam as transacções para o exterior, para evitar a saída de divisas. Muitas empresas e lojas encerraram e o desemprego começou a subir.

A resposta à crise do então primeiro-ministro Saad Hariri foi a introdução e subida de impostos, desencadeando o que vieram a ser meses de protestos a exigir a substituição de um sistema político visto como corrupto e incompetente. Acabou por apresentar a demissão ao Presidente libanês, Michel Aoun e a formação de um novo Executivo tardou por mais de três meses.

Há duas semanas, Diab sucedeu a Hariri à frente de um executivo de continuidade e avançou de imediato com a redacção de uma ambiciosa declaração económica para aplacar a crise económica: redução das taxas de juro, recapitalização dos bancos, reestruturação do sector público e pedir ajuda a doadores estrangeiros. As medidas elencadas obrigarão os libaneses a fazer ainda mais sacrifícios.

“Estamos muito conscientes dos graves problemas que o país enfrenta: uma crise económico-financeira com grandes repercussões sociais ao longo do tempo, e isso pode ter definitivamente repercussões políticas em termos de caos e do que possa acontecer a seguir”, disse à Sky News o ministro dos Negócios Estrangeiros libanês, Nassif Hitti. E a situação é tão grave, continuou, que o Líbano pode acabar por se transformar num “Estado falhado”.

O Líbano corre contra o tempo por ter de pagar no final de Março uma tranche no valor de 1,2 mil milhões de dólares da dívida soberana. Se o não fizer, entrará em incumprimento. Há quem defenda a reestruturação da dívida, diz a Bloomberg, porque o total de seis mil milhões dólares de dívida que o Estado terá de pagar este ano serão demasiado para os cofres públicos.

Os sacrifícios são mais que certos para o povo libanês e a nova ministra do Trabalho, Lamia Yammine, deixou-o claro ao dizer que os desempregados terão de aceitar postos de trabalho pouco qualificados e mal pagos, tradicionalmente desempenhados por imigrantes. “É difícil criarem-se oportunidades de emprego nesta economia”, disse Yammine à Al-Jazeera . “Mas o que podemos fazer é encorajar os libaneses, através de uma campanha, a aceitar trabalhos que normalmente não desempenham, por exemplo, em restaurantes, em estações de combustíveis e no aeroporto”.

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