Juízes polacos alertam para atropelos ao Estado de Direito em Portugal

“A autonomia é de tal forma crucial para o sistema que ela o sistema judicial passa a ser controlado pelo governo”, diz associação de juízes polaca Iustitia Polska. “Pode ver-se o que está a acontecer aqui na Polónia de uma forma dramática”.

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a situação criada pela Procuradora-Geral da República, Lucília Gago, abre "precedentes" gravosos para o Estado de Direito daniel rocha

A associação de juízes polaca Iustitia Polska considerou hoje escandalosa a directiva da Procuradoria-Geral da República portuguesa sobre a intervenção hierárquica em processos judiciais.

“Uma situação dessas na Polónia não seria surpreendente, mas em Portugal sim. Não se podem fazer as coisas dessa maneira. Um cargo de nomeação política não pode decidir as coisas dessa maneira. Trata-se de uma violação de normas fundamentais”, disse à agência Lusa a juíza Monika Frakowiak, porta-voz da associação Iustitia Polska, defensora da luta contra “a repressão ao Estado de direito”

No dia 4 de Fevereiro, um parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR), cuja doutrina a procuradora-geral, Lucília Gago, determinou que seja “seguida e sustentada pelo Ministério Público (MP)”, prevê que a hierarquia do MP pode intervir nos processos-crime, “modificando ou revogando decisões anteriores”.

“É muito preocupante mas, por outro lado, estas situações são tão contagiosos que se estão a espalhar rapidamente por todos os lados. Para mim é inconcebível que alguém que é proposta pelo poder (PGR) possa parar um procedimento que se enquadra na autonomia dos procuradores. É um escândalo”, lamenta Frakowiak.

“A minha opinião sobre estes assuntos é sempre a mesma. A autonomia é de tal forma crucial para o sistema que sem a autonomia o sistema judicial passa a ser controlado pelo governo. Pode ver-se o que está a acontecer aqui na Polónia de uma forma dramática”, refere a porta-voz da associação de juízes da Polónia.

A Iustitia Polska é um dos organismos mais activos pelo fim “da repressão governamental contra o Estado de Direito na Polónia” devido ao controlo exercido pelo Executivo que limita “de forma dramática” a autonomia dos juízes e a independência do sistema que segundo a associação viola a Constituição de um país que integra a União Europeia.

No passado dia 4 de Fevereiro, a associação polaca denunciou o caso do juiz Pawel Juszcyszyn, que foi suspenso disciplinarmente “de forma indefinida e com perda de ordenado” por causa de “atitudes inconvenientes contra o partido no poder”.

Para a Iustitia Polska a situação criada pela Procuradora-Geral da República, Lucília Gago, abre “precedentes” gravosos para o Estado de Direito, assim como demonstra preocupação sobre a tomada de decisões com base em “pareceres”.

O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) decidiu quinta-feira impugnar judicialmente a directiva da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre a intervenção da hierarquia em processos judiciais, anunciou a estrutura sindical em comunicado.

No comunicado, o sindicato reitera que as novas orientações da PGR representam “o maior ataque à autonomia dos magistrados alguma vez efectuado no regime democrático”, acrescentando que se trata da “morte do Ministério Público”.

Lucília Gago “está isolada internamente como nenhum outro titular do cargo esteve”, segundo o sindicato e, a manter-se esta directiva, “dificilmente a procuradora-geral da República terá condições para exercer o seu mandato”.

O SMMP vai igualmente convocar a assembleia de delegados sindicais para apreciação, discussão e tomada de posição relativamente a esta matéria e solicitar ao presidente da mesa da assembleia do sindicato a realização de uma assembleia-geral “com vista à adopção de formas de luta adequadas à gravidade da situação”.

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